Os projetos de autoediçom agromam com força na Galiza atingindo umha grande relevância nos últimos anos. A popularidade destas iniciativas diversas nom se deve a umha moda repentina, mas a um outro jeito de entender as práticas artísticas e as inter-relaçons que geram. Falamos com três destes projetos e com as artistas que há por trás.
Umha rapariga de 19 anos qualquer
Conhecim a Queixumes através do seu instagram, fazendo isso que agora chamam scrolling e que vem sendo adiar as tarefas obrigadas de toda a vida, mas com um ecrã de telemóvel diante. Entre toda a borralha que esqueceria umhas décimas de segundo depois, chamou-me a atençom umha conta em que as ilustraçons, devedoras dum estilo tradicional galego, e nom sem certo ponto pessoal, misturava-se com diálogos que reproduziam situaçons do nosso dia a dia.
Um mês mais tarde dirigia-me ao centro de Compostela para mercar um dos seus fanzines, sendo já fam convencida do seu material. Quando por fim nos reconhecemos, nom sem certa vergonha matizada polo nosso diálogo prévio na rede, recolhim com ilusiom o meu fanzine e marchei, sendo consciente de que umha bicha dumha dezena de pessoas ia enchendo a Praça do Pam para fazer o próprio. Foi nesse momento quando me decatei de que ali estava passando algo.
Surgem assim fanzines, revistas e contas em instagram ou twitter onde a banda desenhada, a poesia, as ilustraçons, os microrrelatos, a fotografia ou as entrevistas tenhem cabida, sem umha composiçom previamente estruturada, mas sim com um relato consequente.
“Figem um fanzine e umhas camisolas de maneira mui anedótica” — comenta Queixumes. “Nom tinha intençom de converter Queixumes em nada físico, mas quando comecei a morar em Compostela a minha vida estourou em O rizo desfeito, que se chama o fanzine. A respeito da conta em geral, — continua- acho que chegou um momento emocionalmente mui intenso da minha vida em que gostava bastante dos desenhos que fazia para mim e pareceu-me boa ideia criar um espaço de emoçons partilhadas e de profundidade em redes. Ademais, já tinha referentes de moças galegas que faziam o mesmo e doutras artistas de fora que falavam de sentimentos sem dar-lhes demasiada importância, como quem fala do tempo. Gostei disso e deu-me segurança para unir-me ao clube”.
A experiência desta artista nom é, curiosamente, a única. Muitos dos projetos de autoediçom que tenhem atingido umha grande relevância na Galiza dos últimos anos surgírom sem maior intençom que a de partilhar expressons artísticas, sem objetivo de vender produto nengum. Porém, a experiência partilhada nas redes, nomeadamente entre gente nova, e o diálogo aberto a partir destas criaçons fôrom gerando umha rede de conversa que contribuiu, por umha parte, a difundir estes projetos e, por outra, a retroalimentar a existência doutros similares. Surgem assim fanzines, revistas e contas em instagram ou twitter onde a banda desenhada, a poesia, as ilustraçons, os microrrelatos, a fotografia ou as entrevistas tenhem cabida, sem umha composiçom previamente estruturada, mas sim com um relato consequente. Quase sem querer, cria-se umha rede de conversa e interaçom à margem do mundo institucional.
Para Queixumes, a necessidade de expressar as experiências “dumha moça de 18–19 anos qualquer” deu lugar a um projeto que foi além da sua intençom primeira. Ela própria reconhece que é possível que o seu projeto mude de rumo ou mesmo que desapareça, da mesma maneira em que nasceu, com umha honestidade nom fingida que precisamente conseguiu que muitas pessoas nos somássemos à sua experiência, por pura identificaçom.
Umha editora que nom o é
Nesta aparente casualidade, na espontaneidade da própria criaçom, que se partilha sem conhecer os seus limites, nascem outras iniciativas de base, como Leite Edicións. Leite Edicións nom surgiu dumha conta de instagram pessoal, senom da vontade de fazer algo em papel entre amigas, mas, e nisto sim encontraríamos um ponto em comum com a anterior proposta, sem maior pretensom do que esta. Se nos achegamos à sua página de facebook ou instagram, topamos a Afra Torrado e o Pablo Rodríguez, criadorxs da nom-editora, como elxs a definem, vestindo umha camisola com as suas próprias caras.
Pablo Rodríguez: “falamos sobre o mundo editorial clássico galego, sobre como as editoras publicam aos seus próprios amigos sem dizer que som os seus próprios amigos, desde a desonestidade de que aí há umha relaçom estritamente profissional”
Desde esta vontade de restar-lhe seriedade ao projeto, de desvinculá-lo do circuito editorial tradicional e de botar-lhe humor à criaçom poética, nasce um projeto em contínua regeneraçom e que tem conseguido umhas altas quotas de popularidade, especialmente neste último ano. “(Afra e mais eu) falamos sobre o mundo editorial clássico galego, sobre como as editoras publicam aos seus próprios amigos sem dizer que som os seus próprios amigos, desde a desonestidade de que aí há umha relaçom estritamente profissional” — comenta Pablo Rodríguez a respeito do nascimento de Leite. “Leite Edicións aparece um pouco como resposta a essa desonestidade. Nós decidimos ser deliberadamente honestxs: publicamos as nossas amigas e, se quadra, a nós próprias. Nom há nada mais por trás, porque nom fazemos dinheiro com isto, nom vai por aí”.
