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CETA: O jogo ainda nom rematou

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A entrada em vigor definitiva do acordo de livre comércio dependerá do voto favorável dos parlamentos dos seus estados-membro.

O Parlamento Europeu deu luz verde à pri­meira fase de apli­ca­çom pro­vi­só­ria do CETA. Porém, a en­trada em vi­gor de­fi­ni­tiva do acordo de li­vre co­mér­cio as­si­nado pola UE e o Canadá ainda de­pende do voto fa­vo­rá­vel dos par­la­men­tos dos Estados-mem­bro e dal­gumha re­giom. A Valónia ainda po­de­ria in­vi­a­bi­li­zar o tratado.
A re­giom belga le­van­tou o seu veto ini­cial ao CETA após a in­clu­som dum anexo que ofe­rece ga­ran­tias so­bre al­gumhas das ma­té­rias mais con­tro­ver­ti­das do texto. Porém, o re­fe­rido acrés­cimo nom ques­ti­ona o fundo do tra­tado e tam­bém nom fica claro como será in­ter­pre­tada ao re­sul­tar con­tra­di­tó­ria com par­tes do texto principal.

Após dous anos com as ne­go­ci­a­çons já fe­cha­das e em sus­pen­som, em fi­nais do pas­sado mês de no­vem­bro os go­ver­nan­tes da Uniom Europeia e o Canadá con­se­guí­rom – nom sem es­forço –  as­si­nar o CETA (Comprehensive Economic and Trade Agreement), de­pois de a re­giom belga de Valônia re­ti­rar o seu veto – na Bélgica os par­la­men­tos re­gi­o­nais te­nhem o di­reito cons­ti­tu­ci­o­nal de ve­tar acor­dos in­ter­na­ci­o­nais an­tes de se­rem acei­tes por parte do Estado. Após o voto fa­vo­rá­vel do Parlamento Europeu, a maior parte do tra­tado co­me­çará a ser apli­cada de forma pro­vi­só­ria neste ano 2017.

À se­me­lhança do TTIP (o tra­tado en­tre a UE e os EUA), o CETA vai muito mais longe do que os acor­dos de co­mér­cio tra­di­ci­o­nais, des­ti­na­dos a le­van­tar as bar­rei­ras de im­por­ta­çons e ex­por­ta­çons e a mi­ni­mi­zar o pa­ga­mento de ta­xas adu­a­nei­ras. Nom por acaso, o ob­je­tivo de­cla­rado deste novo gé­nero de acor­dos é ul­tra­pas­sar as cha­ma­das “bar­rei­ras nom adu­a­nei­ras”, quer di­zer, aque­las re­gu­la­me­na­çons que, nom es­tando cir­cuns­cri­tas ex­clu­si­va­mente ao ám­bito co­mer­cial ou de in­ves­ti­mento in­ter­na­ci­o­nal, pode sig­ni­fi­car um en­trave para es­tes em de­ter­mi­na­das cir­cuns­tán­cias. Por exem­plo, os atu­ais pa­drons de se­gu­rança ali­men­tar da UE proí­bem tra­tar qui­mi­ca­mente com cloro o frango para con­sumo hu­mano, o que é con­si­de­rado como umha bar­reira nom adu­a­neira para os ex­por­ta­do­res de frango dos EUA, onde a in­dús­tria da carne sim tem per­mi­tido le­var a cabo este tipo de práticas.

A Bélgica realizará avaliaçons sobre as conseqüências da aplicaçom provisória do tratado, podendo nom ratificá-lo de maneira definitiva

O ca­pí­tulo do CETA que nom será apli­cado du­rante este pe­ríodo de en­trada em vi­gor pro­vi­só­ria, em parte gra­ças às re­ser­vas da Valónia, é pre­ci­sa­mente um dos mais po­lé­mi­cos do tra­tado: o re­la­tivo à pro­te­çom do in­ves­ti­mento es­tran­geiro. Tal como o TTIP, o CETA con­tem­pla a cri­a­çom dum me­ca­nismo de re­so­lu­çom de con­tro­vér­sias en­tre in­ves­ti­dor e Estado (ICS, po­las suas si­glas em in­glês), que te­ria a mis­som de in­ter­pre­tar os ter­mos do tra­tado caso sur­gis­sem dis­cre­pán­cias en­tre umha em­presa e o Governo dum Estado. As mul­ti­na­ci­o­nais po­de­rám de­man­dar um Estado ante este tri­bu­nal de ar­bi­tra­gem su­pra­na­ci­o­nal se en­ten­de­rem que umha de­ter­mi­nada norma apro­vada por esse Estado pode da­nar os seus lu­cros pre­sen­tes ou fu­tu­ros da com­pa­nhia, aten­dendo à re­da­çom do CETA.

