A incorporaçom das mulheres ao mundo laboral assalariado trouxo consigo novas agressons misóginas, concretamente o acosso sexual. Isto evidencia que o acosso sexual no trabalho nom é um tipo de acosso laboral, senom um tipo de violência machista. A visibilizaçom do conceito e a sua incorporaçom à legislaçom no estado espanhol, também na penal, foi resultado do contágio do logro do movimento feminista nos EUA nos anos 70. Os elementos objetivos e subjetivos do injusto, que reúnem as condutas do acosso sexual, som um todo complexo que nom se explica atendendo apenas a conduta visível (as insinuaçons, as chantagens, os acurralamentos e/ou o próprio assalto sexual de maior ou menor gravidade). Há todo um sistema patriarcal que sustenta essa violência que requer ser nomeada de forma específica, posto que sem essa análise nom pode ditar-se sentença que tente reparar a vítima e que suponha umha condena do agressor.
Nom há opçons, no marco isolado da profissom da avogacia de umha visom feminista, para luitar contra as agressons machistas. É necessário um contexto mais amplo que implique um questionamento radical do sistema, e isto nom é através do exercício dumha profissom, senom ao seu pesar.
É necessário mudar parâmetros vitais para modificar as estruturas do sistema, que fagam realmente que os alicerces se timbaleiem. Conseguimos vitórias, muitas, ganhamos batalhas, muitas, mas nengumha guerra. Nom ganhamos nem sequer no nosso terreno, nem nas nossas casas, nem no nosso trabalho. Tampouco nos partidos políticos e sindicatos, nom ganhamos nos movimentos sociais e as ruas nom som nossas, mas é que ademais, deixamos cadáveres no caminho obviando as violências que estám por baixo da nossa.
O feminismo das mulheres racializadas, especialmente das mulheres negras, deu-nos umha liçom que parecemos nom estar dispostas a aprender.
O feminismo das mulheres racializadas, especialmente das mulheres negras, deu-nos umha liçom que parecemos nom estar dispostas a aprender. Temos, contra delas, a mesma resistência que sofremos dos homens do bando “amigo” quando rejeitam ver-se reflexados nas nossas denúncias históricas. As mulheres brancas esquecemos olhar-nos os sapatos e ver que debaixo dos nossos pés tínhamos as cabeças das companheiras racializadas sobre as quais estamos a exercer historicamente a mesma invisibilizaçom, negaçom e violência que denunciamos contra nós na própria esquerda.
As nossas redes sociais estám cheias de mensagens reivindicando penas mais duras para determinados delitos; interpondo querelas criminais por expressons de ódio contra as ideologias de esquerda ou feministas; pedindo regulaçons para isto e para aquilo; legitimando, em definitiva, as instituiçons e estratégias do sistema criminal que nos oprime. Nom é, em absoluto, que pense que nesse terreno nom devamos luitar (acho todos som terrenos de luita), mas pretender empregar em contra do sistema e acólitos as leis e as penas, que sempre fôrom elementos de repressom dos estados é, ademais de ingénuo, contraditório. É ademais umha armadilha.
A defensa das vítimas das agressons que se realizam ao amparo dumha estrutura social (machistas, racistas, homófobas e torturas por parte das forças de segurança), requer umha análise integral do contexto que rodeia a pessoa que quer denunciar este delito para escolher umha ou outra linha de defensa, que pode até passar por nom acudir à via judicial segundo o grau de indefensom que poida sofrer a vítima e o grau de proteçom que se lhe poida dar.
De nada serve ter umhas leis que condenem a agressom, inclusive penalmente, se ao acudires aos julgados nom tés um mínimo percurso de segurança que respeite a dignidade das pessoas denunciantes, que se atopam, as mais das vezes, com um pessoal policial, médico e judicial sem nengumha formaçom neste tipo de agressons que, maioritariamente, vam questionar o seu relato.
Umha perspetiva feminista interseccional da abordagem da defensa das vitimas deste tipo de agressons requer que levemos as nossas reivindaçons a outro nível, fugindo dos dogmas, que som em si mesmos e por definiçom, excludentes das realidades mais vulneráveis.
