Nom se trata aqui de desvelar qual seria o arcano inexplicado da personalidade de Alberto Núñez Feijóo. O Rosebud do Citizen F. Cabe mesmo suspeitar que, de escarvarmos muito, F resultasse ser como o cavaleiro inexistente de Italo Calvino: umha armadura sem corpo.
Será logo umha achega ao Feijóo epidérmico, ao que se percebe à simples vista nos discursos e também nos silêncios mediáticos que sobre ele se espalham. Ao Núñez que se revela, como um negativo fotográfico, a partir da maior evidência que existe sobre qual pode ser a sua autêntica personalidade: o seu jeito de fazer política.
A meados dos 90, o jornalista Ánxel Vence retratava Manuel Fraga com a metáfora do Dr. Jekyll e Mr. Hyde. Para o jornalista, toda aproximaçom ao ex-presidente devia levar em conta que nele habitavam duas pessoas: o Doutor Fraga e Mister Iribarne. Algo de verdade havia na caraterizaçom. Também algo de recurso para viver comodamente no fraguismo: quem mandava daquela tinha, quando menos, umha cara boa que poder louvar.
Nom é tam fácil encontrar em F o desdobramento de personalidade de alguém que, como Fraga, era à vez um inteletual e um animal político. Um modernizador franquista e um camaleom na Transición. Um fascista e um democrata cristao. Um espanholista recalcitrante e o criador de certo jeito de ser autonomista galego. F é demasiado plano para tal façanha. Porém, sim é possível intuir certa bipolaridade epidérmica ao analisá-lo diacronicamente, desde o alto burocrata no serviço de Correios ao flamante líder da oposiçom espanhola do presente.
F é um filho da contra-revoluçom neocon auspiciada polo aznarato e os seus meios madrilenos. Mália o papel da rádio dos bispos no rearme da direita espanhola durante os últimos 90 e primeiros 2000, de F pode dizer-se que encarna a secularizaçom da democracia cristá. A única religiom de F é o ultracapitalismo. A mesma unidimensionalidade que hoje leva ao paroxismo a cultural warrior Isabel Ayuso. Som estes um tipo de “gestores” sem veleidades intelectuais ou espirituais. Hipermaterialistas que nadam coma peixes na água na era da razom cínica acunhada por Solterdijk. Killers dispostos a todo para esganar o adversário. Destrutores do público e inimigos de qualquer excecionalidade cultural ou nacional.
Di-se com retranca que todo sucede antes na Galiza. Esse F inicial chegou à Xunta a cavalo do primeiro trumpismo antes de Trump que vimos no Estado.
Di-se com retranca que todo sucede antes na Galiza. Esse F inicial chegou à Xunta a cavalo do primeiro trumpismo antes de Trump que vimos no Estado. Apadrinhado polo birrete Romay Becaria, ganhara já a guerra às boinas de Xosé Cuíña no próprio PPdG e a sua vitoria eleitoral de 2009 foi forjada através dumha guerra cultural lóstrego baseada em campanhas mediáticas sobre casos de corrupçom falsos e umha concepçom individualista da liberdade como nom interferência. Discursos que consideram “politizar” todo o que seja intervir desde as instituiçons com um critério de bem comum. Acçons desenhadas para rebentar a coesom social, a começar pola comunidade educativa. Estas investidas envenenadas som hoje moeda comum no repertório da extrema direita espanhola.
Como um populista antes do momento populista, F cavalgou o movimentismo de moda na esquerda da época associando-se ao lobby ultradireitista Galicia Bilingüe. A esquerda social batera no bipartido através de Galiza non se vende —nom sem razons em tempo real, nom sem equivocaçons no pouso que deixa a passagem do tempo—. Entretanto, a direita inflaria nos grandes meios o seu próprio movimento social; sendo cúmplices esses mesmos meios dumha campanha torpe e mentireira como nom se vira antes. Um estilo político que, para a nossa desgraça, hoje fai parte da paisagem.
F desmantelou as tímidas mudanças que o bipartido conseguira aplicar no seu mandato. Trás esta desmontagem, o bipartido figurará no discurso feijonita como um significante baleiro que sintetiza a origem de todos os males. Os anos passarám, mas o bipartido permanecerá como lugar comum nas legislaturas de 2012, 2016 e 2020.
A realidade galega daquele tempo parecia nom precisar já os serviços de Realidade Galega, o grupo de militantes do PPdG próximos ao círculo de Ramón Piñeiro. A voadura do consenso linguístico arredor da Lei de Normalización de 1981 assim o provava
A sociedade galega da primeira legislatura de F parecia encontrar-se já no grau de neocolonizaçom ótimo para que o novo estilo se desfigesse da cobertura galeguista que Fraga ainda precisava. Por dizê-lo de jeito cáustico: a realidade galega daquele tempo parecia nom precisar já os serviços de Realidade Galega, o grupo de militantes do PPdG próximos ao círculo de Ramón Piñeiro. A voadura do consenso linguístico arredor da Lei de Normalización de 1981 assim o provava. As ideias de Vox já corriam ceives por San Caetano antes de Vox. É engraçado que Feijóo chegasse a representar algo assim como um estilo diferente ao da extrema direita. Que seja o novo Ruíz-Gallardón: o conservador favorito dos estúdios e as páginas dos meios de PRISA.
