Muitas das mulheres encarceradas que escrevérom sobre a sua experiência na prisom definírom-se como duplamente oprimidas enquanto mulheres e prisioneiras. Com efeito, a prisom é umha instituiçom que ativa fortemente a regulaçom de género, entre outros tantos mecanismo disciplinares. De facto, na atualidade a prisom é um dos lugares onde a segregraçom de género se instaura com maior rigidez e onde os roles de género estám mais fortemente marcados. Nesse contexto, os estudos antropológicos e sociológicos feministas desenvolvérom múltiplas investigaçons sobre os mecanismos disciplinares patriarcais e sobre as experiências carcerárias das mulheres presas (bem como sobre as suas formas específicas de resistência).
Nas duas últimas décadas, antrópologas, sociólogas e ativistas como Elisabet Almeda, Mary Bosworth, Angela Davis, Dolores Juliano, Estibaliz de Miguel e María Ruiz Torrado criticárom o olhar histórico de Michel Foucault, posto que ao descrever a evoluçom dos sistemas de cativeiro nom atendeu as instituiçons que historicamente mantivérom cativas as mulheres, nem as suas experiências carcerárias específicas.
Nas duas últimas décadas, antrópologas, sociólogas e ativistas como Elisabet Almeda, Mary Bosworth, Angela Davis, Dolores Juliano, Estibaliz de Miguel e María Ruiz Torrado criticárom o olhar histórico de Michel Foucault, posto que ao descrever a evoluçom dos sistemas de cativeiro nom atendeu as instituiçons que historicamente mantivérom cativas as mulheres, nem as suas experiências carcerárias específicas. Graças a todos esses trabalhos fôrom detetadas as discriminaçons a que som submetidas as mulheres por parte do sistema penal e penitenciário, como a dispersom territorial, as atividades formativas feminizadas, o regime de visitas orientado ao cuidado ou a ressocializaçom de género.
Solidariedade carcerária e feminista
As prisons regulam as subjetividades das pessoas encarceradas e, para isso, nega-lhes a voz pública e obstaculiza a sua comunicaçom com o exterior. No caso das mulheres presas o silêncio e o isolamento é maior. Portanto, é preciso ativar umha escuita política que reconheça a sua capacidade de agência. Atender a escrita das cativas nom é tanto umha via para aliviar os seus padecimentos como umha maneira de gerar canais para elas puderem colaborar ativamente na descriçom da realidade, na proposta de alternativas ao atual sistema punitivo e no caminho cara a umha sociedade sem prisons. Como reivindicou Angela Davis, é preciso conceber essas capas de violência a que som submetidas as presas para entender as complexidades dos processos de repressom política.
Atender a escrita das cativas nom é tanto umha via para aliviar os seus padecimentos como umha maneira de gerar canais para elas puderem colaborar ativamente na descriçom da realidade, na proposta de alternativas ao atual sistema punitivo e no caminho cara a umha sociedade sem prisons.
Com esse objetivo, o movimento feminista atendeu historicamente a situaçom das mulheres cativas, posto que em quase todas as jornadas feministas fôrom tratados tanto o machismo do sistema punitivo quanto a prisom como instituiçom patriarcal. No estado espanhol, umha das precursoras da escrita carcerária foi Eva Forest: Diario y cartas desde la cárcel (1975) e Testimonios de lucha y resistencia (1977). Justamente as suas cartas e o seu diário fôrom publicados graças ao apoio do movimento feminista francês, mui ligado na década de 70 à luita anti-franquista e anti-repressiva (lembre-se que o 5 de outubro de 1975 o movimento feminista francês mesmo convocou umha marcha de mulheres contra a repressom franquista).
