Periódico galego de informaçom crítica

Fazer política em tempos de Covid

por
charo lo­pes

Que a crise do coronavírus marcará um antes e um depois é umha ideia praticamente unánime no grosso da sociedade. Houvo quem, ademais, quase desde o começo viu nessa crise um fenômeno catalisador com capacidade de dar em qualquer sentido “socialista”.

Foi as­sim que o en­ten­deu o fi­ló­sofo es­lo­veno Slavoj Zizek, mas houvo tam­bém quem apon­tou ime­di­a­ta­mente a um pe­sa­delo bi­o­po­lí­tico, como Giorgio Agamben. Mas em qual­quer caso, a Covid-19 nom é nem um ví­rus “so­ci­a­lista” nem um ví­rus “fas­cista”, e o sen­tido das trans­for­ma­çons so­ci­ais que pre­ci­pite está agora em dis­puta, pois nom há nada, nen­gumha ca­ra­te­rís­tica in­trín­seca, que o pre-con­fi­gure. Pode ter, com cer­teza, al­gumhas ca­ra­te­rís­ti­cas es­pe­cí­fi­cas. Neste sen­tido, o facto de ser umha crise da saúde tem a vir­tude de lem­brar da ma­neira mais in­tensa a fra­gi­li­dade cons­ti­tuinte do ser hu­mano e a sua de­pen­dên­cia da co­mu­ni­dade. Houvo quem neste sen­tido lem­brou as re­la­çons en­tre a pan­de­mia da in­flu­enza de 1918 e as rei­vin­di­ca­çons dos ser­vi­ços pú­bli­cos de saúde, mas tam­bém quem trouxo a de­bate os pa­ra­le­lis­mos en­tre o surto do VIH e a rei­vin­di­ca­çom dos di­rei­tos LGTB

Assim, nem o ho­mem branco mais rico e sem de­pen­dên­cias, pro­tó­tipo do per­feito ne­o­li­be­ral, fi­cou li­vre de risco. Qual é logo, para dizê-lo em ter­mos uti­li­za­dos por Sidney Tarrow, a es­tru­tura de opor­tu­ni­da­des po­lí­ti­cas da crise do co­ro­na­ví­rus? Ouvir o ex-mi­nis­tro es­pa­nhol de eco­no­mia Luis de Guindos de­fen­der a ne­ces­si­dade de umha renda mí­nima ou ver Boris Johnson e Esperanza Aguirre pro­vando da sua pró­pria me­di­cina som ima­gens que nom ca­re­cem de força. 

Houvo quem neste sen­tido lem­brou as re­la­çons en­tre a pan­de­mia da in­flu­enza de 1918 e as rei­vin­di­ca­çons dos ser­vi­ços pú­bli­cos de saúde, mas tam­bém quem trouxo a de­bate
os pa­ra­le­lis­mos en­tre o surto do VIH e a rei­vin­di­ca­çom dos di­rei­tos LGTB

Contodo, é tam­bém muito pro­vá­vel que esta ja­nela de opor­tu­ni­dade poda fe­char-se mui agi­nha, tam agi­nha quanto du­rar o medo que está a tor­nar mui­tos ne­o­li­be­rais em key­ne­si­a­nos. Neste tempo to­das as pes­soas es­tám a di­zer que “agora nom é mo­mento de po­lí­tica”, por­tanto, é o mo­mento da dis­puta po­lí­tica por an­to­no­ma­sia.  Este e nom ou­tro é o mo­mento da po­lí­tica que de­fine os ter­mos disso que sen­ti­mos como “apo­lí­tico”, e que fica fora de qual­quer de­bate mas que debe ser aproveitado.

Em 1945, após ven­cer o fas­cismo, um Partido Trabalhista bri­tâ­nico que nem se­quer es­tava em boa forma con­se­guiu ven­cer nas elei­çons, e o que é muito mais im­por­tante, ca­pi­ta­li­zar o cha­mado “es­pí­rito do 45”: o enorme sen­ti­mento po­pu­lar de que a guerra ga­nha­ram-na as pes­soas co­muns, as de baixo, e que se esse so­ci­a­lismo que ser­vira para go­ver­nar na guerra, tam­bém agora de­via ser­vir para go­ver­nar a paz. Umhas po­lí­ti­cas de so­ci­a­li­za­çom e pla­ni­fi­ca­çom de to­dos os se­to­res eco­nó­mi­cos es­tra­té­gi­cos, da in­dús­tria ener­gé­tica até a ha­bi­ta­çom pú­blica, pas­sando por umha das mais im­por­tan­tes vi­tó­rias, a cri­a­çom do ser­viço na­ci­o­nal de saúde. Estas fô­rom ideias for­tes que mesmo os con­ser­va­do­res, ao ga­nha­rem as se­guin­tes elei­çons, ti­ve­ram que fa­zer suas, e as­sim foi até a grande re­vo­lu­çom cul­tu­ral tatcherista. 

O ci­ne­asta Kean Loach, au­tor do co­nhe­cido do­cu­men­tá­rio so­bre aquela ex­pe­ri­ên­cia, apon­tou numha re­cente en­tre­vista al­guns pa­ra­le­lis­mos evi­den­tes com o co­ro­na­ví­rus, mas tam­bém apon­tou para as fra­que­zas atu­ais da or­ga­ni­za­çom da es­querda em com­pa­ra­çom com os anos da pós-guerra.

