O governo reconhece que “a sobrexploraçom da pecuária na comarca” com “excesso de xurros e esterco” causa umha “poluiçom difusa da água por nitratos e carbono”, mas a Junta nada tem feito para travar essas práticas
Os solos e as águas da Límia estám a ser poluídos. O estabelecimento desta verdade política demorou dez anos a ser aceite. Num documento de trabalho da Mesa da Límia, fórum em que participam mais de quarenta agentes ‑na sua maioria institucionais‑, a Administraçom (galega e estatal) assume que as águas da comarca sofrem umha poluiçom “difusa” em consequência do «excesso de xurros e estercos» produto da «sobreexploraçom pecuária». O documento é de há três meses atrás
Pode demorar mais dez anos que a verdade política estabelecida traga soluçons. Os debates na Mesa da Límia, através de um processo com um desenho em que a participaçom é dividida em mesas temáticas com um quadro de discussom definido pola Administraçom e estabelecido com base no objetivo de desenvolver um plano estratégico para o setor agropecuário da comarca, deixam de fora a questom central: o problema ambiental.
É umha armadilha. Mas as alcaidessas e alcaides dos doze municípios convidados poderám dizer que estám a fazer algo pola conservaçom do território sem incomodar o lobby agropecuário que é o principal motor económico da comarca. E as pessoas calam e engolem merda porque há que comer…
Os debates na Mesa da Límia deixam de fora a questom central: o problema ambiental
O plano estratégico nom é a soluçom porque no processo de elaboraçom (“participativo”, moderado pola consultoria Deloga) da mudança do modelo agropecuário, a única soluçom real para o problema ambiental, como há onze anos os cientistas venhem alertando (nem A Límia e nenhum outro território do planeta é capaz de suportar umha carga de gado do tamanho que sustenta A Limia sem causar poluiçom do solo e da água por nitratos e outros elementos derivados da produçom em grande escala de carne para consumo humano). Simplesmente na Límia nom resta espaço para tantos porcos (e outras espécies), desde que tenham que viver com humanos.
Premissas polémicas
Assim, o debate sobre o que gira a Mesa da Límia parte de duas premissas polo menos polémicas. A primeira: nom parece possível “um desenvolvimento agropecuário sustentável e economicamente rentável” que seja “ambientalmente compatível com o território”, como sustenta o documento apresentado nas mesas realizadas (telematicamente, por causa da pandemia) entre novembro e dezembro passado.
Nom parece possível “um desenvolvimento agropecuário sustentável e economicamente rentável” que seja “ambientalmente compatível com o território”, como sustenta o documento apresentado nas mesas realizadas
Até os gandeiros sabem disso. “Tenho umha granja de porcos há muitos anos, cada vez produzimos mais, mais carne e mais trabalho. Mas nom posso mais pescar. Gostava de ir ao Límia pescar, mas nom já tem peixes. O rio morreu… ”, comentava no final do verao de 2019 debaixo de um chapéu de cowboy um homem mais velho com a vista perdida a olhar para a planície. Naquele dia, nos dois bares da estrada entre Vilar de Santos e Sandiás o café era feito com água mineral. O alcaide Felipe Traveso mandou cortar o abastecimento por problemas de poluiçom num tanque. Naquela altura, Traveso, alcaide por umha lista independente, resolveu tomar a iniciativa e mediar entre os vizinhos e os gandeiros convocando umha reuniom para discutir o assunto.
Foi em finais do ano, no dia 30 de dezembro. A plataforma limiá Augas Limpas compareceu e trouxo Serafín González, da Sociedade Galega de Historia Natural, o home que passou umha década a advertir da poluiçom. Dani Rodicio, economista e integrante da plataforma, falou sobre como o compromisso com a pecuária intensiva tem condicionado a história da comarca nos últimos sessenta anos. O alcaide tentou defender a conciliaçom dos interesses dos gandeiros com a saúde da populaçom. Impossível. Manuel García, produtor orgânico de Rairiz de Veiga, outro veterano da luta do MEL (Movimento Ecológico Limia), falou a partir do público. Os gandeiros quase nom intervinhérom. O movimento vicinal saiu triunfante naquela noite. A notícia nom saiu em nenhum jornal no dia seguinte. A última cousa que os meios publicárom sobre a plataforma e os ambientalistas foi um tumulto na feira de Ginzo em agosto, quando umha centena de gandeiros cercou a mesa onde o Manuel e outros ativistas estavam a distribuir panfletos denunciando o problema.