Para o CETA en­trar em vi­gor de ma­neira com­pleta e de­fi­ni­tiva, é ne­ces­sá­rio o voto fa­vo­rá­vel por parte dos par­la­men­tos dos Estados-mem­bro da UE e tam­bém por parte da­que­las cá­ma­ras le­gis­la­ti­vas de en­ti­da­des in­fra-es­ta­tais que te­nham re­co­nhe­cido este di­reito, caso das re­gi­ons bel­gas. Assim, para ser apro­vado, de­verá su­pe­rar cerca de 40 vo­ta­çons. O acordo deve ser uná­nime, polo que o voto con­trá­rio por parte de qual­quer Estado ou re­giom com di­reito a voto po­de­ria dei­xar em sus­pen­som a apli­ca­çom de­fi­ni­tiva do tratado.

faixa feia
Manife bru­tal con­tra o capital

Nom está claro que o CETA poda ul­tra­pas­sar este úl­timo re­qui­sito. Os so­cial-de­mo­cra­tas aus­tría­cos ma­ni­fes­ta­ram a sua re­jei­çom em ou­tono, e a pos­tura dos seus ho­mó­lo­gos ita­li­a­nos, in­gle­ses e fran­ce­ses ainda nom está clara (cum­pre es­tar pen­dente da vo­ta­çom no Parlamento Europeu e atu­a­li­zar este ponto). A prin­ci­pal ame­aça para o acordo a ní­vel ins­ti­tu­ci­o­nal, no mo­mento atual, con­ti­nua sendo o Partido Socialista da Bélgica, que de­tém a pre­si­dên­cia do go­verno va­lom. Apesar de que fi­nal­mente le­van­tá­rom o seu veto à as­si­na­tura ini­cial do tra­tado, du­rante as ne­go­ci­a­çons lo­grá­rom pac­tuar umha re­so­lu­çom com o con­junto de au­to­ri­da­des bel­gas que ca­pa­cita de facto o Parlamento da Valónia para bo­tar abaixo o CETA. Segundo a re­fe­rida re­so­lu­çom, as au­to­ri­da­des bel­gas le­va­rám a cabo ava­li­a­çons pe­rió­di­cas das con­sequên­cias de ca­rá­ter so­cial e am­bi­en­tal que po­de­ria ter o tra­tado du­rante a sua apli­ca­çom pro­vi­só­ria, re­ser­vando-se o di­reito de nom o ra­ti­fi­car de ma­neira de­fi­ni­tiva, o que sig­ni­fi­ca­ria a morte do CETA.

O anexo-chave
Ante os atran­cos – de maior ou me­nor in­ten­si­dade – com que foi to­pando o CETA tanto na es­fera dos mo­vi­men­tos so­ci­ais como dos par­ti­dos po­lí­ti­cos de es­quer­das e so­cial-de­mo­cra­tas, a co­mis­sá­ria eu­ro­peia de co­mér­cio, Cecilia Malmström, im­pul­sou umha es­tra­té­gia de la­va­gem de ima­gem que ti­nha na de­cla­ra­çom anexa ao CETA a sua ponta de lança. Num “ras­cu­nho fi­nal” do re­fe­rido anexo, da­tado em 5 de Outubro de 2016, po­dia ler-se como os au­to­res in­sis­tiam ao longo das cinco pá­gi­nas do do­cu­mento nas su­pos­tas opor­tu­ni­da­des eco­nó­mi­cas que abri­ria o tra­tado e nas ga­ran­tias ofe­re­ci­das polo mesmo. Nom con­ven­ceu. O Council of Canadians, a prin­ci­pal en­ti­dade de “açom so­cial” do Canadá – como eles pró­prios se de­no­mi­nam- , emi­tiu um co­mu­ni­cado cri­ti­cando o con­teúdo desta de­cla­ra­çom anexa.

Porém, a re­lu­tán­cia da Valónia a as­si­nar o CETA obri­gá­rom a subs­ti­tuir esta de­cla­ra­çom anexa por umha ou­tra de 12 pá­gi­nas que, ade­mais de in­sis­tir so­bre os mes­mos as­pe­tos su­pos­ta­mente po­si­ti­vos do acordo, tam­bém in­clui umha sé­rie de con­di­çons so­bre os as­pe­tos mais po­lé­mi­cos do mesmo. Aliás, esta de­cla­ra­çom anexa foi in­cluída como “ins­tru­mento”, nos ter­mos re­co­lhi­dos na Convençom de Viena so­bre o di­reito dos tra­ta­dos, o que im­plica que  o dito o anexo tem o mesmo va­lor ju­rí­dico que o texto prin­ci­pal do tra­tado quanto à sua interpretaçom.

