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Quem fala no euro?

por
nano

O euro e a pró­pria Uniom Europeia es­tám em jogo. O Reino Unido vo­tou no Brexit e a França po­de­ria vo­tar em Le Pen. A re­jei­çom à mo­eda co­mum e a UE é um dos pi­la­res so­bre os que se cons­trói o pro­grama da nova ex­trema-di­reita eu­ro­peia, apro­vei­tando a crise de le­gi­ti­mi­dade de am­bas ins­ti­tui­çons. Por en­quanto, salvo ex­ce­çons como o PCP, a es­querda é mais am­bí­gua en­torno a esta ques­tom e nom lhe con­cede tanta im­por­tân­cia na sua agenda. Grécia, acos­sada po­las ins­ti­tui­çons que pe­dem no­vos cor­tes e mais re­for­mas es­tru­tu­rais, po­de­ria ser o ce­ná­rio do co­meço do fim do euro. Apesar deste con­texto, no Estado es­pa­nhol a mai­o­ria da es­querda pre­fere evi­tar a ques­tom e a saída do euro con­ti­nua sendo um tabu.

Basta de sub­mis­são à União Europeia e ao euro”. Esta le­genda po­dia ler-se du­rante o ano pas­sado por todo Portugal, es­crita em gran­des car­ta­zes as­si­na­dos polo Partido Comunista Português (PCP). Junto à frase, o de­se­nho dum ho­mem en­cos­tado a car­re­gar umha es­fera azul com as es­tre­li­nhas da ban­deira da UE e o sím­bolo do euro em ama­relo. Aquela cam­pa­nha nom ti­nha nada a ver, em ter­mos quan­ti­ta­ti­vos, com a lan­çada este ano polo mesmo par­tido, que se pro­lon­gará du­rante o pri­meiro se­mes­tre de 2017 e in­clui desde pa­les­tras, de­ba­tes nas em­pre­sas e uni­ver­si­da­des e co­lada mas­siva de car­ta­zes até pro­pos­tas parlamentárias.
O PCP leva anos de­fen­dendo a saída de Portugal da UE e do euro. De facto, le­vam opondo-se desde os mes­mos mo­men­tos de en­trada do país em am­bas ins­ti­tui­çons. A im­por­tân­cia desta cam­pa­nha nom re­side por­tanto numha mu­dança de pos­tura, que sem­pre foi a mesma, se­nom na aposta em con­ce­der a má­xima im­por­tân­cia a este de­bate e co­locá-lo no topo da sua agenda po­lí­tica. Com 8,25 por cento dos vo­tos, 17 de­pu­ta­dos na Assembleia da República (dum to­tal de 230) e sendo um apoio par­la­men­tá­rio in­dis­pen­sá­vel para o go­verno de António Costa (PS), o PCP dis­pom de ca­pa­ci­dade para que os seus te­mas en­trem a for­mar parte da agenda pú­blica do país.

Além da auge da extrema direita, a situaçom da Grécia constitui umha ameaça para a supervivência da moeda única difícil de ignorar

A de­ci­som do PCP de abrir o de­bate so­bre a saída da UE e o euro nom foi to­mada da noite para o dia, se­nom que já le­vam tempo pre­pa­rando o ter­reio. O tema co­me­çou a ad­qui­rir im­por­tân­cia a par­tir da clau­di­ca­çom ante a Troika do go­verno grego da Syriza. Nas elei­çons le­gis­la­ti­vas de 2015, o PCP in­cluiu por vez pri­meira a saída do Euro e da EU no seu pro­grama. Porém, o dis­curso pú­blico dos lí­de­res do par­tido era mo­du­lado de forma que, num prin­cí­pio, cha­ma­vam mais bem a es­tu­dar e va­lo­rar as im­pli­ca­çons da per­ma­nên­cia ou da saída da UE e do Euro, ou a ter o país pre­pa­rado para umha even­tual de­sin­te­gra­çom da uniom mo­ne­tá­ria ou ante umha chan­ta­gem da Troika ao es­tilo grego. “Criminoso é nós nom nos pre­pa­rar­mos para umha pos­si­bi­li­dade que é real, ou por de­ci­som pró­pria do povo por­tu­guês ou por de­ci­som de ou­tros”, res­pon­dia neste sen­tido Jerónimo de Sousa, se­cre­tá­rio ge­ral do PCP, numha en­tre­vista para a TVI em 2015.
Este ca­rá­ter mais pre­ven­tivo do dis­curso foi ce­dendo es­paço pe­rante um tom mais pro­po­si­tivo e o PCP já fala de se li­ber­tar da “sub­mis­som” ao Euro como umha ne­ces­si­dade de pri­meira or­dem para Portugal. Neste sen­tido, foi es­pe­ci­al­mente sim­bó­lica a in­ter­ven­çom de Carlos Carvalhas, ex-se­cre­tá­rio ge­ral do par­tido, du­rante o XX Congresso do PCP, cha­mando a pa­gar a dí­vida “nom em eu­ros, mas em escudos”.

