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Transparência e poder policial

por
iri­dia

O 29 de maio de 2013, Z. Muhammad, um ho­mem pa­quis­ta­nês com per­misso de re­si­dên­cia no es­tado es­pa­nhol, pas­se­ava com um amigo por umha con­cor­rida rua de Barcelona quando umha pa­tru­lha da Policía Nacional se de­tivo junto a eles para lhes pe­dir a do­cu­men­ta­çom, a qual apre­sen­tá­rom rapidamente. 

Z. Muhammad per­gun­tou ao agente qual era o mo­tivo da iden­ti­fi­ca­çom, dado que fô­rom as úni­cas pes­soas re­que­ri­das numha rua cheia de gente nom ra­ci­a­li­zada. O po­lí­cia dixo-lhe que nom ia pe­dir a do­cu­men­ta­çom a um ale­mám, que ele era ne­gro e ponto; por isto, o iden­ti­fi­cado re­cri­mi­nou-lhe que abu­sasse da sua au­to­ri­dade. A re­a­çom do agente foi bai­xar do carro, bo­fe­teá-lo e em­purrá-lo para den­tro do carro di­zendo que o ar­res­ta­vam “por listo”. A ca­mi­nho da co­mis­sa­ria, o agente ame­a­çou-no com re­pre­sá­lias quando for re­no­var o seu per­misso de re­si­dên­cia e in­sul­tou-no com ex­pres­sons cla­ra­mente ra­cis­tas como “mono”.  

A au­sên­cia de me­ca­nis­mos de con­trolo efi­ca­zes fa­vo­re­cem e pos­si­bi­li­tam a im­pu­ni­dade em si­tu­a­çons de abuso do po­der policial

Ao cabo de umha hora e meia foi posto em li­ber­dade e acu­diu com o seu amigo a in­ter­por umha de­nún­cia ante os Mossos d’Esquadra polo acon­te­cido, mas eles ne­gá­rom-se, sob o pre­texto de que nom re­ce­biam de­nún­cias con­tra po­lí­cias e in­di­cando que de­viam acu­dir aos tri­bu­nais, ape­sar de te­rem a obriga le­gal de as tramitar. 

Este é um dos ca­sos que re­lata Irídia, cen­tro para a de­fensa dos di­rei­tos hu­ma­nos, no seu in­forme re­la­tivo à trans­pa­rên­cia e ren­di­çom de con­tas dos cor­pos po­li­ci­ais no es­tado es­pa­nhol, pu­bli­cado em ou­tu­bro de 2022. As suas con­clu­sons som cla­ras: a au­sên­cia de me­ca­nis­mos de con­trolo efi­ca­zes fa­vo­re­cem e pos­si­bi­li­tam a im­pu­ni­dade em si­tu­a­çons de abuso do po­der po­li­cial. Estas si­tu­a­çons nom som ca­sos iso­la­dos, mas fam parte dum pro­blema es­tru­tu­ral que di­fi­culta e até im­pos­si­bi­lita o exer­cí­cio dos di­rei­tos fun­da­men­tais e que tem ori­gem na pró­pria con­fi­gu­ra­çom do po­der policial. 

No seu exaus­tivo es­tudo, Irídia cons­tata que as dis­cri­mi­na­çons por per­fis ét­nico-ra­ci­ais som um pro­blema con­tí­nuo, agu­di­zado por nom ter de ser jus­ti­fi­cada a causa que mo­tiva a ac­tu­a­çom po­li­cial. Para abor­dar esta ques­tom re­sulta es­sen­cial que as for­ças de se­gu­rança dem conta dos seus atos, in­cluída toda de­ci­som de em­pre­gar a força. 

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Porém, os me­ca­nis­mos in­ter­nos de ren­di­çom de con­tas po­li­ci­ais nom som o su­fi­ci­en­te­mente in­de­pen­den­tes e efi­ca­zes; polo con­trá­rio, som ca­ra­te­ri­za­dos pola falta de trans­pa­rên­cia e de pu­bli­ci­dade, pois os da­dos so­bre os pro­ce­di­men­tos dis­ci­pli­na­res in­co­a­dos nom te­nhem sido dis­po­ni­bi­li­za­dos nem de­sa­gre­ga­dos. Esta falta de trans­pa­rên­cia tam­bém se re­flete em que nen­gum corpo po­li­cial prevê o acesso pú­blico aos seus pro­to­co­los ou ins­tru­çons in­ter­nos re­la­ti­vos ao em­prego da força e das ar­mas. Todo o an­te­rior, unido à falta de iden­ti­fi­ca­çom vi­sí­vel nos uni­for­mes po­li­ci­ais, di­fi­culta a de­pu­ra­çom de responsabilidades. 

