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A Galiza como parte do problema climático

por
Refinaria da Corunha. l mi­guel bu­gallo s

Nos úl­ti­mos me­ses, têm sur­gido no­tí­cias muito pre­o­cu­pan­tes so­bre a crise cli­má­tica glo­bal, que po­derá es­tar a ace­le­rar a um ritmo mais rá­pido do que o es­pe­rado. Parece pos­sí­vel que neste mesmo ano seja ul­tra­pas­sado o li­mite de au­mento da tem­pe­ra­tura mé­dia glo­bal so­bre a era pré-in­dus­trial, es­ta­be­le­cido como um “li­mite mais se­guro” no Acordo de Paris: 1,5⁰ C. Mas isso não sig­ni­fica ne­ces­sa­ri­a­mente que foi de­fi­ni­ti­va­mente ultrapassado.

A emer­gên­cia cli­má­tica é uma re­a­li­dade cada vez mais pre­o­cu­pante, face à qual te­ría­mos que agir como a ver­da­deira emer­gên­cia que é. No en­tanto, as de­cla­ra­ções ofi­ci­ais do es­tado de emer­gên­cia cli­má­tica, como a pro­mo­vida pelo Parlamento ga­lego, são, mais do que nada, re­tó­rica, e a ação cli­má­tica ainda deixa muito a de­se­jar. Além disso, na Galiza tam­bém de­tec­ta­mos por ve­zes uma dis­tor­ção do con­ceito de emer­gên­cia cli­má­tica, ao ten­tar uti­lizá-lo como si­nó­nimo de de­te­ri­o­ra­ção do ter­ri­tó­rio, evi­tando as­sim o ver­da­deiro pro­blema climático.

Não po­de­mos fa­lar da crise cli­má­tica da Galiza sem fa­lar ao mesmo tempo das nos­sas emis­sões de dió­xido de car­bono (CO2) e ou­tros ga­ses de “efeito de es­tufa” (a par­tir de agora, GEE), 71% dos quais de­vem-se ao con­sumo de ener­gia fós­sil (2021) no sec­tor da ener­gia e nos usos fi­nais (in­dús­tria, trans­por­tes, agre­ga­dos fa­mi­li­a­res, sec­tor agrí­cola, etc.). Combatermos a emer­gên­cia cli­má­tica aqui e agora sig­ni­fica, em pri­meiro lu­gar, re­du­zir rá­pida e dras­ti­ca­mente as nos­sas pró­prias emis­sões, tanto as que ocor­rem den­tro das nos­sas fron­tei­ras ‑as ter­ri­to­ri­ais- como as as­so­ci­a­das ao con­sumo das fa­mí­lias, das em­pre­sas e das ad­mi­nis­tra­ções pú­bli­cas, onde quer que se pro­du­zam. É claro que o aque­ci­mento glo­bal não é o único pro­blema so­ci­o­am­bi­en­tal im­por­tante a con­si­de­rar, pois faz parte de uma crise eco­ló­gica mais am­pla, na qual tam­bém pre­ci­sa­mos de des­ta­car ou­tras emer­gên­cias, como a perda de bi­o­di­ver­si­dade ou a po­lui­ção tóxica.

Combatermos a crise cli­má­tica não sig­ni­fica ou­tra coisa se­não re­du­zir rá­pida e dras­ti­ca­mente as emis­sões de ga­ses com efeito de estufa

Vejamos como ve­mos a in­ser­ção da Galiza no Estado es­pa­nhol, na UE e no mundo, é in­ques­ti­o­ná­vel que a Galiza faz parte do pro­blema cli­má­tico, ou seja, está no grupo de paí­ses com maior va­lor atual e his­tó­rico emis­sões de GEE, em re­la­ção à sua po­pu­la­ção. Essa é a re­a­li­dade que nos é re­ve­lada pe­los da­dos de emis­sões pouco di­vul­ga­dos e até in­com­ple­tos, pois quase não te­mos in­for­ma­ções so­bre as emis­sões li­ga­das ao con­sumo. Um es­tudo à es­cala eu­ro­peia es­ti­mou que em 2010 as emis­sões li­ga­das ao con­sumo pri­vado as­cen­diam a cerca de 11 to­ne­la­das por ha­bi­tante, o que nos co­lo­cou numa po­si­ção in­ter­mé­dia no mapa eu­ro­peu das re­giões e, por­tanto, ele­vada no con­texto mundial.

Temos, sim, in­for­ma­ções ofi­ci­ais con­tí­nuas desde 1990 so­bre as nos­sas emis­sões ter­ri­to­ri­ais. O ano é sig­ni­fi­ca­tivo, por­que apro­xi­ma­da­mente me­tade das emis­sões glo­bais his­tó­ri­cas que cau­sa­ram a crise cli­má­tica ocor­re­ram desde en­tão, o que ex­plica o tre­mendo im­pacto cli­má­tico da glo­ba­li­za­ção ca­pi­ta­lista nas úl­ti­mas dé­ca­das. Os da­dos pro­vêm do in­ven­tá­rio es­ta­dual de GEE ela­bo­rado pelo Ministério para a Transição Ecológica de acordo com pa­drões internacionais.