25% de ha­bi­tan­tes da Zona Euro, em con­tra da mo­eda única

nano

O auge dos par­ti­dos an­ti­euro em di­ver­sos es­ta­dos eu ro­peus nom é um re­flexo di­reto da opi­niom pú­blica a res­peito da mo­eda única, no mí­nimo tal e como é ma­ni­fes­tada no Euro barô­me­tro. Perguntados pola sua opi­niom a res­peito da exis­tên­cia dumha uniom mo­ne­tá­ria eu­ro­peia com o euro como mo­eda única, an­tes da crise, na pri­ma­vera de 2007, 22 em cada cem re­si­den­tes da Zona Euro afir­ma­vam es­tar em con­tra. No úl­timo inqué­rito pu­bli­cado, em ou­tono de 2016, es­ta­vam em con­tra 25 por cento, ape­nas três pon­tos mais.
Porém, a evo­lu­çom do de­sa­feto ci­da­dao a res­peito da UE pode ob­ser­var-se atra­vés dou­tros in­di­ca­do­res que nom im­pli­cam apoiar umha rup­tura com o euro. Por exem­plo, se em 2007 ha­via 52 por cento de ci­da­daos da Uniom Europeia (nom ape­nas dos paí­ses do euro) bas­tante ou muito sa­tis­fei­tos com o fun­ci­o­na­mento da de­mo­cra­cia na UE, con­tra 33 por cento de in­sa­tis­fei­tos; hoje am­bos gru­pos es­tám em­pa­ta­dos em 45 por cento. A in­sa­tis­fa­çom com a de­mo­cra­cia eu­ro­peia cres­ceu 12 pon­tos de meia neste pe­ríodo, mas de forma he­te­ro­gé­nea. Onde mais cres­ceu foi no Estado es­pa­nhol (+37%), se­guido de Chipre (+32%), da Grécia (+29%) e Portugal (+26%). Porém, os paí­ses mais in­sa­tis­fei­tos em 2016 e que em vá­rios ca­sos já par­tiam de ín­di­ces al­tos pré­vios à crise –polo que a mu­dança nom foi tam acen­tu­ada- som a Grécia (70%), Chipre (60%), a França (56%), Áustria (54%) e os Países Baixos (52%). No es­tado es­pa­nhol, na sexta po­si­çom, 51 em cada 100 ha­bi­tan­tes afirma es­tar in­sa­tis­feito com o fun­ci­o­na­mento da de­mo­cra­cia na UE.

Um de­bate da extrema-direita

a.p.