F desprendia-se de qualquer veta idiossincrática e, já estabelecido como Presidente, fomentaria umha imagem de asséptico e intercambiável “homem de negro”. O vivo exemplo da homologaçom capitalista pasoliniana. Um tipo de político que, mais que cheio ou falto de carisma, era a‑carismático. Um homem sem atributos capaz de vender a própria mai. O termo “homens de negro” figera fortuna no contexto da crise financeira e da sua derivaçom europeia em forma de crise do euro. Os homens de negro eram os supervisores comunitários que deviam verificar que os PIIGS acometessem as “reformas” ordoliberais necessárias para sortear o descalabro do capitalismo sem prejudicar o sistema bancário e as elites. O F desse tempo ‑quando ZP “falhou” introduzindo a nefasta reforma do artigo 135 na Constitución- era um aluno avantajado das políticas de austeridade. O killer que já levava jeito na aterragem em San Caetano executava agora, no marco autonómico, o programa de adelgaçamento de todo sentido do público e de redistribuiçom económica. Entretanto, com a nova política, Beiras volvia bater com o sapato no parlamento, o BNG tratava de se recompor percorrendo umha travessia no deserto e o PSdG estava, igual que está sempre, como ausente.
As grandes manifestaçons em Vigo em defensa do sistema público de saúde e a filtraçom da fotografia com o narcotraficante Marcial Dorado figérom que abalasse a imagem de gestor incorruptível que os meios bem regados de subvençons foram criando para ele. Mas o calamitoso estado da oposiçom galega, com umha En Marea em pleno esperpento e implosom, um PSOE dirigido por umha gestora e um BNG que só começava a estabilizar-se com o liderado de Ana Pontón propiciárom que Feijóo sacasse umha nova maioria absoluta. Isto teria repercussom no PSOE de Pedro Sánchez, quem assistiria a um intento de golpe interno comandado por Felipe González e Susana Díaz que provocaria a demissom de aquele e a formaçom dumha gestora que se absteria para que Rajoy governasse em minoria. Corria o ano 2016.
O establishment espanhol nadava sobre as areias movediças do instável capitalismo internacional e, alertado polo movimento independetista catalám, trabalhava desde o Estado profundo, após o fracasso da operaçom Ciudadanos, na preparaçom dum plano B ao quatripartido imperfeito: a extrema direita de Vox auspiciada por Felipe VI.
O governo PSOE-Podemos e o fulgurante ascenso dos voxistas engraxado desde os grandes meios acabariam mostrando as carências de um Pablo Casado incapaz tanto de frear aos de verde como de fazer oposiçom à coaliçom que controlava o BOE. Neste momento começava já a mostrar a pata o “Feijóo moderado”, o homem de Estado cabal sempre disposto a propor um entendimento de elites que precisava um regime esgotado.
As siglas do PP estavam desprestigiadas devido à barra libre de rapanhota, polo que nas eleiçons galegas de 2020 o apelido de F era a única marca eleitoral. Aliás, o clima político do Estado estava tam contaminado de supremacismo espanhol que F, o inimigo do galego e pioneiro na recentralizaçom do Estado, pujo o fato de Manuel Fraga com estampado de Sargadelos e arvorou um “Galicia, Galicia, Galicia” que parecia indicar que ainda quedava mais identidade galega da que pensávamos em 2009.
O pessoal da CRTVG perseverava nos seus “venres negros”, farto da manipulaçom desenhada com mao de ferro por Mar Sánchez. No debate televisado na TVG, F faria gala da pobreza retórica de quem está acostumado às imagens editadas, enquanto Ana Pontón o arrinconava no recanto do ring. Mas os meios levavam toda a campanha algodoando o candidato do PP e o do PSdG, com um visonho Gonzalo Caballero à frente, nom punha toda a carne no assador: um estranho problema com o aviom oficial evitou que Pedro Sánchez pechasse a campanha em Vigo. Galiza como moeda de cambio mais umha vez?
F volvia ganhar a absoluta conseguindo manter unido um abano eleitoral que vai de certo votante socialista aos nichos voxistas da Galiza urbana. Aí começa a despejar-se o seu caminho a Madrid. A receita do único presidente do PP com maioria absoluta e capaz de manter Vox fora do mapa. F gostava de si próprio no papel de moderado que lhe caíra do céu e a prensa progre e a própria esquerda espanhola sustentavam a falácia com entusiasmo. Os primeiros, porque deveziam polo regresso do bipartidismo, algo difícil de alcançar com o levantamento das hordas ayusistas em Madrid que desembocaria na demissom de Casado. Os segundos, porque a sensaçom de sítio e devalo fazia-os agarrar-se a qualquer cravo ardendo com tal de poder devolver algumha pelota a uns meios que, mália apoiá-los em 2015, dedicavam agora horas e horas de tertulianada a os desprestigiar.
Agora é quando F, após treze anos como presidente da Xunta, dá o salto à Corte levando com ele os seus pit-bulls: Mar Sánchez e Miguel Tellado. Guardando da finca deixa, sem passar polas urnas, o insípido Rueda e, trás regar os meios madrilenos com quartos galegos para preparar a aterragem, o bom resultado eleitoral de Juanma Moreno nas autonómicas andaluzas —graças ao emprego dumha sorte de “Andalucía, Andalucía, Andalucía” como estratégia— o neno dos Peares coloca-se em boa posiçom, com a ajuda da alta inflaçom e a incapacidade e/ou nula vontade do governo de coaliçom para fazer políticas de esquerdas, para enfrentar as próximas eleiçons gerais. Que fato empregará daquela este F escapista e afeito a suster umha cousa e a contrária? Todo é possível com F.