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O viés do poder

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Com as vi­tó­rias elei­to­rais da ul­tra­di­reita ne­o­li­be­ra­lista os de­ba­tes so­bre como ar­ti­cu­lar uma res­posta po­pu­lar vão ga­nhando mais es­paço na es­querda. Algumas vo­zes vol­tam a re­pe­tir um man­tra: de­ve­mos su­pe­rar a “frag­men­ta­ção” re­pre­sen­tada pe­las iden­ti­da­des e as suas de­man­das para con­cen­trar-nos na­quilo que é co­mum, na opres­são de classe.
Aqui cum­pre as­si­na­lar quão po­de­roso é o viés com o que per­ce­be­mos a re­a­li­dade se­gundo a po­si­ção que ocu­pa­mos no mundo. Este faz com que ou­tor­gue­mos um sig­ni­fi­cado pre­pon­de­rante a al­guns as­pec­tos da re­a­li­dade en­quanto ti­ra­mos im­por­tân­cia a ou­tros. Assim, o que acon­tece nos es­pa­ços le­gi­ti­ma­dos de po­der fica de­ter­mi­nado como ex­pres­são po­lí­tica real. Neste caso como ex­pres­são po­lí­tica real à que te­mer e pe­rante a qual de­sen­vol­ver uma resposta.


Se am­pliás­se­mos o campo de vi­são per­ce­be­ría­mos fa­cil­mente que as po­lí­ti­cas de ul­tra­di­reita e as for­mas de des­pojo às quais vão atre­la­das le­vam anos avan­çando. Levam anos com o seu fun­ci­o­na­mento de ex­clu­são, es­pó­lio e vi­o­lên­cia. Com a sua forma de or­de­nar o mundo ba­se­ada no ani­qui­la­mento de tudo aquilo que é dis­tinto e como tal, in­fe­rior.
A re­pres­são às mi­gran­tes não é ne­nhuma no­vi­dade, as­sim como não é novo o dis­curso de ódio e as vi­o­lên­cias pa­tri­ar­cais con­tra as mu­lhe­res e con­tra toda iden­ti­dade fora do bi­na­rismo de gê­nero e da he­te­ro­nor­ma­ti­vi­dade. Tampouco é de agora o sa­queio dos bens co­muns, a mer­can­ti­li­za­ção da vida, o ne­gó­cio com ne­ces­si­da­des e di­rei­tos básicos.

as po­lí­ti­cas de ul­tra­di­reita e as for­mas de des­pojo às quais vão atre­la­das le­vam anos avan­çando. Levam anos com o seu fun­ci­o­na­mento de ex­clu­são, es­pó­lio e violência. 

Mas a jul­gar pe­las re­a­ções de al­guns se­to­res da es­querda, pa­re­cera que esse ata­que pau­la­tino ao di­reito a exis­tir com dig­ni­dade ha­via per­ma­ne­cido em ní­veis de “baixa in­ten­si­dade” du­rante es­tes anos. Algo que se sabe mas que não acaba de ge­rar a in­dig­na­ção su­fi­ci­ente para mo­bi­li­zar von­ta­des e fa­zer-lhe frente. O ra­cismo ins­ti­tu­ci­o­nal e as mor­tes nas fron­tei­ras, a vi­o­lên­cia se­xual que so­fre­mos as mu­lhe­res, a eli­mi­na­ção (real e sim­bó­lica) das pes­soas com cor­pos e iden­ti­da­des dis­si­den­tes. Parecera que só agora com a che­gada às ins­ti­tui­ções da ul­tra­di­reita so­mos quem de per­ce­ber o im­pacto le­tal dos seus dis­cur­sos e das po­lí­ti­cas que de­ri­vam de­les. O certo é que as vi­das nas mar­gens le­vam mui­tos anos pa­de­cendo-as com go­ver­nos de dis­tin­tas co­res. E re­sis­tindo. Intuo que é o viés do po­der o que não deixa ver ou que faz com que se pri­vi­le­giem de­ter­mi­na­das re­a­li­da­des e opressões.

Claro que urge ar­ti­cu­lar res­pos­tas e aglu­ti­nar for­ças ante a ofen­siva ul­tra­con­ser­va­dora. Mas é igual de ne­ces­sá­rio re­fle­xi­o­nar­mos so­bre as re­la­ções de po­der que co­lo­ni­zam o nosso pen­sa­mento e prá­tica po­lí­tica se que­re­mos criar uma fer­ra­menta de re­sis­tên­cia re­al­mente in­clu­siva e ra­di­cal no em­bate con­tra o ca­pi­ta­lismo heteropatriarcal.

Intuo que é o viés do po­der o que não deixa ver ou que faz com que se pri­vi­le­giem de­ter­mi­na­das re­a­li­da­des e opressões. 

Repetir fór­mu­las que re­co­men­dam es­pe­rar pa­ci­en­te­mente e re­nun­ciar às nos­sas pau­tas em prol da uni­dade de classe, sem re­vi­sar as seg­men­ta­ções que ope­ram den­tro dela, é tro­pe­çar na mesma pe­dra apon­tada há anos pe­los fe­mi­nis­mos e ou­tros mo­vi­men­tos de luta pelo re­co­nhe­ci­mento das iden­ti­da­des. É se­guir em­pre­gando uma ló­gica co­lo­nial que con­si­dera o di­verso como ame­aça e per­tur­ba­ção para a cons­tru­ção de um pro­jeto de po­der. Reproduzir a ideia de que existe algo uni­ver­sal e neu­tro, sem dar-se conta de que tal con­cep­ção cons­trói-se desde um lu­gar de pri­vi­lé­gio que mar­gina tudo o que sai dessa norma. E é atuar com vi­o­lên­cia so­bre es­sas iden­ti­da­des na me­dida em que as cul­pa­bi­liza do fra­casso de cons­truir uma res­posta comum.

Uma vez mais o pro­blema são xs ou­trxs. Enquanto não for­mos ca­pa­zes de ti­rar a venda dos pri­vi­lé­gios e re­co­nhe­cer as re­la­ções de po­der que nos atra­ves­sam não po­de­re­mos cons­truir a fer­ra­menta que pre­ci­sa­mos para pa­rar-lhe os pés ao fascismo.

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