As pos­tu­ras do PCP ou do KKE grego, tam­bém con­trá­rio à per­ma­nên­cia no euro e na UE, es­tám mais perto da ex­ce­çom que da norma no pa­no­rama eu­ro­peu. A mai­o­ria da es­querda si­tu­ada além dos par­ti­dos so­cial-de­mo­cra­tas clás­si­cos e com certa re­pre­sen­ta­ti­vi­dade elei­to­ral ou bem man­tém certa am­bi­gui­dade en­torno à ques­tom do euro ou bem nom lhe dá tanta pre­e­mi­nên­cia na sua agenda política.
No en­tanto, é a ex­trema-di­reita quem com mais cla­ri­dade se está a apro­priar deste de­bate. Após o bre­xit ca­pi­ta­ne­ado pola banda mais con­ser­va­dora do par­tido Tory e polo xe­nó­fobo UKIP, o se­guinte golpe para a UE e desta volta tam­bém para o euro pode vir da França. A Front National de Maine Le Pen lo­grou 21,43 por cento dos vo­tos na pri­meira volta das elei­çons pre­si­den­ci­ais desse país, a pouca dis­tân­cia do 23,86 por cento ob­tido polo li­be­ral En Marche! de Macron. Ainda na hi­pó­tese mais pro­vá­vel se­gundo os inqué­ri­tos de a ul­tra­di­reita nom ga­nhar a pre­si­dên­cia na se­gunda volta, o sim­ples facto de que um par­tido que in­clui a saída do euro e da UE en­tre os prin­ci­pais pon­tos do seu pro­grama che­gue tam perto da pre­si­dên­cia nom de­ve­ria pas­sar-se por alto. Máxime quando se está a fa­lar da França, um dos pi­la­res do edi­fí­cio ins­ti­tu­ci­o­nal europeu.
Se bem a ex­trema-di­reita fran­cesa é agora mesmo a ame­aça mais ime­di­ata para o euro, tam­bém nom é a única. Partidos com pro­pos­tas si­mi­la­res às do Front National de Le Pen vam ad­qui­rindo cada vez maior pre­sença nou­tros paí­ses eu­ro­peus. O PVV de Geert Wilders, for­ma­çom xe­nó­foba ho­lan­desa que ad­voga pola saída do seu país do euro e da UE, ob­tivo nas elei­çons ge­rais de Março 13 por cento dos su­frá­gios; o que num par­la­mento tam frag­men­tado como o ho­lan­dês o co­loca como pri­meira força da opo­si­çom com 20 as­sen­tos na câ­mara. Também no país de Merkel, um par­tido do ul­tra­di­rei­tismo e con­trá­rio à mo­eda co­mum, Aliança pola Alemanha, po­de­ria ob­ter en­tre 7 e 13 por cento dos vo­tos e en­trar por pri­meira vez no Bundestag.

Nem fa­lar na peseta

a.p.