De nada serve ter umhas leis que condenem a agressom, inclusive penalmente, se ao acudires aos julgados nom tés um mínimo percurso de segurança.
Centrar as reivindicaçons feministas no castigo dos agressores e nas reformas legais desatendendo todo o que rodeia o amparo económico e psicossocial das mulheres vítimas destas agressons machistas é um erro que nom deixamos de pagar bem caro. Como se volveu contra nós a suposta vitória de que fosse introduzido no ordenamento jurídico o delito de agressom sexual, por exemplo, é paradigmático da capacidade de reinvençom do capitalo-patriarcado criminal. Denuncia, dizem, como se isso pugesse ponto final ao problema.
A hecatombe em simultâneo à interposiçom dumha denúncia (perante qualquer autoridade, judicial ou nom) dumha agressom machista (ou racista, homófoba ou por torturas) nom se nomeia, nom se intervém e nom se debate, porque isso implica um questionamento radical do sistema.
Há que deixar de buscar talonários de receitas onde escolher a opçom de reivindicaçom ou pauta de comportamento a seguir nestes casos, acudindo a indicaçons de profissionais, pessoas “expertas” na matéria que, por um lado evidenciam a indefensom aprendida que nos fai sentir-nos incapazes de resolver a situaçom por nós mesmas e, por outro, permitem-nos eludir a corresponsabilidade de cada quem no seu âmbito, seja o qual for, na criaçom de espaços de proteçom integral das pessoas vítimas dessas agressons para que o peso da sua denúncia nom recaia nelas.
Atualmente, denunciar umha agressom machista implica elevar-se à categoria de heroína, sobre-expor-se tanto física como emocionalmente e ser julgada polo teu entorno familiar, laboral e social. Significa também, receber violência institucional ao nom terem-se estabelecidos canais seguros de denúncia que protejam a mulher do trauma psicológico de ter sofrido a agressom, tendo que repetir continuamente perante distintos atores jurídicos, sociais, policiais, assistenciais e médicos, o relato da agressom sofrida. Umha media de doze ocasions, no mínimo (muitas das vítimas passam das vinte).
Atualmente, denunciar umha agressom machista implica elevar-se à categoria de heroína, sobre-expor-se tanto física como emocionalmente e ser julgada polo teu entorno familiar, laboral e social. Significa também, receber violência institucional ao nom terem-se estabelecidos canais seguros de denúncia que protejam a mulher.
Nom existem protocolos tam simples e económicos como o de estabelecer a gravaçom da declaraçom da vítima com fim de evitar que conte, caso poida, repetidamente, o relato da agressom sofrida. Nom há estabelecido um protocolo de acompanhamento para as vítimas no deambular institucional que necessariamente vam ter que fazer assim se interpom umha denúncia. Existe, isso sim, a obrigatoriedade de dar-lhes um papel onde consta que, como vítima de delitos violentos, tem determinados direitos que nom chegará quase nunca a saber onde podê-los exercer.
Nom há a mais mínima intençom, por parte dos poderes públicos, de protegerem integralmente umha pessoa vítima de violências políticas, já for esta machista, racista ou ambas, porque a sua rebeldia contra essa situaçom nom está prevista e nom é assumível. Aceita-se a sua existência no rol de vítima a sofrer, mas nom no de pessoa reconstruída (as violências políticas destroem) e empoderada que exige reparaçom e responsabilidades ao entorno que sustenta essa violência.
Urge deixar de procurar soluçons jurídicas e políticas desde o feminismo para acabar com as agressons machistas, entendendo que estas sigam a ser um sistema de defensa, mas só retomando as ruas como forma de luita. Urge refundar o feminismo na sua ampla diversidade onde nom deixemos atrás companheiras e realidades negando os nossos privilégios. Urge renunciar a eles e exercer um feminismo interseccional e verdadeiro que nom poida ser engolido polo sistema branco capitalista, heterossexual e patriarcal, de volta a nós pervertido em forma de lemas nas camisetas da semana da moda de Zara.