Polícia vs ser­vi­ços sociais

O pri­meiro ao que as­sis­ti­mos com a apa­ri­çom do ví­rus foi a umha po­la­ri­za­çom en­tre as duas saí­das na­tu­rais a esta co­mo­çom, na qual re­des­co­bri­mos a nossa vul­ne­ra­bi­li­dade: por umha parte, a ideia de que nos cui­da­mos en­tre to­das ou nin­guém se salva; por ou­tra, o medo que leva a exi­gir maior se­gu­rança a qual­quer preço, sa­cri­fi­cando qual­quer dos ou­tros di­rei­tos apa­ren­te­mente “me­nos es­sen­ci­ais”. A pró­pria ten­som en­tre es­tes dous pó­los pudo-se ver tam­bém na co­a­li­ga­çom do go­verno es­pa­nhol, en­tre os ape­los a umha renda bá­sica uni­ver­sal, que ainda nom che­gou, e as ten­ta­ti­vas dos mi­li­ta­res de pro­ta­go­ni­za­rem as con­fe­rên­cias de im­prensa. Dito de forma muito sim­pli­fi­ca­dora: ou mais po­lí­cia ou mais ser­vi­ços sociais.

Na rua um dos pri­mei­ros ei­xos do con­fronto po­lí­tico foi o po­si­ci­o­na­mento pe­rante a po­lí­cia de va­randa –ainda que, como di­zia al­gum com­pa­nheiro, nas va­ran­das pro­va­vel­mente o que houvo foi “mais Stasi do que Gestapo”–, en­ten­dido como umha ati­tude que se es­cu­dava na res­pon­sa­bi­li­dade co­le­tiva sendo, na re­a­li­dade, in­com­pa­tí­vel com a mesma e muito da­ni­nha para a saúde da co­mu­ni­dade. Mas com o de­cor­rer dos dias foi a di­reita a que foi ca­pi­ta­li­zando e dis­tor­cendo esta ideia de li­ber­dade como eixo cen­tral da sua es­tra­té­gia dis­cur­siva. Porém, as ma­ni­fes­ta­çons dos úl­ti­mos dias no bairro ma­dri­le­nho de Salamanca, obs­ce­nas a olhos de am­plís­si­mas ca­ma­das da po­pu­la­çom de todo o Estado es­pa­nhol pola os­ten­ta­çom de classe dos seus par­ti­ci­pan­tes, fô­rom as que muito pro­va­vel­mente ter­mi­nem por fa­zer fra­cas­sar essa estratégia. 

Na Galiza, no en­tanto, o pa­no­rama é di­fe­rente, com um Feijoo que leva me­ses a jo­gar ao grams­cisme de droite e com um go­verno so­ci­a­lista em Madrid que lhe per­mite jo­gar a baza do ga­le­guismo po­pu­lista, soube en­gan­char com sen­ti­men­tos muito po­pu­la­res, como a in­dig­na­çom por nom po­der ir sa­char à horta ou a proi­bi­çom de ir pes­car. A base de ver­dade das suas afir­ma­çons é o de me­nos, o im­por­tante é que soubo apro­priar-se, com ideias sim­ples, dumhas emo­çons que es­ta­vam nas pessoas.

Decrescer

Assim as cou­sas, umha das ideias que sub­ja­zem al­gumhas das pro­pos­tas dos di­ver­sos co­le­ti­vos po­lí­ti­cos da Galiza é a do de­cres­ci­mento. Com cer­teza, houvo quem soubo re­co­lher para o seu dis­curso po­lí­tico al­gumhas das afir­ma­çons in­te­res­sei­ras dos di­fe­ren­tes po­lí­ti­cos em fa­vor da uti­li­za­çom da bi­ci­cleta, da me­lhora na gra­da­çom de con­ta­mi­na­çom am­bi­en­tal nas ci­da­des por causa dos pri­mei­ros dias de con­fi­na­mento e mesmo, ou so­bre­todo, a ques­tom da Renda Básica Universal. 

Do de­cres­ci­mento na Galiza, co­le­ti­vos como Véspera de Nada e ati­vis­tas li­ga­dos a ele e aos pro­je­tos ecos­so­ci­a­lis­tas, a pro­posta da RBU tem-se cri­ti­cado com di­fe­ren­tes ar­gu­men­tos. Entre eles,  o cur­to­pra­zismo in­trín­seco da mesma, ma­te­ri­a­li­zado na falta de pre­vi­som em re­la­çom ao imi­nente co­lapso eco­ló­gico, à as­pi­ra­çom da pro­posta ba­se­ada, no­va­mente, num cres­ci­mento eco­nó­mico apa­ren­te­mente ne­ces­sá­rio para a me­lhor vida, e na de­pen­dên­cia cri­ada, para além de com es­tes fac­to­res, com o pró­prio Estado per­mis­sivo com essa ‘vida digna’. 

Assim, pode vol­tar sair à tona a pro­posta de­cres­cen­tista ga­lega de umha Leira Básica, que re­co­lha de forma re­tran­queira umha pro­posta et­no­po­lí­tica para um fu­turo pós-Covid de­cres­cen­tista e an­ti­ca­pi­ta­lista, em que a terra e nom os di­nhei­ros te­nham o ‘va­lor de troca’. Tal e como afir­mava num dos seus li­vros o eco­no­mista Xoán Doldán, “re-ru­ra­li­zar e re-agra­ri­zar o mundo já nom é umha op­çom, mas ape­nas algo inevitável”.

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