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De que falamos quando falamos da seleçom espanhola?

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Equipa fe­mi­nina da se­le­çom es­pa­nhola de fu­te­bol que ga­nhou o mun­dial. | rtve

O anún­cio por parte do Concelho de Pontevedra da ins­ta­la­çom de um ecrã gi­gante na Praça da Ferraria para pro­je­tar a fi­nal do mun­dial de fu­te­bol fe­mi­nino cau­sou nos dias ime­di­a­ta­mente an­te­ri­o­res um in­tenso de­bate na es­fera pú­blica di­gi­tal ga­lega. Tratava-se ape­nas de umha ho­me­na­gem mu­ni­ci­pal a umha vi­zi­nha, a fu­te­bo­lista Teresa Abelleira? Era pos­sí­vel anu­lar ou re­de­se­nhar os ele­men­tos es­pa­nho­li­za­do­res da ce­le­bra­çom com ou­tros fe­mi­nis­tas e po­ten­ci­al­mente ga­le­guis­tas? Ou, polo con­trá­rio, era pre­vi­sí­vel que a iden­ti­dade na­ci­o­nal es­pa­nhola saísse re­for­çada? O de­bate pode pa­re­cer ape­nas umha das lu­tas cí­cli­cas —e um bo­cado ri­tu­ais— que se pro­du­zem nas re­des ga­le­gas —e tam­bém em qual­quer ou­tra do mundo. De facto, isso é jus­ta­mente o que é. Precisamente polo seu ca­rá­ter tí­pico, dá para pen­sar­mos al­gumhas trans­for­ma­çons e con­ti­nui­da­des que es­tám a ter lu­gar no es­paço das ideias po­lí­ti­cas ga­le­gas, tanto nas fra­çons mais mi­li­tan­tes da te­o­ria como nas mais teó­ri­cas de en­tre as militâncias. 

Resulta cha­ma­tivo, para co­me­çar, que as gran­des pos­tu­ras so­bre os re­la­ci­o­na­men­tos en­tre a Galiza e a Espanha con­ti­nuem re­la­ti­va­mente es­tá­veis desde o iní­cio da Transiçom. Na al­tura, dous gran­des mo­de­los com­pe­tiam por ad­vi­rem sen­tido co­mum. Por um lado, a ide­o­lo­gia da nor­ma­li­za­çom, que achava pos­sí­vel um pleno de­sen­vol­vi­mento na­ci­o­nal da Galiza se se com­bi­na­rem es­for­ços pú­bli­cos e pri­va­dos para fa­zer pre­sen­tes a cul­tura e lín­gua ga­le­gas em to­dos os pla­nos do so­cial. Por ou­tro lado, a ide­o­lo­gia da co­lo­ni­a­li­dade, que pen­sava es­sas re­la­çons como es­tru­tu­ral­mente as­si­mé­tri­cas e da­ni­nhas para a Galiza. Desde os gran­des de­ba­tes so­bre o pro­jeto na­ci­o­nal até a mi­cro­a­ná­lise dos even­tos des­por­ti­vos, cum­pre hoje umha vi­som neu­tra ou até fa­vo­rá­vel e umha cla­ra­mente ne­ga­tiva so­bre as pos­sí­veis si­ner­gias en­tre os dous pro­je­tos na­ci­o­nais. Embora a pri­meira seja mai­o­ri­tá­ria na po­pu­la­çom in­te­res­sada pola cul­tura ga­lega —es­pe­ci­al­mente na ins­ti­tu­ci­o­na­li­dade—, a se­gunda con­se­gue ser mui vi­sí­vel e atrair umha massa su­fi­ci­ente como para lhe ofe­re­cer umha certa opo­si­çom na web. 