Este acrés­cimo le­vou o PS belga a lan­çar um co­mu­ni­cado no mesmo dia da as­si­na­tura do tra­tado no que pas­sa­vam a de­no­miná-lo “novo CETA”, afir­mando que gra­ças à in­clu­som da de­cla­ra­çom anexa o acordo é agora subs­tan­ci­al­mente di­fe­rente à sua ver­som sem anexo, ape­sar de que o texto prin­ci­pal nom foi mo­di­fi­cado. Nesse co­mu­ni­cado, o par­tido go­ver­nante da Valónia vai dando conta dos “pro­gres­sos” ob­ti­dos na ne­go­ci­a­çom. Destacam, por exem­plo, que no anexo se es­ti­pula que os Estados po­de­rám le­gis­lar em ma­té­ria de saúde e edu­ca­çom pú­bli­cas, cul­tura, am­bi­ente ou pro­te­çom do con­su­mi­dor e re­vi­sar à alta os pa­drons; re­ser­vando-se tam­bém o di­reito de re­na­ci­o­na­li­zar umha in­dús­tria ou ser­viço: “po­de­mos de­fi­nir li­vre­mente as nos­sas po­lí­ti­cas sem medo de ter de pa­gar umha in­dem­ni­za­çom”. No re­la­tivo ao me­ca­nismo de ar­bi­tra­gem, in­ci­dem em que gra­ças ao anexo os juí­zes do tri­bu­nal se­rám “pú­bli­cos”, quer di­zer, sub­me­ti­dos a um có­digo de con­duta que evite con­fli­tos de in­te­res­ses e sendo elei­tos polo Conselho Europeu à pro­posta dos Estados-mem­bro (como os do Tribunal de Justiça da UE). O texto nom in­clui, po­rém, nada que mo­di­fi­que o facto de que só as em­pre­sas es­tran­gei­ras po­de­rám ace­der a este tri­bu­nal de jus­tiça paralelo.

Sem ques­ti­o­nar em nen­gum mo­mento a ló­gica pró-glo­ba­li­za­çom pro­mo­vida polo acordo, que po­de­ria ser re­su­mida na equa­çom ‘mais li­vre-co­mér­cio igual a mais bem-es­tar’; o anexo sim que é con­tra­di­tó­rio com al­guns dos as­pe­tos mais re­le­van­tes do tra­tado, como os re­fe­ri­dos à ca­pa­ci­dade le­gis­la­tiva dos Estados. Ao te­rem am­bas as par­tes do texto o mesmo va­lor ju­rí­dico, é di­fí­cil as­se­gu­rar em que sen­tido po­derá ser in­ter­pre­tado o CETA como con­junto quando co­me­çar a ter apli­ca­çom prá­tica. O facto de o anexo in­ci­dir pre­ci­sa­mente nos as­pe­tos que mais po­lé­mica te­nhem le­van­tado pode ser in­ter­pre­tado como umha con­sequên­cia ló­gica das ne­go­ci­a­çons –re­nun­cia-se àquilo que pro­voca mais de­sa­cordo — ou como umha es­tra­té­gia des­ti­nada a con­tra-ar­gu­men­tar as vo­zes crí­ti­cas com o tra­tado e tran­qui­li­zar a cidadania.

Em qual­quer caso, o CETA ainda deve re­ce­ber a va­li­da­çom dos par­la­men­tos eu­ro­peus para ser apro­vado de­fi­ni­ti­va­mente. A Bélgica e cada umha das suas re­gi­ons ainda po­dem pre­mer o bo­tom ver­me­lho, se a apli­ca­çom pro­vi­só­ria nom os con­ven­cer. Com os par­ti­dos so­ci­al­de­mo­cra­tas clás­si­cos dos prin­ci­pais Estados eu­ro­peus en­fren­tando cri­ses de cre­di­bi­li­dade – de maior ou me­nor al­cance — ante o seu elei­to­rado clás­sico, a di­ná­mica dos mo­vi­men­tos so­ci­ais e a sua ca­pa­ci­dade de pres­som pode ser de­ci­sivo para de­ci­dir o jogo con­tra o CETA nes­tes me­ses de prorrogaçom.

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