Mesmo nom tendo essa expectativa, pouco a pouco Leite Edicións foi amparando um círculo de poetas e seguidorxs interessante. Se damos umha vista de olhos ao seu catálogo, leiteedicions.wordpress.com, vemos que várias propostas abertas em pdf somam-se a obras em papel, totalmente produzidas por Leite e sempre a preços económicos, entre as que estám nomes como C. Ermitas ou Lucía Cernadas, cujo poemário, Sutura, vai já pola terceira reimpressom. Quase sem querê-lo, Leite Edicións chegava, por exemplo, ao Diario Cultural da Radio Galega; e digo quase sem querê-lo nom por falta de trabalho, mas precisamente porque o projeto persevera na mesma vontade com que nasceu: a de representar umha plataforma alternativa ao funcionamento sistémico e oferecer um espaço às poetas, especialmente novas, para que se expressem sem esta pressom acrescentada.
O interessante de Leite Edicións, como também me aconteceu com Queixumes aquele dia de verao, foi que me decatei de que valendo-se de diversos canais, nom apenas no virtual mas também nas comunidades das quais fam parte, vam criando umha rede que se estende para além da própria família leiteira. Assim, a livraria Chan da Pólvora em Compostela, por exemplo, converte-se em aliada de jeito orgânico, assim como aquelxs poetas que participárom no recital Leite para os Reis, o passado janeiro. A iniciativa, portanto, vai colhendo forma no real ao tempo que se consolida no virtual.
Pablo Rodríguez, de Leite Edicións, considera que os projetos de auto-ediçom estám vivendo um ressurgir “precisamente porque tenhem umha componente de transparência, sem intermediários, que encaixa mui bem na nossa geraçom (a milenial) pola nossa ideia de democracia real; umha democracia nom-representativa que nom se identifica com o paternalismo que isso implica”. Essa representatividade, e o conseguinte paternalismo, poderiam perfeitamente associar-se aos roles clássicos das editoras com xs criadorxs. “A nossa ideia é atuar como um palco para quem escreve ou para o seu trabalho, que é realmente o que nos interessa, nom mover fios por trás”- assevera.
Ruído criativo desde Valdeorras
Encontramos, portanto, um discurso frontal contra como tenhem funcionado sempre as cousas no mundo da ediçom e da poesia mais canonizada, assim como umha luita por visibilizar o que está invisibilizado. Nesta linha, nasce outra iniciativa: Barullo. Desde a comarca de Val d’Eorras, umha das mais esquecidas nos itinerários culturais tradicionais, surge este projeto da mam dum grupo de moçxs que pretendem, por umha parte, elaborar conteúdos culturais desde e para a comarca e, por outra, dar visibilidade a estas obras e artistas valdeorresxs. “Pensamos que um bom ponto de partida seria a criaçom dum meio através do qual a gente pudesse expressar-se livremente e que servisse de uniom para as pessoas criativas da comarca, ou para qualquer umha que tivesse algo que dizer.- comentam xs fundadorxs de Barullo- Para além disso, estávamos fartas desse tópico de que ‘os projetos culturais falham porque a gente nom colabora’ e que ‘em Val d’Eorras nom há cultura, porque nom há qualidade’. Decidimos passar da queixa à açom, para demonstrar que era possível suster, a nível local, um projeto assim. No caminho surpreendemo-nos porque Barullo medra em cada ediçom, e isso é genial”.
Desde a comarca de Val d’Eorras, umha das mais esquecidas nos itinerários culturais tradicionais, surge este projeto da mam dum grupo de moçxs que pretendem, por umha parte, elaborar conteúdos culturais desde e para a comarca e, por outra, dar visibilidade a estas obras e artistas valdeorresxs.
De novo, o projeto nom surgiu com maior pretensom que a de tornar visível e impulsar o desenvolvimento da cultura, neste caso no eido local, dumha Galiza julgada demasiado a miúdo como inativa ou desleixada: a das geraçons mais novas e também a do rural, cada vez mais despovoado, mas nom por isso baleiro de ideias. Ante a passividade das instituiçons tanto a nível nacional como a nível comarcal ou local, este grupo de moçxs foi-se juntando para elaborar o projeto, que viu a luz com o seu primeiro fanzine em agosto de 2018. Com o tempo, fôrom melhorando em qualidade, reeditando números e somando assinaturas ao projeto. Hoje em dia som perto de 15 pessoas e a sua vontade é a de ser muito mais que um fanzine e converter-se num coletivo de criaçom cultural.