Face a te­o­ria da ‘nor­ma­li­za­çom’, ha­bi­tu­al­mente re­la­ci­o­nada com o au­to­no­mismo, a da ‘he­ge­mo­nia’ cos­tuma con­tem­plar como ob­je­tivo a cons­tru­çom de umha iden­ti­dade na­ci­o­nal galega

Apesar de as gran­des ori­en­ta­çons ide­o­ló­gi­cas se man­te­rem re­la­ti­va­mente fi­xas, fô­rom mu­dando as suas pa­la­vras-chave e as suas fon­tes de ins­pi­ra­çom teó­rica. Durante a po­lé­mica, as pa­la­vras nor­ma­li­za­çom, co­lo­ni­a­li­dade e as suas de­ri­va­das quase nom com­pa­re­cé­rom nas to­ma­das de po­si­çom das pes­soas que pro­du­zem e ori­en­tam a opi­niom ga­lega em re­des —in­te­lec­tu­ais di­gi­tais, em soma. O mo­tivo é que, de­pois de dé­ca­das da crí­tica do bando ad­ver­sá­rio, es­tas co­me­çam a es­tar for­te­mente co­no­ta­das nos âm­bi­tos da pro­du­çom de novo pen­sa­mento po­lí­tico: am­bas co­me­çam a pa­re­cer hoje de­ma­si­ado in­gé­nuas, fá­ceis de dis­cu­tir e, por isso mesmo, pouco ca­pa­zes de con­ven­cer as pes­soas com po­si­çons me­nos cla­ras ou oscilantes. 

le­an­dro lamas

Na fra­çom in­te­lec­tual e po­li­ti­zada do pri­meiro es­paço, aquele mais in­cli­nado às di­nâ­mi­cas de co­la­bo­ra­çom pon­tual com o pro­jeto po­lí­tico-cul­tu­ral es­pa­nhol, nor­ma­li­za­çom pa­rece ter sido des­lo­cado por he­ge­mo­nia e, com ele, a aná­lise dis­cur­siva da tra­di­çom mar­xista e pós-mar­xista que liga António Gramsci com Ernesto Laclau. Face a te­o­ria da nor­ma­li­za­çom, ha­bi­tu­al­mente re­la­ci­o­nada com o au­to­no­mismo, a da he­ge­mo­nia cos­tuma con­tem­plar como ob­je­tivo a cons­tru­çom de umha iden­ti­dade na­ci­o­nal ga­lega. Esta deve exe­cu­tar-se atra­vés de to­dos os es­pa­ços, es­pe­ci­al­mente na­que­les onde a es­pa­nho­li­dade é mais forte, para as­sim apro­priar-se de­les e dotá-los de umha nova di­re­çom. A cons­tante ne­ga­tiva do so­be­ra­nismo a par­ti­ci­par de pro­ces­sos que, para bem ou para mal, som mai­o­ri­tá­rios e até mas­si­vos, só con­tri­bui­ria para a mar­gi­na­li­za­çom dessa ide­o­lo­gia e ainda pro­du­zi­ria umha ima­gem de in­to­le­rân­cia en­tre a po­pu­la­çom ga­lega, de re­gra fa­vo­rá­vel ao pro­jeto po­lí­tico espanhol. 

Por seu turno, na in­tel­li­gent­sia me­nos pro­clive ao en­ten­di­mento com o Estado es­pa­nhol, a lei­tura na­ci­o­na­lista feita por Francisco Rodríguez e Ramón López Suevos das te­o­rias mar­xi­a­nas da falsa cons­ci­ên­cia e da classe-em-si frente à classe-para-si está a dar si­nais de es­go­ta­mento. No seu lu­gar, pa­rece sur­gir umha com­pre­en­som mais di­nâ­mica e multi-ní­vel da pro­mo­çom da iden­ti­dade na­ci­o­nal do­mi­nante —a es­pa­nhola. A hi­pó­tese par­ti­lhada deste sub­grupo é que o na­ci­o­na­lismo do­mi­nado ca­rece do apa­re­lho es­ta­tal e da ade­som pri­vada do seu ri­val, que som as que lhe per­mi­ti­riam ser he­ge­mó­nico: ten­tar re­sig­ni­fi­car os seus pro­ces­sos de re­pro­du­çom para a causa ga­lega aca­ba­ria con­du­zindo a le­gi­timá-los ainda mais. Embora no de­bate fi­ges­sem apa­ri­çom re­cor­rente o na­ci­o­na­lismo ba­nal de Michael Billig e cer­tas ideias-chave dos es­tu­dos con­tem­po­râ­neos so­bre o na­ci­o­na­lismo, o certo é que a queda pro­gres­siva dos ve­lhos re­fe­ren­tes teó­ri­cos nom pa­rece le­var a ado­çom ex­plí­cita de no­vos pa­ra­dig­mas dis­cur­si­vos e au­to­rias. Pode que o pro­cesso de ino­va­çom ide­o­ló­gica neste grupo des­canse mais na acu­mu­la­çom de ex­pe­ri­ên­cias do que na in­cor­po­ra­çom de re­fe­ren­tes, se ca­lhar pola im­por­tân­cia da te­o­ria da co­lo­ni­a­li­dade como marco sim­bó­lico da me­mó­ria gru­pal. Esta é hoje men­ci­o­nada com me­nor frequên­cia, mas nom per­deu a le­gi­ti­mi­dade iden­ti­tá­ria. Daí que volte a ser rei­vin­di­cada quando re­cebe umha crí­tica direta. 

