Periódico galego de informaçom crítica

As etiquetas no tempo de nom etiquetar-se

por
carla trin­dade

Estamos a vi­ver um tempo pa­ra­do­xal, de­vido à pro­li­fe­ra­çom de di­ver­sas no­men­cla­tu­ras a res­peito da ori­en­ta­çom, do de­sejo e da iden­ti­dade se­xual. Este pa­ra­doxo ra­dica no facto de apa­re­ce­rem no­vos con­cei­tos num tempo em que os mo­vi­men­tos so­ci­ais re­cla­mam a au­sên­cia de eti­que­ta­gem al­gumha. Entom, como é que ten­de­mos cara a um mundo li­vre de eti­que­tas onde a cada vez sur­gem mais? O único ob­je­tivo será o de abrir por­tas, ja­ne­las ou es­ca­var tú­neis cara à com­pre­en­som desta realidade.
A Sexologia Substantiva, in­for­tu­na­da­mente pouco es­cui­tada no nosso con­texto ga­lego, es­tuda o facto de ser­mos se­xu­a­dos. Emprega-se ser se­xu­ado cada vez com mais frequên­cia mas de forma ca­rente de con­teúdo, man­tendo o sexo (aquilo que so­mos, nom que te­mos nem fa­ze­mos) num es­paço re­ser­vado ao ter­reno dos pe­nes e das va­gi­nas, em lu­gar do dos ho­mens e das mu­lhe­res. A se­xo­lo­gia subs­tan­tiva es­tuda o su­jeito se­xu­ado, nos seus de­se­jos, iden­ti­da­des, en­con­tros e de­sen­con­tros, as­sim como na cons­tante pro­cura de to­par-se com o ou­tro. Do modo que cada quem viva essa pro­cura, sem ro­tas pre­de­ter­mi­na­das e le­gi­ti­mando as vi­vên­cias. Vaia, aca­ba­mos de in­tro­du­zir um mini-marco e é pre­ci­sa­mente um marco o in­gre­di­ente bá­sico para po­der for­mu­lar con­cei­tos. Nom to­dos os mar­cos vam ser iguais. Nem o marco da se­xo­lo­gia subs­tan­tiva o único. Com cer­teza. Mas nom me­nos certo é que na era das no­vas tec­no­lo­gias exige-se res­posta ime­di­ata, e as res­pos­tas ime­di­a­tas nom sem­pre som as mais con­tex­tu­a­li­za­das e reflexionadas.

A eti­que­ta­gem das re­a­li­da­des sexuais
O facto de ser­mos se­res se­xu­a­dos ba­seia-se no prin­ci­pio da di­ver­si­dade se­xual e nom sem­pre con­corda com a norma so­cial im­pe­rante. Todas as re­a­li­da­des se­xu­ais som re­a­li­da­des in­ter­se­xu­ais (termo cu­nhado por pro­fis­si­o­nais da Sexologia da Primeira Geraçom de fi­nais do sé­culo XIX), nom for­mam parte de com­par­ti­men­tos iso­la­dos mas­cu­li­nos-fe­mi­ni­nos, se­nom dum con­tí­nuo onde to­das as va­riá­veis e com­bi­na­çons som pos­sí­veis, fora de todo bi­na­rismo. Falar de to­das as va­riá­veis pos­sí­veis en­globa tanto as ge­ne­ra­li­da­des co­muns como os fei­tos de di­ver­si­dade me­nos ha­bi­tu­ais. A per­pé­tua eti­que­ta­gem está mais re­la­ci­o­nada com pôr a lupa so­bre as se­xu­a­li­da­des de­no­mi­na­das nom-nor­ma­ti­vas e nom tanto no con­junto de vi­vên­cias se­xu­ais. E se­xu­a­li­da­des som to­das, nom som? As trans­gres­so­ras com a norma e às que a norma lhe en­caixa como feita à medida.

A perpétua etiquetagem está mais relacionada com pôr a lupa sobre as sexualidades denominadas nom-normativas e nom tanto com o conjunto de vivências sexuais.

Múltiplas eti­que­tas pró­prias das fon­tes de ali­mento da norma so­cial nom es­pe­ci­a­li­zada em se­xu­a­li­dade te­nhem sen­tado cá­te­dra. As se­xu­a­li­da­des sau­dá­veis e do­en­tias das ba­tas bran­cas; boas ou más, dos pu­ri­ta­nis­mos mo­ra­lis­tas às que som sím­bolo de pro­gresso ou con­ser­va­do­rismo da po­lí­tica; o mar­ke­ting se­xual que tem uni­ca­mente como re­fe­rên­cia as co­tas de pra­ze­res pi­ro­téc­ni­cos se al­can­ça­rem (como se o pra­zer fosse quan­ti­fi­cá­vel ou vi­ven­ci­ado em igual­dade co­mu­ni­tá­ria) … Todas es­tas fon­tes de ali­mento da norma re­du­zem com as suas eti­que­tas o sexo à en­tre­perna, e sem ras­tro de diversidades.
A cri­a­çom de con­cei­tos gera re­a­li­da­des, di­ze­mos ha­bi­tu­al­mente aque­les pro­fis­si­o­nais que pro­mo­ve­mos um marco teó­rico do se­xual ci­en­tí­fico e de ri­gor. É pre­ciso ma­ti­zar que com a cri­a­çom de con­cei­tos se mos­tram re­a­li­da­des, mas a no­vi­dade do con­ceito ou o seu des­co­nhe­ci­mento por chocante/raro/novo/diferente/pouco ha­bi­tual, nom fai nova a vi­vên­cia se­xual, que é in­di­vi­dual den­tro da di­ver­si­dade le­gí­tima por si pró­pria. Estas vi­vên­cias es­tám aí desde to­dos os tem­pos, es­con­di­das em mui­tas oca­si­ons (se­gundo o mo­mento his­tó­rico) por unha vi­som do se­xual ten­den­ci­osa. Noutras pa­la­vras, as no­vas eti­que­tas mos­tram, mas des­co­brem no­vas re­a­li­da­des. Se se­gui­mos a per­mi­tir que o sexo es­teja en­cer­rado na en­tre­perna po­de­re­mos abri-las, mas con­ti­nu­a­re­mos a ter as ore­lhas fe­cha­das, fe­chando as­sim as por­tas ao pen­sa­mento e ao co­nhe­ci­mento dum mapa teó­rico se­xual como ofe­rece o Feito Sexual Humano. Por ve­zes é pre­ciso ela­bo­rar umha aná­lise de cus­tos-be­ne­fí­cios pe­rante as si­tu­a­çons, e a atual apa­ri­çom de no­vas eti­que­tas é po­si­tiva no en­ten­di­mento das vi­vên­cias se­xu­ais que nom en­cai­xam na norma?