Fonte: Ogacli, a par­tir do Inega. O salto na pro­du­çom das re­no­vá­veis de uso tér­mico en­tre 2009 e 2010 é de­vido a umha mu­dança na fonte de da­dos em­pre­gada nos ba­lan­ços energéticos. 

Visto que a crise cli­má­tica é cau­sada pela acu­mu­la­ção na at­mos­fera de GEE de ori­gem an­tro­po­gé­nica q que po­dem fi­car nela du­rante dé­ca­das (e até sé­cu­los), é in­te­res­sante com­pro­var­mos qual é a suma das nos­sas emis­sões anu­ais en­tre 1991 e 2021, ano mais re­cente do que dis­po­mos da­dos. Nada me­nos que 970 mi­lhões de to­ne­la­das, quase uma gi­ga­to­ne­lada (Gt.). As emis­sões mun­di­ais es­ti­ma­das para 2021, das mais al­tas da sé­rie his­tó­rica, fo­ram de 53 Gt.

Num mundo onde a jus­tiça cli­má­tica pre­va­le­cesse, o or­ça­mento de car­bono de paí­ses como o nosso (ou seja, a quan­ti­dade de emis­sões adi­ci­o­nais de CO2) que po­de­ría­mos emi­tir no fu­turo se es­ti­vés­se­mos su­jei­tos a uma dis­tri­bui­ção equi­ta­tiva à es­cala glo­bal do vo­lume de emis­sões, que ainda po­de­ría­mos emi­tir sem ul­tra­pas­sando o li­mite de 1,5ºC, es­ta­ria perto do fim. Ao ritmo atual ter­mi­na­ría­mos com o res­tante para a década.

O de­clí­nio do car­vão na pro­du­ção de elec­tri­ci­dade é a prin­ci­pal causa da di­mi­nui­ção de 34% nas emis­sões en­tre 1990 e 2021

42% das emis­sões ter­ri­to­ri­ais acu­mu­la­das no nosso país desde 1990 de­ve­ram-se ao sec­tor das ener­gias fós­seis, cons­ti­tuído pela re­fi­na­ria de pe­tró­leo da Corunha (Repsol) e pe­las cen­trais elé­tri­cas que fun­ci­o­nam com car­vão, gás fós­sil (desde 2007) e óleo com­bus­tí­vel (até 2009). A maior parte das emis­sões do se­tor ener­gé­tico teve ori­gem nas cen­trais tér­mi­cas a car­vão de Meirama (Fenosa, agora Naturgy) e As Pontes (Endesa), por­que o car­vão é o com­bus­tí­vel fós­sil mais in­ten­sivo em ter­mos de emis­sões de CO2, o prin­ci­pal GEE. É por isso que o maior con­tri­buto até agora da nossa terra para a mi­ti­ga­ção da crise cli­má­tica glo­bal tem sido, de longe, o en­cer­ra­mento des­tas cen­trais (em 2020 a de Meirama e em Outubro deste ano a de Pontes). Um en­cer­ra­mento fa­vo­re­cido pe­las re­gras da UE e tor­nado pos­sí­vel pelo de­sen­vol­vi­mento eó­lico pas­sado, que che­gou tarde e en­fren­tou bas­tante re­sis­tên­cia de for­ças po­lí­ti­cas e sin­di­cais de na­tu­reza muito di­fe­rente que as­pi­ra­vam a pro­lon­gar a vida des­tas cen­trais mesmo para além de 2040.

O de­clí­nio do car­vão na pro­du­ção de elec­tri­ci­dade, ini­ci­ado na pri­meira dé­cada deste sé­culo e acen­tu­ado a par­tir de 2019, é a prin­ci­pal causa da di­mi­nui­ção das emis­sões ter­ri­to­ri­ais do país em 34% en­tre 1990 e 2021. Para es­tar­mos re­al­mente ali­nha­dos com o Acordo de Paris de­ve­riam con­ti­nuar a di­mi­nuir de forma cons­tante até fi­ca­rem pelo me­nos 65% abaixo dos ní­veis de 1990 até 2030, no ca­mi­nho para atin­gir­mos a neu­tra­li­dade cli­má­tica (emis­sões iguais à ab­sor­ção pela ve­ge­ta­ção e pelo solo) na pró­xima dé­cada (e de­pois emis­sões ne­ga­ti­vas). Atualmente, não es­ta­mos no ca­mi­nho certo. Após três anos con­se­cu­ti­vos de cor­tes nas emis­sões (2018, 2019, 2021), es­tas au­men­ta­ram para 3,3% em 2021.

A in­dús­tria ener­gé­tica pas­sou de res­pon­sá­vel por 51% das emis­sões em 1990 para “ape­nas” 15% em 2021. Hoje a li­de­rança das emis­sões é par­ti­lhada pe­los trans­por­tes (26%) e pelo sec­tor agrí­cola (25%), se­gui­dos não muito atrás pela in­dús­tria não ener­gé­tica (20%). Quem qui­ser sa­ber mais so­bre a si­tu­a­ção atual das emis­sões de GEE no nosso país pode con­sul­tar o site do Observatório Galego de Ação Climática.

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