Um mo­vi­mento de cons­tru­çom na­ci­o­nal su­ce­dido deve con­tar com re­per­tó­rios es­tra­té­gi­cos va­ri­a­dos para se po­der adap­tar a re­a­li­da­des distintas 

Em suma, a po­lé­mica so­bre a atu­a­çom do so­be­ra­nismo a res­peito do mun­dial de fu­te­bol in­dica que a fenda exis­tente hoje en­tre mo­de­los de re­la­ci­o­na­mento com Espanha man­tem parte do per­fil que já exis­tia há quase cin­quenta anos. Entre as no­vi­da­des, a ten­ta­tiva de ar­ti­cu­lar a nor­ma­li­za­çom numha chave na­ci­o­na­li­tá­ria (he­ge­mo­nia) e o in­ci­pi­ente de­clí­nio das gran­des me­ta­nar­ra­ti­vas om­ni­ex­pli­ca­do­ras (co­lo­ni­a­li­dade) para dar lu­gar a aná­li­ses mais sen­sí­veis ao con­texto ime­di­ato. O certo é que nen­gumha das duas es­tra­té­gias pode im­por-se à ou­tra com fa­ci­li­dade, pois nom des­can­sam em pro­vas em­pí­ri­cas. Decidir se o par­tido da se­le­çom es­pa­nhola era be­né­volo ou da­ni­nho para a iden­ti­dade na­ci­o­nal ga­lega só po­dia ser feito polo mé­todo do ten­teio in­te­lec­tual: com­pa­rar o que es­tava a acon­te­cer com as ex­pe­ri­ên­cias vi­tais e teó­ri­cas de cada umha e ex­trair o que re­sul­tava mais plau­sí­vel. Daí o ca­rá­ter enér­gico e nom sem­pre cons­tru­tivo do de­bate: pe­rante a im­pos­si­bi­li­dade de de­mons­trar de­fi­ni­ti­va­mente o erro do bando ri­val, a luta con­siste na per­su­a­som da maior parte pos­sí­vel do auditório. 

A re­a­li­dade prá­tica, po­rém, pro­va­vel­mente seja mais ma­ti­zada. Um mo­vi­mento de cons­tru­çom na­ci­o­nal su­ce­dido —como as­pira a ser o ga­lego— deve con­tar com re­per­tó­rios es­tra­té­gi­cos va­ri­a­dos para se po­der adap­tar a re­a­li­da­des dis­tin­tas. Pau e ce­noura, pois: há lu­ga­res e mo­men­tos onde é pre­ciso acei­tar pos­tu­ras in­có­mo­das para che­gar à po­pu­la­çom mai­o­ri­tá­ria e ou­tros em que há que mar­car li­mi­tes cla­ros e apos­tar polo con­fronto. Por des­graça, de­ci­dir quais som es­ses lu­ga­res e mo­men­tos de­pende ape­nas do nosso ten­teio, ori­en­tado amiúde por de­ba­tes pú­bli­cos como este. E um rá­pido po­si­ci­o­na­mento pes­soal para ter­mi­nar: vis­tos os do­cu­men­tos au­di­o­vi­su­ais pos­te­ri­o­res ao evento, em que avul­ta­vam co­res ro­ji­gual­das e cân­ti­cos na­ci­o­na­lis­tas im­pos­sí­veis há vinte anos –viva España!– , a fra­queza de­mo­grá­fica do se­tor con­trá­rio à pro­je­çom do par­tido re­sulta pre­o­cu­pante. Esta vez to­cava pau. 

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