No dia se­guinte à de­ten­çom, Z. Muhammad in­ter­pujo de­nún­cia no jul­gado de ins­tru­çom de Barcelona por um pre­sunto de­lito de de­ten­çom ile­gal, mas o pro­ce­di­mento foi ar­qui­vado em pri­meira ins­tan­cia, con­fir­mando esta de­ci­som a Audiencia Provincial

Apoiado por SOS Racisme Catalunya, em abril de 2014 re­cor­reu à via ad­mi­nis­tra­tiva para re­cla­mar da­nos e pre­juí­zos con­tra o Ministerio del Interior, mas a pe­ti­çom foi de­ses­ti­mada. Portanto, ini­ciou um pro­ce­di­mento con­ten­ci­oso-ad­mi­nis­tra­tivo ante a Audiencia Nacional que tam­bém tivo re­sul­tado de­ses­ti­ma­tó­rio con­fir­mado polo Tribunal Supremo em 2016. 

Com a de­ter­mi­na­çom de es­go­tar to­das as vias, Z. Muhammad in­ter­pujo um re­curso de am­paro ante o Tribunal Constitucional, mas foi inad­mi­tido a trâ­mite –isto é, nem se­quer se en­trou a va­lo­rar se os seus di­rei­tos fun­da­men­tais fo­ram le­si­o­na­dos– e, em maio do 2017, apre­sen­tou umha de­manda ante o Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Em ou­tu­bro de 2022, este tri­bu­nal acor­dou –por qua­tro vo­tos con­tra três– que o es­tado es­pa­nhol nom le­si­o­nou os di­rei­tos fun­da­men­tais de Z. Muhammad. 

Irídia as­si­nala que a di­la­ta­çom dos pro­ces­sos ju­di­ci­ais, junto  com a im­pu­ni­dade e as prá­ti­cas re-vi­ti­mi­za­do­ras, acres­cen­tam ao so­fri­mento da vi­o­lên­cia vi­vida a des­trui­çom de cren­ças e va­lo­res, pro­vo­cada pola al­te­ra­çom das su­pos­tas nor­mas e re­gras de con­vi­vên­cia so­cial, que nom pro­por­ci­o­nam res­paldo nas ins­ti­tui­çons nem re­pa­ra­çom para as vítimas. 

As de­fi­ci­ên­cias nas in­ves­ti­ga­çons po­li­ci­ais in­ter­nas dos ca­sos de tor­tura e mal­trato re­per­cu­tem nas in­ves­ti­ga­çons ju­di­ci­ais e, ao mesmo tempo, o Ministerio Fiscal é pro­clive à inatividade

As de­fi­ci­ên­cias nas in­ves­ti­ga­çons po­li­ci­ais in­ter­nas dos ca­sos de tor­tura e mal­trato re­per­cu­tem nas in­ves­ti­ga­çons ju­di­ci­ais e, ao mesmo tempo, o Ministerio Fiscal é pro­clive à ina­ti­vi­dade, pois nom de­manda di­li­gên­cias de in­ves­ti­ga­çom e so­li­cita sis­te­ma­ti­ca­mente o so­bres­ta­mento des­tes processos. 

É im­por­tante lem­brar que or­ga­nis­mos in­ter­na­ci­o­nais como o Comité de Direitos Humanos ou a Comissom para a Prevençom da Tortura te­nhem mos­trado re­pe­ti­da­mente a sua pre­o­cu­pa­çom ante a de­bi­li­dade das in­ves­ti­ga­çons de de­nún­cias e san­çons re­la­ci­o­na­das com o uso da força, as­sim como pola con­ces­som de in­dul­tos nas con­de­nas por tor­tura. Por isto, exi­gem o es­ta­be­le­ci­mento de ór­gãos ex­ter­nos de de­nún­cia e con­trolo po­li­cial in­de­pen­den­tes, com atri­bui­çons para in­ves­ti­gar de ma­neira efe­tiva as quei­xas e de­nún­cias re­la­ci­o­na­das com o em­prego da força por parte dos cor­pos policiais. 

Jorge del Cura, ati­vista con­tra a tor­tura, apre­cia que a ideia er­ró­nea de que o po­der po­li­cial serve à pre­ven­çom do de­lito fai que os de­fen­so­res do po­pu­lismo pu­ni­tivo apre­sen­tem a po­lí­cia como a me­lhor e pri­meira de­fensa da so­ci­e­dade frente ao crime. Constata que isto dá lu­gar a duas di­nâ­mi­cas por um lado, pro­voca a sub­mis­som vo­lun­tá­ria da ci­da­da­nia ao po­der po­li­cial e, por ou­tro lado, causa um cres­ci­mento ex­plo­sivo do po­der po­li­cial, que adapta as nor­mas às suas ne­ces­si­da­des ope­ra­ti­vas para man­ter ou fa­bri­car a or­dem establecida. 

Levando em conta o an­te­rior e tal e como si­nala Irídia, nom de­ve­mos es­que­cer a im­por­tân­cia que te­nhem as or­ga­ni­za­çons de di­rei­tos hu­ma­nos, os mo­vi­men­tos so­ci­ais e os meios de co­mu­ni­ca­çom  na fis­ca­li­za­çom da atu­a­çom do po­der po­li­cial e na cons­tru­çom dum re­lato que tenda, pre­ci­sa­mente, a con­tro­lar este po­der para ca­mi­nhar as­sim cara a umha so­ci­e­dade mais democrática. 

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