
Entrevista a Anna Gabriel, deputada das CUP no Parlamento da Catalunha.
Anna Gabriel cita-nos no Parlamento, um espaço onde confessa que nom termina de se sentir cómoda polas cumplicidades pessoais que se podem tecer com os adversários políticos da CUP e nas quais ela nom quer entrar. Fala connosco porque, como diz, sempre deixa um espaço para os meios alternativos que define como garantes do auténtico jornalismo. Conversamos sobre os retos da esquerda independentista no momento actual, da posiçom da CUP como força decisória no Parlament e do processo constituinte numha legislatura de exceçom que rematará com a celebraçom do referendo para decidir o futuro do Principat.
A CUP nasce em 2000 com o objetivo de fazer política nas vilas e municípios. Mas o que foi que levou a CUP para o Parlamento?
Nas vilas havia umha implantaçom relativamente lenta mas com um nível de enraizamento muito forte que dava muita entidade ao nosso projeto no ámbito municipalista. Um primeiro debate neste sentido dá-se em 2009, aqui é umha maioria da assembleia que entende que é precipitado ir às eleiçons ao Parlament. Em 2012 já é maioritária a militância da CUP que entende oportuno que a nossa voz seja escuitada para além dos municípios.
A nossa primeira legislatura começa em 2012 com três parlamentárias. Em 2015 é quando se produz o nosso maior crescimento, passando às treze parlamentarias atuais e as mais de 300 concelheiras por todo o território. Nunca saberemos qual é a relaçom exata de causa-efeito: se o bom trabalho nos municípios ajudou a ser um ator a nível supramunicipal ou, ao invês, se o facto de existirmos na politica institucional ajuda a criar núcleos na base.
Olhando para atrás achas foi umha boa decisom?
Sou das que votou ‘nom’ nas duas assembleias. Aprendemos muito das esquerdas que nos precedérom e todas as alertas sobre os perigos da intervençom política nas instituiçons som poucas. Mas somos cientes de que o municipalismo nom ocupa lugar nas capas nem gera grandes titulares. Estamos num momento que semelha que a política de verdade só é a institucional.
Eu era das que achava que ficava ainda crescimento em chave municipal, sobretudo arredor do país. O nosso nom é um projeto em chave de Principat, é um projeto de Països Catalans. É evidente que a implantaçom do municipalismo de libertaçom era ainda muito débil nas Ilhas, na Catalunha Nord ou no Pais Valencià. As que votamos ‘nom’ entendíamos que a concorrência às eleiçons de 2012 contribuiria a que o Principat estivesse numha dimensom política muito diferente da qual se pudesse dar no conjunto do território.
Contudo, as que nos devemos á cultura assembleária, figemos campanha e participamos da entrada ao Parlament.
Pensas que a entrada nas instituiçons tem relaçom com a perda da militância na rua?
Trata-se de umha combinaçom de ciclos naturais de mobilizaçom. Havia todo um dispositivo de pessoas que antes estava na briga da rua e agora está em instituiçons. Isto é objetivo, e ademais já tem acontecido noutros momentos da história.
Urgiria um debate coletivo para além de siglas que nos permita fazer umha radiografia das necessidades e poder distribuir os poucos recursos de que dispomos, de forma que nom descapitalicemos determinados espaços para colocar pessoas nas instituiçons.
Em 2011 CiU converte a independência na soluçom para a crise económica. A partir deste momento o discurso independentista fai-se transversal. Como gere isto a CUP?
"Havia todo um dispositivo de pessoas que antes estava na briga da rua e agora está nas instituiçons"
Quem fam transversal a reivindicaçom independentista som as pessoas, quem desborda as ruas som as pessoas, e quem corrige a Convergència quando advoga por um pacto fiscal também som as pessoas. Esta gente, longe de ser um lóbi identificado com umha determinada classe social, provém de origens mui diversas.
É evidente que para as que entendemos a independência como um motor de transformaçom acompanhada da libertaçom social, o que nos pom em contradiçom é fazer alianças com forças políticas com as que nom partilhamos nem a sua conceiçom de independência nem o modelo de país nem de território.
Na outra banda, na do statu quo vigente do Estado espanhol, também há forças de direitas com as que nom partilhamos nem o modelo educativo, nem cultural, nem social nem económico.
Nas duas bandas teremos forças políticas adversárias, mas no marco do Estado espanhol pensamos que nom há margem para transformaçom e na banda das que apostam na independência entendemos que sim.
Na Galiza há sectores do nacionalismo que pensam que a CUP está apostando mais na política de direitos sociais em detrimento da construçom nacional. O que achas desta visom?
Nem coincido com quem nos querem ver como umha força política que fijo um pacto com a burguesia e abandonou o espírito de tranformaçom nem com quem pensam que todo o que estamos reivindicando em chave social ou feminista é pôr paus nas rodas a luita independentista. Penso que estas leituras venhem de posiçons que nom aglutinam todas estas demandas no seu ideário.
Nós ao mesmo tempo que investimos a um presidente de um partido como Convergència estamos dizendo ‘nom’ a uns orçamentos que nom reuniam uns mínimos. Isto é esquerda independentista: querê-lo todo e jogar com as fendas que se podem ir abrindo.
Se Catalunha conseguir a independência, como afetará às outras naçons sem estado?
A nossa tese é que a independência de qualquer naçom sem estado contribui à democratizaçom do estado. Nom imaginamos que um revulsivo de qualidade democrática como o exercício da autodeterminaçom nom faga um Estado espanhol melhor, já que contribuirá a abalar os cimentos do regime.