flo­ren­cia capello

O afe­tivo e o sexual
Como co­lo­fom da cri­a­çom de eti­que­tas está a dis­tin­çom en­tre o afe­tivo e o se­xual. Separados, como se dum te­le­filme se tra­tasse, ao nas­cer: o pri­meiro pa­rece car­re­gado de emo­çons, ex­pe­ta­ti­vas e pla­nos de ca­sa­mento ao es­tilo Disney; o se­gundo car­nal, lú­brico, he­do­nista, si­ca­líp­tico e por­no­grá­fico. Como se umha li­nha di­vi­só­ria par­tisse o nosso corpo en­tre o co­ra­çom e a en­tre­perna. Nalgum mo­mento, por in­te­res­ses di­ver­sos, dei­xa­mos de ser um corpo que ex­pe­ri­menta sen­sa­çons, ex­ci­ta­çons e emo­çons, num todo em um, a ser um com­par­ti­mento iso­lado onde o se­xual só é ge­ni­tal e as emo­çons nom som cor­pó­reas. Olho com o du­a­lismo corpo/alma que con­ti­nua a es­tar muito pre­sente e a exis­tên­cia da alma nom está de­mons­trada ‑de mo­mento.- Binarismo 1 – Diversidade 0. Quantas eti­que­tas sur­gem desta dis­tin­çom en­tre pele e emo­çons? Acaso a pele está des­li­gada das emo­çons ou vice-versa? Podemos nom ser corpo? Ou é mais vá­lido o na­mo­ra­mento do que a excitaçom?

deixamos de ser um corpo com sensaçons, excitaçons e emoçons a ser um compartimento isolado onde o sexual só é genital.

Algumhas eti­que­tas presentes
Existem pro­ces­sos de eti­que­ta­gem que já for­mam parte dos se­res sexuados:
— A eti­que­ta­gem como forma de per­tença a um grupo, que re­força o sen­ti­mento de co­mu­ni­dade. Somos so­ci­ais por na­tu­reza e os pro­ces­sos de so­ci­a­li­za­çom som se­xu­ais, som en­tre sexos.
— A eti­queta da iden­ti­dade. Etiquetar é pró­prio de to­das as es­pé­cies ani­mais atra­vés do me­ca­nismo inato da dis­tin­çom en­tre ma­chos e fê­meas. Este fil­tro conta com um mar­gem de erro im­por­tante, como o que se dá cara às pes­soas tran­se­xu­ais, que so­frem o erro da eti­que­ta­gem ao se­rem se­xu­a­das como o que nom som. O fil­tro nom é fiá­vel ao cento por cento, e nom po­de­mos es­ta­be­le­cer ver­da­des ab­so­lu­tas com ele. Mas isso nom nega que o fil­tro exista e que a eti­que­ta­gem se re­a­liza de forma automática.
— A eti­queta do de­sejo eró­tico, esse ins­tinto que nos fai dis­tin­guir en­tre o que nos ativa o de­sejo eró­tico e o que nom. Esse ins­tinto gera todo tipo de eti­que­tas, desde gos­tar dos ho­mens ou mu­lhe­res até os de­se­jos mais pe­cu­li­a­res e nom con­fes­sá­veis. Este ins­tinto está re­la­ci­o­nado com múl­ti­plos fa­to­res, desde cul­tu­rais a atá­vi­cas an­co­ra­gens eró­ti­cas. Assim, aquela pes­soa que sente de­sejo cara aos ho­mens com muito pelo, pom eti­que­tas se­gundo o seu de­sejo, ao igual que o fai aquela pes­soa que ativa o seu de­sejo com pes­soas com um alto grau de empatia.
O co­nhe­ci­mento, a acei­ta­çom e o fo­mento das vi­vên­cias se­xu­ais po­si­ti­vas que con­tri­buam para a fe­li­ci­dade in­di­vi­dual e para a ótima con­vi­vên­cia co­mu­ni­tá­ria passa pola ne­ces­si­dade de criar con­cei­tos, que quanto me­nos afas­ta­dos es­te­jam da ló­gica dos se­xos mais con­tri­bui­rám para es­tes objetivos.

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