A finais de 2018, apresentou-se a produtora audiovisual Corentena Producións. Um projeto cujas bases partem do feminismo e da defesa da língua própria, com um espírito punk e com umha equipa conformada exclusivamente por mulheres. Durante esse mesmo ano produzírom as curtas A dor, primeira parte de A triloxía da raiva, e As mulleres salvaxes. Mas foi no ano 2016 quando se juntárom por vez primeira para criar juntas, experimento que deu como resultado Azul eléctrico, ganhadora no Barcelona Planet Film Festival. O germolo de Corentena foi a militância e a amizade partilhadas polas suas três criadoras, a viguesa Eire García, a mogiá Miriam Carril e a compostelana Marinha López.
As integrantes de Corentena falam sentadas na esplanada dum bar ao pé do parque de Belvís, em Compostela. Com a conversa voltam ao começo, quando militavam juntas num coletivo feminista. Eire estudara Comunicaçom Audiovisual, Miriam História da Arte e Marinha Arte Dramática. Antes do nascimento da produtora houve uns anos de transiçom, conta Miriam. Decatárom-se de que a partir dos seus conhecimentos individuais podiam criar um projeto conjunto, e o audiovisual converteu-se em meio e canal. “Ao remate da carreira distanciei-me muito da interpretaçom”, di Marinha, “penso que a raiz disto encontrei um jeito de trabalhar com o que estava cómoda”. Miriam acrescenta que trás estudar nom via o audiovisual como umha saída profissional. “Comecei a fazê-lo a partir de estar com elas, eu também gostava do cinema, e vim que podia aportar o meu grau de areia”.
Incorrigíveis para nom perder a focagem
“Nós nom reflexionamos muito sobre ganhar a nossa vida contando histórias”, admite Eire, “eu penso que do feminismo nom se chega a viver nunca, como muito sobrevives, isto acontece com toda a cultura de oposiçom”. Quando criárom Corentena, contam as três, figerom-no para acolher os projetos em que já trabalharam, mas a opçom de progredir na sua professionalizaçom está aí. “Nom descartamos a possibilidade de viver disto”, continua Eire, nom temos porque descartá-lo! Mas nom queremos ceder perante umha ideologia, isso é o prioritário. Se algumha vez dá de comer perfeito, porque até o de agora só perdemos pasta!”. Por esse motivo, as Corentena rejeitam explorar a via de financiamento institucional, mas sim aclaram que recorrerám ao crowdfunding. “É algo que imos fazer, para consolidar um projeto mais sério”.
“O nosso objetivo nom é fazer dinheiro por ser feministas, afirma Marinha, “o nosso objetivo é fazer projetos audiovisuais que falem do que nos interessa, que se posicionem dumha forma no mundo”. “As histórias som feministas porque nós somos feministas”, assinala Eire. “Nada mais nascer Corentena, a primeira crítica veu desde o feminismo, o debate de fundo era “isto é sem fins lucrativos ou é outro jeito de adaptar o feminismo ao capitalismo?” E é um debate legítimo! Evidentemente nós também o pensamos, claro que nos preocupa esta questom e nos deve preocupar para nom perder a focagem. Há outras raparigas que também trabalham desde o feminismo e que participam desse debate”.
De facto, as próprias integrantes de Corentena pugeram em andamento umha campanha em redes sociais com motivo da sua apresentaçom. Nela, ajudadas por amigas e cúmplices, verbalizam as possíveis opinions que um projeto coma o seu podia suscitar. Desde as críticas por empregar o feminismo como ferramenta de marketing, até os ataques por contar apenas com mulheres nas equipas.
-Mas, entom, as mulheres terám que fazer o papel de homens?
Porém, a acolhida inicial das Corentena foi mui boa. “Ou polo menos, isso é o que nos chega a nós!”, rim. “Ainda nom vivemos a resistência”, assinala Eire, “mas vamo-la viver”. “Vam tentar assimilar estes discursos”, continua, “e aí cairám muitíssimos venenos, mas que o discurso nom se corrompa, que a ideologia nom ceda…esse é o pulso da batalha cultural, nom ser assimiladas”.
Outro ponto de atençom para as Corentena, logo da sua apresentaçom em sociedade, é lograr transmitir a sua mensagem. “Centrar-se nos conteúdos é a nossa bandeira”, resume Miriam, “ a pressom vem mais porque o que queiramos transmitir nom se veja refletido”. “Nom tanto a crítica de certos espaços”, liga Marinha, mas nom poder chegar ao público ao que queremos chegar nós, queremos fazer reflexionar as pessoas, certos sectores, e nom conseguir isso é o que causa pressom”. As três admitem que botam em falta o feedback do público, já que até agora as suas curtas só recibírom as opinions e leituras dos festivais em que as apresentárom. “Ainda nos queda por experimentar”, sorri Marinha, “vai ser umha aventura”.