Gostaríamos de pensar que no resto de estado vem em nós umha via de democratizaçom. Nom só as naçons sem estado, também a gente trabalhadora do Estado Espanhol que tampouco merece o estado que tem. Ainda nem sendo umha naçom sem estado, tés de querer que este rompa com o franquismo definitivamente. Grande parte do problema é que fica muito franquismo institucional, político, judicial e económico e qualquer afám democrático contribuirá a romper com esse passado e presente nefasto.
Em momentos chaves da legislatura o foco mediático pujo-se na CUP para tentar inclinar a balança de umha banda. O chamado “pressing CUP”. Achas soubestes explicar bem o vosso posicionamento?
"Gostaríamos de pensar que no resto do estado vem em nós umha via de democratizaçom"
Nos cálculos eleitorais nom se esperava um cenário em que nós fôssemos um agente decisivo. Nem nós mesmas figéramos esta projeçom. A gente que vem dos ateneus e as antissistemas tenhem a capacidade de artelhar maiorias e minorias. Isto leva-nos a várias reflexons: Primeiro, a da cultura política imperante neste país, acostumada a umha dinámica de maiorias mui sólidas. Segundo, a de que tipo de meios de comunicaçon temos, um dos grandes temas a debater no processo constituinte: os meios públicos e o exercício de lóbi que lhe fam a determinadas classes sociais, o papel dos meios privados e como de esquecidos temos os meios comunitários. O terceiro elemento é quanto custou encontrar em determinados debates tertulianos que explicassem com rigor o nosso posicionamento enquanto na rua era muita a gente que nos entendia. Nesses dias fôrom muitas as que nos mostrárom o seu apoio e se indignárom por como nos tratavam os meios.
Quando Anna Gabriel era moça e começava a militar, imaginava que seria assim a independência de Catlunya, agora que fica tam pouco para consegui-la?
A resposta seria nom. Quando era nova tinha um cartaz no meu quarto que me pujera a minha nai, militante do PSUC, e que me acompanhou muitos anos. Lembro perfeitamente: nele havia imagens da Nicarágua sandinista, da África do apairtheid, das mulheres palestinianas… Sempre vinculei a liberdade do meu povo a esta ideia de justiça gigante. Isto fai que a nível pessoal me sinta violentada por pequenas injustiças quotidianas mas também polas grandes injustiças internacionais. Nom vou sentir que o meu povo é livre só por ver umha Catalunha independente.
Vejo aqui a perseguiçom dos manteiros de Barcelona e essas imagens remetem ao meu cartaz: um polícia branco pisoteando um moço negro. Isto passa aqui e agora, acontecerá de novo amanhá… A independência tem que servir para acabarmos com estas imagens.
Que trabalho tem por diante a CUP o dia que Catalunha seja um país livre?
Todo. Suponho que haverá pessoal que se desmobilizará quando se consiga a República catalá. Nom sabemos como será o processo constituinte, até onde chegará, quais maiorias somaremos com umha vontade para nacionalizar certos setores estratégicos nem se ganharemos a batalha da educaçom pública. Portanto, é muito provável que nom cheguemos a atingir todos os nossos sonhos. Nós nom propomos outro caminho que o de seguir militando, de entrada e de forma muito clara, na construçom nacional.
“O processo constituinte tem que permitir situar o feminismo como eixo transversal”

Feminicídios, desigualdades salariais, abusos contra as mulheres, micromachismos… Como luita a CUP contra o patriarcado?
Quando falamos em processo constituinte e em rutura com o estado também falamos nisto. Neste país nom houvo um processo constituinte desde o ano 36. É dizer, nom fica ninguém vivo que nos poda falar aqui de processo constituinte. Mas o que este significa é pôr a debate todo, todas as regras vigentes até o de agora.
Há pouco estivo aqui umha ministra de Bolívia e falava de como no seu país participárom muitos coletivos de mulheres na nova Constituiçom e nela ficam recolhidos o tema dos cuidados, as nais solteiras e está tipificado como delito o insulto misógino às mulheres com cargos públicos.
Os processos constituintes tenhem que ser processos de participaçom que nos permitam situar o feminismo como eixo transversal de todas as políticas e para isto temos que aproveitar a ebuliçom atual do movimento feminista. O feminismo nom se parará, nom está disposto a que depois da independência e de conquistar toda umha bateria de direitos lhe toque o turno a ele.
Como se combate o machismo dentro da própria organizaçom?
O heteropatriarcado impregna-nos a todas, também às nossas militantes, e portanto nom estamos isentas de um sistema que bombardeia com mensagens que situam a mulher por baixo do homem. Nos últimos tempos muitas das nossas militantes figeram um trabalho de revisom, de formaçom e de conscientizaçom que nos situa em melhores condiçons que parte da populaçom. Somos cientes de que temos que fazer mais, ser mais ativas, menos tolerantes com situaçons que se produzem e mais contundentes. Por exemplo, a CUP nom fijo campanha para responder os insultos machistas às mulheres com cargos públicos dentro da CUP. Fôrom as companheiras feministas da esquerda independentista as que saímos publicamente dizendo basta de insultar-nos de umha perspetiva misógina. Figemos visível que se nos insultava só por ser mulheres. Falavam de “putas, velhas, malfolladas”… nom nos diziam comunistas, antissistemas e amigas de Venezuela.