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A repressom nom funciona quando há umha força coletiva potente”

por
charo lo­pes

No pas­sado 7 de se­tem­bro Maria Osório saía à rua após cinco anos e sete me­ses em prisom.
Rebobinamos: 5 de de­zem­bro de 2011. Havia umha ceia no cen­tro so­cial Mádia Leva. Maria mar­chou cedo, mas essa noite nom che­gou a casa. O juiz da Audiência Nacional Eloy Velasco de­cre­tava pri­som preventiva.
Em fe­ve­reiro de 2013 sai em li­ber­dade pro­vi­só­ria, es­pe­rando jul­ga­mento na rua. Quatro me­ses de­pois, em ju­nho de 2013, senta no banco da au­di­ên­cia na­ci­o­nal, jun­ta­mente com Antom Santos, Teto Fialhega e Edu Vigo. Imputavam-lhe per­tença a or­ga­ni­za­çom ter­ro­rista e fal­si­fi­ca­çom de do­cu­men­tos. A con­de­na­çom as­cen­deu a 7 anos, 9 me­ses e 1 dia de pri­som re­vista e tran­si­tada fi­nal­mente polo Tribunal Supremo em cinco anos e sete meses.
Em maio de 2014 a jus­tiça es­pa­nhola emi­tiu um man­dado de busca e apre­en­som con­tra ela com vista ao cum­pri­mento da pena da qual ti­nha com­ple­tado um ano e três me­ses em pri­som pre­ven­tiva. Durante mais dum mês Maria per­ma­ne­ceu na clan­des­ti­ni­dade “nom cha­ma­rei à porta de nen­gumha pri­som”, de­cla­rou por vi­deo-con­fe­rên­cia num ato pú­blico em ju­nho de 2014. Umha se­mana de­pois era de­tida em Ponferrada.
Nos cinco anos e sete me­ses em pri­som per­cor­reu os es­ta­be­le­ci­men­tos pri­si­o­nais de Soto del Real, Brieva, Villabona e Mansilla de las Mulas, to­dos fora da Galiza. Encetou es­tu­dos de psi­co­lo­gia pola UNED, fijo me­tros e me­tros de tri­cot, tro­cou car­tas com cen­te­nas de pes­soas e man­tivo in­ta­tos os seus prin­cí­pios ideológicos.

Qual é a sen­sa­çom de re­cu­pe­rar a liberdade?
Mui gra­ti­fi­cante, a pri­meira vez que sais pola porta e re­ce­bes ar, pa­rece com que até as co­res se­jam di­fe­ren­tes. Sair é como co­me­çar do zero. Também os mo­men­tos pré­vios à saída em li­ber­dade som mui in­ten­sos, pen­sar no que vais en­con­trar fora, e des­pe­dir-te de den­tro, onde dei­xei ami­gas, gente com a que vi­veste ex­pe­ri­ên­cias mar­can­tes. Voltar à vida de an­tes é im­pos­sí­vel, e na vida ci­vil de­pois, és ex-presa; isso marca-te, nom ne­ces­sa­ri­a­mente como carga ne­ga­tiva, mas como con­di­çom ine­gá­vel, ter vi­vido essa experiência.

charo lo­pes

Como re­su­mi­rias esta experiência?
Com mui­tos ma­ti­zes, mas no glo­bal bem. Entrei com 25 anos, ti­nha aca­bado de sair da uni­ver­si­dade. E aprendi mais cou­sas em pri­som do que na ins­ti­tui­çom uni­ver­si­tá­ria, a mui­tos ní­veis e de mui­tas ma­té­rias. Estás numha si­tu­a­çom de so­bre­vi­vên­cia e ali as apa­rên­cias so­bram; a pes­soa mos­tra-se ní­tida, nom tens nen­gum tipo de dis­farce. Podes pas­sar de cer­tas ba­na­li­da­des que há na rua, cer­tos atrez­zos que ali nom ser­vem para nada. Serviu-me para ma­du­rar e co­nhe­cer-me a mim mesma, pas­sar mui­tas ho­ras soa serve para a in­tros­pe­çom e a re­fle­xom, e se te dás bem com a soi­dade, con­se­gues aturá-lo.
Há ex­pe­ri­ên­cias más, claro. É a ins­ti­tui­çom mais opaca que existe no es­tado es­pa­nhol, com di­rei­tos bá­si­cos a se­rem vi­o­la­dos gra­ve­mente, si­tu­a­çons de vi­o­lên­cia… é ver­dade isso que para me­lhor en­ten­der a pri­som é pre­ciso vivê-la.

