No primeiro encontro de Mulheres em transição (Junho de 2015), ouvi frases que levavam tempo a rondar no meu corpo e ali assentaram na minha cabeça (ou foi ao revés?) Uma delas saiu da companheira Begoña de Bernardo Miño, a falar de que somos habitantes dos nossos territórios, que a nós corresponde cuidar e usufruir… desde aquela sei que prefiro identificar-me como habitante antes do que como cidadã.
Se algo de bom pôde ter a tragédia dos incêndios, foi ativar uma consciência e um novo questionamento do nosso monte e o nosso rural. Apesar de tudo, houve uma resposta rápida organizada: além das mobilizações maciças, listas de voluntariado para recuperar os solos e replantar, concertos de apoio, o canal contrainformativo Tramalume, a recolhida de ajuda a animais feridos transbordada… Como no momento do Prestige, as habitantes desta nossa terra tomaram a iniciativa.
Em momentos assim sentimos mais a importância do trabalho diário de quem leva muitos anos neste campo: Ridimoas, Amigos da Terra, a mancomunidade de Vincios, Cousa de raíces… só por nomear alguns exemplos de gestão popular e sustentável.
Nesta ocasião vou-me centrar numa iniciativa pouco conhecida, a figura das entidades de Custódia do Território.
Há uns anos assisti a uma palestra que começava com uma foto de Stonehenge (a National Trust do Reino Unido tem 10.000 pessoas empregadas). Era a entidade Fragas do Mandeo, e nas suas palavras… “A custódia do território é uma fórmula de conservação do patrimônio natural e cultural empregada com sucesso em numerosos países. O seu objetivo é criar um fundo de conservação da natureza na comarca (As Marinhas corunhesas), que permita mercar fincas de interesse natural para a proteção dos habitats prioritários. Desta forma poderemos cuidar da paisagem e dos bosques, assegurando um futuro para as espécies de animais e plantas que conformam a biodiversidade destes ecossistemas.” Através da compra ou de cessões de longa duração em acordos com a vizinhança, montes são limpados e recuperados para o bosque autóctone.
"Através da compra ou de cessões de longa duração em acordos com a vizinhança, montes são limpados e recuperados para o bosque autóctone"
E desde 2015 temos formalizada a Rede galega de custódia do território.
Não é questão de negar outras maneiras de fazer, por exemplo lutar por mudar as leis; estou convencida de que cada estratégia tem o seu lugar. Como dixo uma companheira num debate análogo sobre bioconstrução, podes lutar “de dentro do muro ou de fora”; em vez de vê-lo como divisão… acho a empurrar dos dois lados, melhor derrubaremos o muro.
Quando os muros são muralhas de eucaliptos, a possibilidade de derrubar literalmente, e autogerir, responsável e coletivamente pedaços reais e concretos de monte… é tentadora demais.
Inspirada pelo exemplo de Fragas de Mandeo, neste ano que acaba nasceu Brexa, a entidade de custódia de Carral (também nas Marinhas), que já anda na limpeza de um monte cedido por uma vizinha. Oxalá esta mecha prenda, uma, duas, mil custódias…