Do ‘Azul elétrico’ à Corentena
A primeira curta que figérom as Corentena foi também um primeiro ponto de contacto. “Havia um guiom principal ao qual lhe demos mil voltas”, lembra Miriam. “Produzida e financiada desde a precariedade”, Azul eléctrico explora as contradiçons que surgem na vida das pessoas. A curta lança umha pergunta ao público: “que passa quando ti és ti e as decisons que tomas desafiam-te?”. A rodagem tivo lugar numha casa em construçom. Conta Miriam que nem tinham pensado daquela alugar um espaço. “Estivemos um mês trabalhando na cenografia, levamos móveis das nossas casas, pujemos plaquetas no chao”. “Figemos paredes com placas de gesso, choiamos muitíssimo!”, acrescenta Marinha.
Em aquele primeiro projeto, o processo criativo foi muito mais coletivo. “Nom nos acabou de convencer e volvemos os roles mais clássicos”, di Eire. “Na primeira curta — aponta Marinha — todas dirigíamos, todas fazíamos o script, o decorado”. Mas desde aquela à equipa somárom-se cada vez mais mulheres, o qual lhes permitiu distribuir tarefas e roles e permitir que cada umha se centrasse mais no trabalho próprio. “Para mim, é um luxo poder estar centrada nas minhas personagens”, confessa Marinha, “e nom estar atendendo à cenografia, à produçom…”.
E é que no seu caminho as raparigas de Corentena fôrom topando cada vez mais cúmplices. “Que outras moças se apontassem é genial”, assinala Eire, “som moças que precisavam dum espaço fora da industria audiovisual”. Miriam destaca que conseguírom formar equipas com mulheres em todos os postos de trabalho. “No início diziam que íamos boas, que encontraríamos um monte de atrizes, mas que já veríamos com as técnicas e isso é mentira, havê-las hai-nas”. “E tanto que as há!”, acrescenta Marinha. No seu último projeto juntas, o “projeto supersecreto” que apresentarám em 2019, contam com dezasseis mulheres na equipa. “Com vistas à incorporar duas mais”, apontam.
Indica Eire que as integrantes de Corentena sempre acreditárom “na auto-organizaçom das mulheres”. “Entendemos que a cultura é outro campo e fazemos o próprio. Estamos mais cómodas trabalhando assim, e as histórias que contamos som contadas desde as experiências das mulheres”.
Histórias desde as mulheres e polas mulheres
As curtas-metragens das Corentena estám a rodar na atualidade por distintos festivais, polo que ainda nom estám disponíveis para o público. Perguntando polos eixos centrais dos seus projetos, elas tratam de responder evitando o spoiler. Se Azul eléctrico era umha exploraçom da identidade e das suas contradiçons, Mulleres Salvaxes trata da relaçom das mulheres com a violência ou as alianças entre mulheres. “Nom falam da violência contra das mulheres — aclara Eire — mas da violência das mulheres”.
“Pensas no audiovisual galego e reparas em quanto queda ainda por contar”, reflexiona Miriam. Quando se apresentam as ideias das curtas à equipa, — explicam as três — as integrantes sentem-se reconhecidas”. “Nom todas as pessoas com que trabalhamos som iguais, nom todas venhem da militância, mas podem dizer ‘isto a mim também me aconteceu’”, conta Eire. “Criam-se debates quando se lem os textos”, di Miriam. “Nom sei se para mim foi tam terapêutico como necessário, — reflexiona Marinha — nom fai que me reconcilie com experiências chungas da minha vida, pois tenho espaços para isso, mas pode que para outras sim seja um processo terapêutico, por esses debates que surgem no processo. Pessoas que partilham as suas histórias e que nom o figeram noutros espaços”. Eire emprega a palavra “catarse” para referir-se aos processos de criaçom e gravaçom em Corentena. “Na ficçom pode acontecer todo aquilo que queiramos, podemos contar histórias raivosas”, sorri.
Amizade, trabalho e cuidados
O feminismo em Corentena nom vive só nas histórias que narram, mas também nas suas dinâmicas de trabalho. Os cuidados jogam um papel fundamental. “Estamos cómodas pola nossa forma de trabalhar, porque temos outra forma de relacionar-nos”, explica Marinha, “entendemos que finalizar o trabalho quanto antes nom é a prioridade”. “Se precisas dum tempo sabes que o vás ter, perguntamo-nos como estamos, sentir valorado o teu trabalho e valorar o das tuas companheiras”, resume. “E passá-lo bem!”, di Eire. “Podo confiar nas minhas companheiras”, continua Marinha, “nom me sinto julgada, elas criam um ambiente que favorece que o trabalho seja o melhor possível”.
Compatibilizar amizade e trabalho nom sempre é doado, mais as Corentena tenhem clara a fórmula. “Antes está a nossa amizade”, explica Marinha, “e polo de agora creio que incluso a nossa amizade está-se fortalecendo. Temos cuidado de nom passar o tempo juntas só fazendo cousas para Corentena. Mas, fora disso, acho que nos equilibramos mui bem”.