Imagino que as leitoras concordam comigo em que os seres humanos nom devem vender-se nem mercar-se, que aborrecemos a exploraçom do capital e o submetimento dos seres humanos aos mandatos do mercado, que quem defendemos um mundo radicalmente distinto baseado na justiça social e em construir vidas sustentáveis acreditamos em que as conquistas coletivas som direitos e as conquistas individuais apenas privilégios. Imagino também que as leitoras, coma mim, defenderám os direitos das mulheres a fazermos dos nossos corpos e das nossas vidas o que queiramos, sempre que isso nom coloque outro ser humano numha posiçom de indefensom perante este sistema criminal em que existem tantos suis geográficos, políticos, sociais e económicos.
Se nom concordamos nestes princípios será fácil nom entender-nos no marco deste debate mas se concordamos será ainda mais fácil armar-nos de argumentos para combater a quem nem renega da exploraçom, nem defende as conquistas coletivas sobre os privilégios individuais, nem combate este sistema assassino em que a vida e os corpos viram também mercancia.
Contra a mercantilizaçom da vida
Ucrânia 30.000€, Califórnia 120.000€… Esses som os preços que o capitalismo lhe pom a encarregar umha criança. Essas quantidades económicas incluem a total disposiçom sobre a vida de umha mulher durante 10 meses e um contrato que regula o destino dessa futura criança. Assim o capitalismo consegue pôr prezo à vida por encargo e aos processos físicos e mentais que se produzem na sua criaçom, e digo á vida por encargo porque todas sabemos que há milheiros de vidas neste planeta que nom valem absolutamente nada, milheiros de crianças que nascem e morrem sem que o mundo se ocupe ou interesse pola sua saúde, educaçom, desenvolvimento e bem-estar. Assim é o sistema capitalista, a vida importa só quando se pode negociar com ela, quando se poder pôr um preço e alguém esta disposto a pagá-lo, sem importa-lhe quem sofre ou quais as consequências dessa mercantilizaçom.
India, Nigéria, Ucrânia… Países nos quais a vida nom mercantilizada apenas vale nada som hoje ninhos ou “granjas de incubadoras” com mulheres submetidas ao mandato económico e à necessidade vital de procurar recursos de onde for, mesmo da exploraçom dos seus próprios corpos para benefício de quem, na parte privilegiada do mundo, pode pagar o preço que o mercado lhe pom às barrigas de aluguer. Esta realidade, que pretende obscurecer-se falando de altruísmo ou de legislar para que sejam no caso do Estado Espanhol, mulheres que estejam no próprio território as que aluguem a sua barriga, avança com cada estado que legisla para normalizar esta prática. Porque como o feminismo bem sabe, o que numha parte do mundo consegue garantias legais na imensa maioria vira tráfico, exploraçom e abuso.
Os direitos som sempre conquistas coletivas
E cando nom o som estamos possivelmente perante privilégios de classe, de raça, económicos ou sociais que beneficiam uns poucos mas que submetem outras muitas.
As pretendidas garantias legais que na Europa pretendem dar aos processos de barrigas de aluguer já conhecemos como funcionam no capitalismo. Ou nom temos exemplos abondo de como a mercantilizaçom das vidas e dos corpos passa por cima da legislaçom convertendo em abuso todas as zonas escuras do ordenamento jurídico?
Mas há algo ainda pior: legislar a mercantilizaçom do corpo, mesmo com a etiqueta de altruísta, contribui a normalizar a ideia de que a vida pode mercar-se e vender-se e que os corpos das mulheres podem estar ao serviço dos desejos de quem tem umha posiçom socialmente privilegiada e de poder. Legislar a favor significa seguir alimentando a “normalidade” de colocar corpos de outros seres humanos a disposiçom dos nossos desejos e significa que quando se atopem problemas ou travas para levar a termo esses desejos por exemplo no Estado Espanhol haverá sempre outras partes do mundo onde as garantias legais e sociais nom existam, onde poder atopar corpos e vidas à nossa disposiçom. Para quem tem o poder económico sempre há umha forma de abusar da necessidade, se nom é aqui, será em qualquer outra parte do planeta.
O direito à vida é o direito a um entorno de cuidados
Obviemos a OMS e qualquer organismo internacional de duvidosa fiabilidade ética (se nom é numha cousa será na outra mas todas som ferramentas do sistema) para afirmar com rotundidade que o direito à vida é o direito a vivermos num entorno de cuidados e afetos onde sentir-nos seguras e poder desenvolver-nos. Esse entorno nom precisa construir-se mediante vínculos de sangue ou genéticos senom com afetos. Eis o motivo polo que a adoçom devera ser umha ferramenta para garantir às crianças esse direito mediante os mecanismos necessários para que nom exista nengumha traba social, económica ou jurídica para quem quiger poda construir esse entorno familiar que também deve fugir do modelo clássico e repressor da família nuclear.
De sermos capazes de entender a maternidade/paternidade como a construçom desse entorno de cuidados, afeto e respeito lograríamos afastar-nos do desejo de perpetuar-se geneticamente ou de vincular a família aos laços genéticos, porque do que se trata é de cuidar e de ser cuidadas, de partilhar, e para isso as pessoas, as crianças, nom tenhem que ter connosco mais do que o vínculo do afeto.
As pobres nom escolhem livremente quando som os ricos quem lhe ponhem preço às suas vidas.