"Entrei com 25 anos, tinha acabado de sair da universidade. E aprendi mais cousas em prisom do que na instituiçom universitária, a muitos níveis e de muitas matérias"

De que forma che afe­tou pes­so­al­mente a prisom?
A sen­sa­çom de re­clu­som, a perda de li­ber­dade… pode vir a com­pro­me­ter a tua saúde. Quando es­tava na pre­ven­tiva, que é o mo­mento em que mais brin­cam con­tigo, ti­vem os meus al­tos e bai­xos, pro­du­ziu-me um certo de­sa­cougo, an­si­e­dade, etc. E se nom o con­se­gues con­tro­lar, pode tra­zer pro­ble­mas. Adaptar-se à ins­ti­tui­çom, ao corpo custa-lhe. Sobretudo, nos ve­raos, en­cer­rar-me na cela, com o ca­lor, ou cer­tas épo­cas si­na­la­das, como o Natal…, mas aca­bas por ado­tar umha ro­tina e por vi­ra­res mais forte ao su­pe­ra­res es­sas ad­ver­si­da­des. Nom quero mi­ni­mi­zar os efei­tos da pri­som, mas tam­bém nom dramatizá-la.

O que di­rias do sis­tema pe­ni­ten­ciá­rio espanhol?
É umha ins­ti­tui­çom to­tal, cas­tra­dora, re­pres­siva, que ab­sorve a pes­soa por com­pleto; nom é ape­nas a re­clu­som, mas o fur­tar das fer­ra­men­tas para o de­sen­vol­vi­mento do in­di­ví­duo, de co­zi­nhar a ir ao mé­dico; ina­bi­lita como ci­vil. E fi­nal­mente, umha pes­soa que nom pode es­tar a ma­nu­fa­tu­rar, a fa­zer cou­sas, atro­fia-se tam­bém psi­co­lo­gi­ca­mente. Ademais é um lu­gar de cons­tan­tes vi­o­la­çons de di­rei­tos. No me­lhor dos ca­sos serve para en­la­tar gente ali, com a cum­pli­ci­dade da so­ci­e­dade. Cumpre lui­tar con­tra a pri­som, e ade­mais, vi­si­bi­li­zar a con­di­çom de classe na po­pu­la­çom re­clusa, as pre­sas som fruto da de­si­gual­dade so­cial, na sua am­pla mai­o­ria aca­bam aí por uma ques­tom económica.

Que es­tra­té­gias em­pre­gaste para suportá-lo?
Estar ali, es­tando o me­nos pos­sí­vel. Estava agar­rada às mi­nhas cou­sas, a lei­tura, o des­porto e o bom hu­mor. Ali é com­pli­cado ver fa­ces de fe­li­ci­dade, campa muito a de­ses­pe­rança, há muita gente sem fa­mí­lia… cum­pre ter muita pa­ci­ên­cia, nom va­li­dar cer­tas ofen­sas por parte das co­le­gas, en­ten­der as cir­cuns­tân­cias e fe­char os olhos.

“Nom é apenas a reclusom, mas o furtar das ferramentas para o desenvolvimento do indivíduo, de cozinhar a ir ao médico; inabilita como civil"

charo lo­pes

Para além de es­ta­rem con­fi­na­das, para as pre­sas, a pri­som tam­bém tem um efeito in­ti­mi­da­tó­rio im­por­tante na hora de criar medo e pa­ra­li­sar o ati­vismo, achas que a re­pres­som funciona?

No nosso caso nom foi umha re­pres­som des­me­dida quanto ao nú­mero de pes­soas pre­sas, tal­vez jul­gas­sem que o «pro­blema» po­dia ser re­sol­vido assim.