A maioria das vezes, a escrita de presas que questionárom a instituiçom penitenciária foi publicada graças a coletivos militantes, muitos deles com posiçons feministas: movimentos políticos facilitárom a publicaçom das cartas da prisom de Rosa Luxemburgo (1916) e as memórias carcerárias de Nawal El Saadawi (1983); movimentos culturais promovérom a publicaçom dos poemas da peruana Maga Portal (1940); os movimentos anti-racistas ajudárom a publicar a autobiografia carcerária de Assata Shakur (2001); os movimentos transfeministas articulárom a publicaçom dos textos de prisom de Patricia Heras (2014); o movimento feminista abertzale apoiou a publicaçom dos poemas de Ekhine Eizagirre (2016), entre outros casos que poderiam ser referidos.
Como se observa, a maioria dos textos pertencem a pessoas ativistas ou militantes. Mas som poucos os textos publicados de presas mais isoladas, que nom tenhem relaçom algumha com movimentos culturais, sociais e anti-repressivos. As únicas outras vozes femininas que ultrapassárom os muros das prisons fôrom as das pessoas que participárom em obradoiros de escrita organizados na mesma prisom por associaçons sociais, culturais ou educativas. Na Argentina ou no México, por exemplo, nesta última década multiplicárom-se este tipo de obradoiros, sobretodo em prisons de mulheres, porque som atividades que, da perspetiva carcerária, mais ou menos encaixam nas expectativas de género (o testemunho pessoal, a transmissom de sentimentos etc).
A maioria dos textos pertencem a pessoas ativistas ou militantes. Mas som poucos os textos publicados de presas mais isoladas, que nom tenhem relaçom algumha com movimentos culturais, sociais e anti-repressivos.
Nessa linha destaca o trabalho do coletivo argentino Yo No Fui, que surgiu em 2002 na prisom de mulheres de Ezeiza (Buenos Aires), e mesmo animou as presas a organizarem umha editorial cartoneira e autogerida. Ainda que este tipo de obradoiros podem ser cruciais no empoderamento das presas, muitas vezes nom é a via mais eficaz para denunciar o sistema ou para difundir incómodas realidades carcerárias. Complementarmente, graças ao labor de investigadoras feministas, fôrom publicados em trabalhos antropológicos, cartas, apontamentos e diversos textos de presas em situaçons mais vulneráveis, como as migrantes ou as trabalhadoras sexuais.
Escrita e resistência feminista
Nos textos carcerários escritos por mulheres, apreciam-se certas linhas temáticas recorrentes, que aparecem tanto em publicaçons literárias como nos textos compilados nesses trabalhos antropológicos. Mostra-se em muitos deles o desarraigamento familiar, já que enquanto os presos homens costumam expressar que as famílias som o seu apoio e sustento, o sistema agrega às presas o sentimento de culpa por terem abandonado a família. Encontramos também a denúncia da ressocializaçom de género, dado que a maioria dos programas educativos, formativos e laborais estám encaminhados à sua feminizaçom.
Todos estes sujeitos encarcerados, longe de admitir silenciosamente o seu destino, luitam por alçar a voz para, mediante a palavra, gerar espaços de resistência e de rebeliom.
Além disso, os textos visibilizam o caráter moralizador das penas impostas às mulheres, posicionadas entre o castigo e o pecado, e denunciam portanto que a sua sançom vai além do âmbito legal: o castigo é imposto por se afastarem dos roles incutidos pola sociedade. Como em toda prisom, a sexualidade está regulada e vigiada, mas para transgredir essa proibiçom e procurar no prazer sexual um espaço de resistência, em muitos textos carcerários as presas elaboram a sua subjetividade sexual, representando relaçons afetivas entre reclusas, desejos eróticos ou a masturbaçom, entre outras vertentes.
Todos estes sujeitos encarcerados, longe de admitir silenciosamente o seu destino, luitam por alçar a voz para, mediante a palavra, gerar espaços de resistência e de rebeliom. Ao mesmo tempo, nas presas a escrita é um ato duplamente subversivo, porque também socavam as expetativas culturais (submissom, docilidade, atitudes de serviço…) que lhes impom o régime de género que as tem encarceradas.