Nom há dúvida de que a alimentaçom e o seu aprovisionamento constituem elementos centrais na configuraçom das sociedades humanas. Para satisfazer essa necessidade fundamental de subsistência, aparecêrom ao longo da história e da geografia planetária multitude de sistemas agroalimentares locais que fôrom adaptando-se às particularidades dos ecossistemas em que se desenvolviam as atividades produtivas e à própria organizaçom territorial de cada povo, construindo assim também múltiplos modelos de dieta culturalmente adaptados ao meio.
Porém, mediante as chamadas revoluçons verdes acontecidas desde a segunda metade do século XX, foi-se consolidando um sistema agroalimentar hegemónico globalizado. Este sistema está baseado na industralizaçom da produçom agrária, a liberalizaçom e internacionalizaçom dos mercados da alimentaçom e a concentraçom de poder em cada vez uma menor quantidade de corporaçons transnacionais, numha clara situaçom de oligopólio e com a evidente determinaçom de converter um direito social básico num lucrativo negócio.
O atual modelo alimentar está a contribuir significativamente a umha perentória crise sócio-ecológica que tem visos de nos levar a um colapso civilizatório global sem precedentes
Isto propiciou umha progressiva homogeneizaçom da construçom social da dieta a escala planetária mediante o transporte internacional de mercadorias e a grande distribuiçom organizada. Este processo, que foi alterando e absorvendo os sistemas agroalimentares locais, marcou claramente um ponto de inflexom e trouxo consigo a apariçom e agravamento de severos desequilíbrios socioeconómicos, políticos, culturais e ambientais. Destaca a considerável contribuçom do agro-negócio global ao fenómeno da mudança climática, tal como assinala o quinto informe do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, polo seu acrónimo em inglês) em relaçom exclusiva ao setor agrário. Este setor é culpável do 11–15% das emissons dos gases de efeito de estufa, mas que alcança ao redor da metade do total se consideramos as associadas ao sistema agroalimentar globalizado no seu conjunto, segundo denuncia a organizaçom internacional GRAIN. Assim, o atual modelo alimentar está a contribuir significativamente a umha perentória crise sócio-ecológica que tem visos de nos levar a um colapso civilizatório global sem precedentes.
Urge fazer frente a esta deriva auto-destrutiva desde uma prática pedagógica apropriada. Assumir certas mudanças na construçom social da dieta pode trazer efeitos de grande relevância, mais ainda se acontecem junto com uma aposta decidida pola configuraçom coletiva de sistemas agroalimentares relocalizados, com a açom corresponsável de todos os elos da cadeia. Porém, cumpre identificar quais som os marcos e referentes mais ajeitados para promover a necessária transformaçom social.
Quanto ao marco pedagógico, a Educaçom Ambiental é o campo com uma maior tradiçom e experiência na abordagem educativa da crise ecológica. Porém, dentro deste existe umha pluralidade de focagens epistemológicos e axiológicos, que por extensom tenhem reflexo na própria praxe. Sinteticamente, podemos distinguir duas grandes correntes: a ambientalista e a ecologista. A primeira restringe-se a prover respostas técnicas a problemas ambientais concretos, sem questionarem o marco socioeconómico, atribuindo toda responsabilidade aos comportamentos individuais, e toda possibilidade de mudança ao progresso tecnológico e à correcta gestom governamental. O paradigma do Desenvolvimento Sustentável responde a esta lógica, pois simplesmente propom medidas corretoras dentro dos limites da lógica de mercado. Por contra, a segunda é umha prática social crítica que denuncia o carácter estrutural e ecossistémico da crise, desvela as contradiçons sócio-ambientais da racionalidade economicista e do modelo de desenvolvimento hegemónico, e aposta por promover transformaçons sociais que nos conduzam à emergência e consolidaçom de umha Cultura da Sustentabilidade que abranja todas as dimensons da configuraçom das sociedades humanas.
A agroecologia, como proposta multidimensional e orientada à mudança radical dos sistemas agroalimentares em termos de sustentabilidade e justiça social, será o referente idóneo para desenvolver umha educaçom para umha alimentaçom sustentável
Polo que fai aos referentes no plano da alimentaçom, a busca de dotar-nos de sistemas agroalimentares sustentáveis deu lugar a apariçom de distintas fórmulas alternativas de produçom, distribuçom e consumo. Dentro destas, aquelas que proponhem invasons sociais baseadas em princípios de autonomia, autogestom e cooperaçom e que podam supor, portanto, o germolo de umha inadiável transiçom social agro-ecológica, serám as mais coerentes com o horizonte da Cultura da Sustentabilidade e prática da Educaçom Ambiental ecologista. Assim entom, se bem que o modelo institucionalizado da agricultura ecológica certificada, além de incorporar algumas correçons técnicas nos manejos agrícolas, nom oferece mais que a reproduçom da própria lógica de mercado, a Agroecologia, como proposta multidimensional e orientada à mudança radical dos sistemas agroalimentares em termos de sustentabilidade e justiça social será sem dúvida o referente idóneo para desenvolver umha educaçom para umha alimentaçom sustentável.
Afortunadamente na Galiza contamos com abundantes experiências para poder tomar como referência no desenho de programas educativos nesta linha. De facto, está-se a viver atualmente umha explosom de iniciativas próximas às propostas da Agroecologia, tanto polas suas práticas como polos seus modos de articulaçom em torno a espaços e redes de cooperaçom e apoio mútuo. Assim, pequenos projetos de produçom estám a se organizar em torno a feiras e mercados auto-geridos em cada vez mais cidades e vilas do país, as quais estám a tempo de se coordenar através de umha rede nacional de mercados sustentáveis, que se venhem configurando desde há mais dum ano através de assembleia e de forma horizontal. Mas isto nom é todo, pois esta rede está a sua vez entretecida com outras ferramentas e espaços de construçom coletiva em torno ao consumo e à autogestom doutras áreas imprescindíveis das nossas vidas como som a cultura, os cuidados, a saúde, a educaçom comunitária, os feminismos, a economia ou a comunicaçom, entre outras.
Mas se existe na Galiza um espaço de referencia para o convívio, a troca de experiências e saberes e a geraçom destas redes de cooperaçom, estes som os encontros O Rural Quere Xente, que se fôrom consolidando como um fórum bianual de posta em comum, reconhecimento mútuo e catalizaçom de inquietaçons e vontades compartilhadas, e que a inícios deste mês de julho celebrou a sua oitava ediçom em Carrizáns, no Concelho de A Lama.