Parece-me que o medo obe­dece a que as pes­soas te­nhem um in­te­resse in­di­vi­dual que que­rem pre­ser­var; algo que pro­te­ger. Há é que ver o que é isso que se pro­tege, e ten­tar ava­liar os ris­cos re­ais, para sa­ber se isso é ra­ci­o­nal ou nom. O ser hu­mano é fun­ci­o­nal, quando vê umha ame­aça, foge; pro­tege o pró­prio corpo. O pro­blema é quando nom se cal­cula bem a de­fesa em re­la­çom à ame­aça. Cumpre en­ten­der o glo­bal da si­tu­a­çom, com­pre­en­der o que se passa e co­lo­car o foco no co­le­tivo. Para mim o su­cesso da re­pres­som é o triunfo do in­di­vi­dual so­bre o co­le­tivo, quando a re­pres­som nom fun­ci­ona é por­que houvo umha força co­le­tiva potente.

 

 

Como vês a si­tu­a­çom dos de­mais pre­sos independentistas?
A sua si­tu­a­çom é de­pen­dente do co­le­tivo de fora para que as suas rei­vin­di­ca­çons, que agora pas­sam pola re­pa­tri­a­çom e re­a­gru­pa­mento, se ma­te­ri­a­li­zem. Estamos num mo­mento com todo mui me­di­a­ti­zado polo tema ca­ta­lám. Mas isso nom nos vai co­lher se nom te­mos o nosso ho­ri­zonte tra­çado e as nos­sas de­man­das es­pe­cí­fi­cas acima da mesa. Ademais, con­si­dero fun­da­men­tal dar a co­nhe­cer a si­tu­a­çom dos meus com­pa­nhei­ros para além do hu­ma­ni­ta­rismo. A um preso po­lí­tico é ne­ces­sá­rio que se lhe re­co­nheça a mo­ti­va­çom e a ori­gem da sua si­tu­a­çom, que es­tas pes­soas es­tám pre­sas por de­fen­de­rem umha ideia, a in­de­pen­dên­cia da Galiza.

"No independentismo há que reforçar certos aspetos, fundamentalmente o papel das organizaçons, a luita política, a coordenaçom entre frentes setoriais e a cultura militante"

Levas ape­nas umhas se­ma­nas fora da pri­som, mas como vês a rua?
Vimos dum ca­mi­nho de ter feito mui­tas cou­sas boas, e te­mos acima da mesa cou­sas boas: no­me­a­da­mente umha ex­pe­ri­ên­cia di­la­tada, e o res­peito de parte do nosso povo, que nos ga­nha­mos em dé­ca­das de ati­vismo de rua e na re­sis­tên­cia nas pri­sons; mas tam­bém penso que re­cuá­mos em cer­tos âm­bi­tos. Há cer­tas cou­sas que se dei­xá­rom polo ca­mi­nho que som im­por­tan­tes, por exem­plo, nom vejo o tema na­ci­o­nal ga­lego pre­sente na rua; no in­de­pen­den­tismo há que re­for­çar cer­tos as­pe­tos, fun­da­men­tal­mente o pa­pel das or­ga­ni­za­çons, a luita po­lí­tica, a co­or­de­na­çom en­tre fren­tes se­to­ri­ais e a cul­tura militante.

Há al­guma cousa que che sur­pre­en­desse particularmente?
Acabei ainda de che­gar, mas te­nho a per­ce­çom de que a pro­je­çom pes­soal dis­pa­rou; com as re­des so­ci­ais pa­rece com que as con­du­tas pes­so­ais te­nham vindo a mu­dar, acho que seja umha es­pé­cie de di­ta­dura tec­no­ló­gica, su­po­nho que para a gente nova deve ha­ver muita pres­som. Nesse sen­tido a evo­lu­çom foi grande.
Vejo, nesta li­nha, a gente mui cen­trada no in­di­vi­dual, su­po­nho que tam­bém li­gado ao de­sem­prego; ob­vi­a­mente, e sem ter isto co­berto, como te vais de­di­car a ou­tras cou­sas? Mas cum­pri­ria dar saí­das co­le­ti­vas a es­tes assuntos.

Que pla­nos tens no mé­dio e longo prazo?

charo lo­pes

Por en­quanto vou de­va­gar, es­pe­ci­al­mente com a pro­xi­mi­dade da ma­ter­ni­dade. Desde a ado­les­cên­cia, en­tre os es­tu­dos e a mi­li­tán­cia, ti­vem umha vida pouco doméstica.
Depois, tra­ta­rei da ques­tom la­bo­ral bem como da rein­cor­po­ra­çom, aos pou­cos, à mi­li­tán­cia. Saio de­ter­mi­nada, com von­tade de fa­zer cou­sas, mas pouco a pouco.

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