Como bem é sabido, umha parte cada vez mais importante da experiência mental e emocional das pessoas, também na Galiza, está sendo configurada cada vez mais polos ecráns dos telemóveis, computadores e televisons. Os inquéritos indicam que 72% dos lares galegos disponhem dum computador, 69% de banda larga e 92.9% utilizárom um dispositivo móvel nos últimos três meses. Estima-se que em 2015 os dispositivos móveis a nível mundial já alcançárom os 7.9 mil milhons de unidades, mais do que pessoas no planeta, e a tendência continua a aumentar. Existe um forte consenso social em que as novas tecnologias, e especialmente a rede, contribui para criar sociedades mais interligadas, mais informadas e, portanto, mais conscientes do mundo em que habitamos. Som, sem dúvida, as vantagens do “inevitável” progresso tecnológico na era da informaçom. Ainda assim, o que costuma passar mais inadvertido é o facto de a realidade virtual constituir umha grande máquina de produçom de subjetividade, mormente conforme com os paradigmas predominantes. Informaçons e relaçons que circulam, ao mesmo tempo que informaçons e relaçons que se empobrecem e destroem. Como bem analisou o sociólogo Zygmunt Baumann, as interconexons e os vínculos que se geram na rede som líquidos, e adotam formas cada vez mais precárias, fragmentadas, voláteis e utilitaristas próprios do projeto da modernidade colonial. Ora, tema aparte, o que sem dúvida nom som voláteis nem líquidas som as necessidades materiais que sustentam esta realidade virtual.
Estudos apontam a que um computador de sobremesa requer aproximadamente 240 kg de combustíveis fósseis, 22 kg de produtos químicos variados e 1,5 toneladas de água
O sociólogo e psicólogo Fernando Cembranos aponta para umha das contradiçons mais inquietantes dos nossos tempos: paralelamente a que os territórios que habitamos se vam degradando ou empobrecendo e os conflitos polos recursos aumentando, as novas tecnologias de produçom da realidade som capazes de construir umha escapada virtual cada vez com maior nitidez e resoluçom, cores e possibilidades de desfrute individualizadas. Nos nossos contextos, seguramente, a maioria das pessoas que conhecemos sabem o que o som as alteraçons climáticas ou já algunha vez ouvírom falar da crise ecológica. Mas, seguramente também, mui poucas temos consaciência real da importáncia capital destes acontecimentos, tanto a nível global como quotidiano. Desde meados da década de 70, o consumo mundial de energia e materiais, assim como os resíduos gerados a nível mundial, superam a biocapacidade do planeta. Nunca antes na história da humanidade os sistemas económico e tecnológicos estivérom tam em guerra contra a biosfera como na atualidade. Este sim que é um facto realmente Histórico com maiúsculas. Apesar disto, as tecnologias modernas, e em especial as TIC e a rede, nom só continuam a ter mui boa imprensa, como, além disso, som apresentadas como parte indispensável da soluçom. Isso sim, agora sob novas retóricas da sustentabilidade, economia imaterial ou da informaçom que prometem possibilidades infinitas de futuro.
Nunca antes na história da humanidade os sistemas económico e tecnológicos estivérom tam em guerra contra a biosfera como na atualidade.
O ciclo de vida das tecnologias
Umha análise um pouco menos tecno-entusiasta deixa ver facilmente os sérios problemas de entendimento que tem a tecnologia moderna com os sistemas biofísicos que a sustenta. Dito doutra forma, as novas tecnologias, e em particular as da comunicaçom, tenhen importantíssimos custos ecológicos que constituem a face invisível e material do que, comummente, é conceptualizado como virtual e imaterial. Para poder dimensionar esta materialidade da imaterialidade virtual, é necessário ter umha visom global do ciclo de vida destas tecnologias: desde que se extraem os materiais necessários para fabricar os dispositivos que utilizamos até os resíduos que geram, passando pola construçom e manutençom das infraestruturas necessárias que permitem o seu funcionamento. O consumo, ou o impacto directo do uso dos telemóveis, computadores, tablets, TVs, é so umha parte do problema, nom é o todo. Como suspeitamos, a rede é umha voraz consumidora de energia/materiais-emissons/resíduos. Centos de servidores, hubs, routers, modems e outros aparelhos eletrónicos consomem constantemente energia elétrica. Estima-se que manter esta estrutura globalizada de dados requer, segundo o investigador da Universidade de Stanford Jonataham Koomey, 10% da eletricidade mundial. A International Science Crid estima que as TIC geram cerca de 4% das emissons de gases de efeito estufa equivalente à da indústria aeronáutica. Sem dúvida, umha percentagem nada depreciável.
Quanto mais modernos e tecnológicos forem os nossos bens de consumo, mais modernos e tecnológicos serám os nossos resíduos
Num estudo para as Naçons Unidas, o doutor em física Eric Williams e em economia Ruediger Kuehr monstrárom como a fabricaçom de dispositivos electrónicos é altamente intensiva no uso de recursos naturais ultrapassando largamente outros bens de consumo. Segundo as suas estimativas, fabricar um computador de secretária requer cerca de 240 kg de combustíveis fósseis, 22 kg de produtos químicos variados e 1,5 toneladas de água. O peso dos combustíveis fósseis e a água multiplicam por 100 e 600 o peso do próprio computador. Que tentado estou nestes momentos de utilizar esta relaçom para aproximar-me ao impacto dos 7.9 mil milhons de dispositivos móveis dos quais falávamos anteriormente, um número que vai crescendo. Apesar disto, a tendência é mudar os dispositivos cada vez mais rápido, a obsolescência programada. No Estado espanhol, um estudo conclui que os móveis som substituídos aproximadamente quatro anos antes da sua obsolescência programada. Estes milhares de dispositivos em des-uso geram milhares de problemas de resíduos. Quanto mais modernos e tecnológicos forem os nossos bens de consumo, mais modernos e tecnológicos serám os nossos resíduos devido ao carácter entrópico da economia. Mais isto parece ser um problema menor na era da informaçom e/ou que importa relativamente pouco nas sociedades de consumo, sobretodo enquanto pudermos continuar deslocando os resíduos e os custos cara outros territórios, mais pobres, com certeza.
Conflitos ecológicos distributivos, neo-extracionismo e esgotamento dos recursos naturais
Partindo das premissas da ecologia política, todo problema ambiental constitui um conflito sócio-económico presente ou futuro. Conflito mediado, inevitavelmente, polas relaçons de poder e o privilégio que permite acumular riquezas à custa de socializar custos de todo tipo. De igual forma que o famoso coltám, o platino, paládio ou vanádio, entre muitos outros, som três minerais nom energéticos que constituem raridades na crosta terrestre e que som indispensáveis para o funcionamento desta “nova economia”. Como a leitora bem intuirá, estes minerais som recursos nom renováveis, e como tal, tenhen o mau costume de se esgotar. A escassez objetiva de recursos minerais nom energéticos constitui outro dos grandes limites biofísicos que ameaçam o projeto da modernidade tecnológica. Esta preocupaçom é relatada ate pola Uniom Europeia no seu relatório “Crítical Materials Strategy, Report (DOE 2011)” onde analisa os riscos de fornecimento de minerais, relacionados com o esgotamento e/ou conflitos geopolíticos, em funçom da sua importáncia estratégica para a economia a curto/meio prazo (horizonte 2025). Dumha perspectiva sócio-ambiental, poderia-se dizer que na medida em que as novas tecnologias se expandem e consolidam gerando possibilidades de futuro virtual, estreitam-se as possibilidades mesmas de futuro. Paradoxal.