Mais alá da auge de par­ti­dos de ex­trema-di­reita con­trá­rios ao euro, existe um im­por­tante risco para a su­per­vi­vên­cia da mo­eda co­mum no corto prazo que nom se pode ig­no­rar. Trata-se da Grécia, à que os cre­do­res eu­ro­peus lhe exi­gem no­vos cor­tes de gasto e no­vas re­for­mas es­tru­tu­rais às que di­fi­cil­mente po­derá fa­zer frente. Perante esta si­tu­a­çom, exis­tem ru­mo­res so­bre um pos­sí­vel re­fe­rên­dum a res­peito da per­ma­nên­cia do país he­leno na Zona Euro, cujo re­sul­tado po­de­ria abrir umha crise di­fí­cil de con­tro­lar para a mo­eda comunitária.
No en­tanto, tanto a Galiza como o Estado es­pa­nhol pa­re­cem vi­ver com­ple­ta­mente alheios a este ce­ná­rio. Os prin­ci­pais par­ti­dos po­lí­ti­cos evi­tam en­trar no de­bate so­bre o fu­turo do euro, já seja num sen­tido ou em ou­tro. Quando surge a ques­tom, o es­pec­tro que vai desde o PP até o PSOE, pas­sando por Ciudadanos, man­tém-se no dis­curso de cum­prir com as obri­gas ad­qui­ri­das e nom con­tem­plam nen­gumha pos­si­bi­li­dade de ru­tura. Rutura, por ou­tra parte, da que es­tám ra­di­cal­mente em contra.
O es­paço de Unidos Podemos (UP) e as con­fluên­cias tam­pouco tem o de­bate por volta do euro na sua agenda. Quando sai o tema é quase sem­pre de forma re­la­ti­va­mente su­per­fi­cial e por­que al­gum jor­na­lista ou po­lí­tico con­ser­va­dor trata de ata­car o par­tido. Numha en­tre­vista de El País pu­bli­cada dous dias an­tes das elei­çons eu­ro­peias de 2014 Pablo Iglesias dava o guiom do que se­ria o dis­curso do par­tido para este tema: crí­tica ao de­se­nho atual do euro e apelo a mu­dar o sis­tema num sen­tido de­mo­crá­tico atra­vés de ali­an­ças com ou­tros es­ta­dos periféricos.
O par­tido li­lás foi in­ter­ro­gado so­bre este tema es­pe­ci­al­mente quando a clau­di­ca­çom do go­verno da Syriza fronte a Troika evi­den­ciou as di­fi­cul­da­des dum único país para re­a­li­zar umha po­lí­tica eco­nó­mica al­ter­na­tiva no seio da UE e do euro. As res­pos­tas re­pe­tiam a cha­mada a te­cer ali­an­ças com ou­tros es­ta­dos eu­ro­peus e acres­cen­ta­vam que “Espanha nom é a Grécia”, no sen­tido de que um es­tado como o es­pa­nhol, com muito mais peso em ter­mos eco­nó­mi­cos e de po­pu­la­çom que o grego, es­ta­ria em dis­po­si­çom de ne­go­ciar desde umha pos­si­çom de mais força com a Troika.
Por ou­tra parte, o PCE, nú­cleo de Izquierda Unida, a ou­tra pata es­ta­tal da co­a­li­ga­çom, apro­vou nas re­so­lu­çons do seu con­gresso de 2016 a saída do euro e da UE. Porém, nom é um tema que nom forme parte do dis­curso pú­blico das suas ca­ras vi­sí­veis. De facto, ao ser per­gun­tado numha en­tre­vista em Antena 3 o pas­sado ve­rao, Alberto Garzón quis fa­zer finca-pé em que no pro­grama elei­to­ral de UP nom con­tem­plava esta proposta.
Se a norma é tra­tar a ques­tom do euro quase como um tabu, a ex­ce­çom mais des­ta­cada no âm­bito da es­querda es­ta­tal é a CUP, que sim in­clui no seu pro­grama elei­to­ral a cons­ti­tui­çom da nova República Catalá fora do marco da UE e do euro. Quando os seus re­pre­sen­tan­tes som ques­ti­o­na­dos pola im­prensa, nom lhes treme a voz para de­fen­der a sua pos­tura e co­me­çam a dar conta dos efei­tos ne­ga­ti­vos que ao seu juízo tem pro­du­zido a in­te­gra­çom eco­nó­mica e mo­ne­tá­ria para o seu país. Porém, o tema dista de ser tam cen­tral na sua agenda como o é no caso do PCP, e a crí­tica con­ti­nua sem ir acom­pa­nhada por umha pro­posta de mo­delo al­ter­na­tivo mais alá de tra­ba­lhar por “um marco de re­la­çons euro-me­di­ter­râ­neas de po­vos livres”.

Na Galiza, tanto o espaço de En Marea (antes AGE) como do BNG partilham críticas a respeito da arquitetura da atual UE e do euro

Na Galiza, tanto o es­paço de En Marea (an­tes AGE) como do BNG par­ti­lham crí­ti­cas a res­peito da ar­qui­te­tura da atual UE e do euro. De ma­neira ge­ral, o dis­curso vai na li­nha de ape­lar umha mu­dança de mo­delo num sen­tido mais de­mo­crá­tico que deixe atrás as po­lí­ti­cas ne­o­li­be­rais im­pos­tas po­las ins­ti­tui­çons eu­ro­peias, mas sem ad­vo­gar por umha saída da Galiza das mes­mas. Por ou­tra parte, se nos anos mais tur­bu­len­tos da crise do euro (o res­gate ban­cá­rio es­pa­nhol tem lu­gar em 2012) o tema ad­qui­riu certo pro­ta­go­nismo, nos úl­ti­mos anos foi per­dendo im­por­tân­cia nas agen­das de am­bos partidos.
A ex­ce­çom foi o Movemento Galego ao Socialismo (MGS), for­ma­çom in­te­grada no BNG e que conta com umha de­pu­tada. No pro­grama po­lí­tico da sua as­sem­bleia de 2014 ad­vo­gava aber­ta­mente pola “ru­tura de­mo­crá­tica” tanto com a UE como com o euro. A pro­posta nom fi­cou presa nos tex­tos or­gâ­ni­cos, se­nom que o MGS tam­bém re­a­li­zou umha cam­pa­nha de pa­les­tras en­tre o ve­rão de 2013 e o iní­cio de 2014 para pro­mo­ver a saída do país de am­bas instituiçons.

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