Valendo-se, novamente, das mesmas ferramentas que os projetos anteriores, Barullo começou a dar difusom à sua iniciativa. Se damos umha olhadela à sua conta de instagram ou à sua web encontramos umha estética mui cuidada e umha chamada constante à participaçom. Encontro também, graças às suas redes, que Barullo sustenta um pequeno projeto de autoediçom, para além do fanzine. “O projeto microeditorial foi umha evoluçom mui natural do fanzine. O formato ‘publicaçom’ quedava curto para muitas obras que, pensávamos, mereciam sair ao exterior. Organizamo-nos de forma assemblear, assim que todo é aprovado por todas. Agora mesmo, o nosso objetivo é publicar três microediçons anuais”. E é que, a diferença de Leite Edicións, por exemplo, Barullo estabelece-se como umha pequena cooperativa cultural. As participantes nos fanzines achegam umha quantidade de dinheiro, o qual também lhes permite passar a fazer parte da iniciativa e, portanto, a ter voz. Com estas pequenas somas de quartos vam gerindo os seguintes projetos, para além dum pequeno “colchom” que permite dar continuidade à iniciativa.
Cultura fora da elite
As três propostas som distintas em forma, estrutura e praxe, mas, para além da sua escolha firme polo alternativo, a aposta pola mocidade (essa geraçom que alguns dérom em chamar perdida) e o uso das redes sociais para o diálogo, todas partilham um discurso de rebeldia face o estabelecido e umha vontade de dar origem a umha comunidade de criaçom. Neste sentido, nom é por acaso que estxs artistas optem pola autoediçom pois “é um modo de criar cultura pouco elitista, ao acesso de quase qualquer pessoa. Oferecem muitíssima liberdade ao criador/a quanto ao tratamento de temas potencialmente censuráveis ou conflituosos em muitos sentidos, dam lugar à criaçom dumha cultura de base e mesmo a um certo sentimento de comunidade” comenta Queixumes a respeito da criaçom mas também do consumo de autoediçom. “Em geral, para mim, desafiam nalgum sentido o conceito de ‘mercadoria cultural’”.
Nom é por acaso que estxs artistas optem pola autoediçom pois “é um modo de criar cultura pouco elitista, ao acesso de quase qualquer pessoa. Oferecem muitíssima liberdade ao criador/a quanto ao tratamento de temas potencialmente censuráveis ou conflituosos em muitos sentidos, dam lugar à criaçom dumha cultura de base e mesmo a um certo sentimento de comunidade” comenta Queixumes
Seguindo com esta visom de oposiçom ao mainstream, complementa Pablo Rodríguez, de Leite Edicións: “vivemos tempos precários porque nom vivemos em tempos transparentes, nom vivemos em tempos democráticos, nada é claro. Os fanzines ou a autoediçom funcionam com a honestidade que consideramos lógica e ética para com nós e com as demais”. Um discurso também partilhado polxs criadorxs de Barullo: “queríamos ser um meio independente sem fins lucrativos, sem ter que render-lhe contas a ninguém sobre o conteúdo que publicamos ou como o publicamos. Por outro lado, entendemos a microediçom como umha ‘ponte’ que poda servir entre aquelas escritoras que nunca tivérom o seu trabalho publicado em nengum sítio e as editoriais mais tradicionais. A microediçom serve como arma, como recurso que mostrar, como prova de que as criadoras novas da contorna merecemos um espaço”.
Muitos mais projetos de autoediçom estám a marcar músculo nestes momentos de incerteza e precariedade política e social, e tanto Queixumes como Leite e Barullo nom param de medrar. Polo de agora, xs valdeorresxs estarám nas II Xornadas Valdeorresas de Barcelona presentando o projeto, e continuam a fornecer espaços de criaçom e difusom em forma de exposiçons, obradoiros ou palestras, além da autoediçom. No caso de Leite, há dous novos títulos a piques de publicar-se e umha moreia de ideias para o futuro, a longo e também a curto prazo, como é o caso do segundo recital Leite para os Reis, no Natal, desta vez com um novo formato. Queixumes, pola sua banda, acaba de publicar em papel o póster “Catecismo da Bissexual” e está preparando camisolas, ademais de continuar a oferecer conteúdo nas suas redes.
Mal que lhes pese a alguns, a geraçom que comparte a sua depressom em forma de meme chegou para ficar e também para encarar quem pense que já está todo feito.
Nom é casualidade que todos estes projetos estejam comandados por gente nova, que experimenta nas suas próprias carnes essa precariedade e incerteza, mas que se serve de ferramentas da sua própria colheita para denunciar a situaçom. Mal que lhes pese a alguns, a geraçom que comparte a sua depressom em forma de meme chegou para ficar e também para encarar quem pense que já está todo feito. Com ediçons em papel e iniciativas digitais, visibilizando o nom-normativo ou o esquecido e criticando o sistema editorial tradicional nom só a nível teórico, mas também através da praxe, estes projetos estám a colher força, enquanto nos interpelam a todxs nós. Sobretodo, estám a permitir que se encete um diálogo interessante entre criadoras sobre o como e o por quê da arte, impossível nos circuitos mais estabelecidos e acomodados.
Ainda nom sabemos se será a arte a que tombará o sistema, mas, de o fazer, com certeza passa por aqui.