O documento da Mesa da Límia assume umha segunda premissa polémica. Aponta como um dos objetivos do plano “mitigar o conflito social existente devido à poluiçom ambiental da agropecuária intensiva”. Mais umha vez, o aspeto central do problema é deixado de lado e preservaçom do meio e interesses empresariais da associaçom de gandeiros (Adegal), instrumento da Coren na comarca, som tratados por igual. Precisamente a Coren incendiou os ánimos ao denunciar Manuel García. Apresentou umha açom na que ameaça com pedir umha indemnizaçom de um milhom de euros. O ato de conciliaçom, realizado num julgado de Ginzo em 2 de março de 2020 virou numha demonstraçom de «matonismo» por parte dos gandeiros, concentrados em silêncio, umha centena deles, às portas do tribunal numha manhá de saraiva. Manuel García, acompanhado por umha advogada do coletivo estatal contra a pecuária intensiva, resistiu às pressons de gabinete da Coren e da Adegal na rua. A advogada explica: “A Coren acaba de colocar o caso da Límia no foco de todas as associaçons ambientais internacionais e a batalha na Europa está a ser intensa”.
Em setembro, umha equipa de jornalistas do Greenpeace passou umha semana na Límia a conversar com o Manuel e a visitar locais que evidenciam a devastaçom ambiental. A campanha tivo o impacto mediático que as açons do Greenpeace costumam ter. Entom, Coren tivo que repensar a sua estratégia de alimentar um “conflito social” e enviou pessoas do seu staff acalmar o ánimo do Manuel.
No final de novembro, quase nove meses após a nom conciliaçom no julgado de Ginzo, enquanto a Mesa da Límia — dividida em três debates discute em painéis que tomam por título Produçom atual e oportunidades futuras ; Comercializaçom e mercados ; Associacionismo, mudança geracional e acesso à terra e à água — realiza um dos seus encontros virtuais, o ambientalista confessa: “A ameaça continua, eu nom cedi, mas eles também nom desistírom da açom judicial. Tenho falado com a Coren. Com responsáveis ao máximo nível. Garantem que estám a fazer o seu melhor para mudar as cousas. Parecem estar disponíveis, mas a ameaça continua e eu non posso saber qual a sua vontade real de mudar». Essa tarde, Manuel García conduz até à serra que separa Rairiz de Veiga, município limiao onde mantém a sua horta, de Verea. Estes montes dividem as bacias do Arnoia, a oeste, e da Límia, a leste. Do alto, a apenas cinco quilómetros em linha reta do curso do Limia, a planície abre-se para o oeste. Mas ele nom está lá para nos mostrar a Limia. “Granjas e xurros chegam até aqui. A estratégia parece ser relaxar a pressom abaixo e abrir granjas, roçar montes e ter pradarias aqui no cimo à base de estercar. Mas o efeito acaba por ser duplamente pernicioso. Roçam o mato que é a vegetaçom que filtra e conserva a água. E ganham terras para descargar xurro, o que parece ser o único propósito, porque aqui o prado é inviável, simplesmente nom existem condiçons de humidade como nas Astúrias ou em Lugo ”.
Numha aldeia perto da maior exploraçom de gado da comarca, um vizinho resume o quadro: “Os prados lá estám, nom estám é as vacas. Em Fontefría começam a ter problemas com a água, que falta e nom é apenas pola seca; aqui onde nós, instalárom outra granja, vinhérom pedir-nos parte do comunal, há cinco anos e nom nos dérom nada por isso, só pedimos é que nom ciscassem a merda onde estám as nascentes».
O documento da Mesa da Límia assume umha segunda premissa polémica. Aponta como um dos objetivos do plano “mitigar o conflito social existente devido à poluiçom ambiental da agropecuária intensiva”
María Teresa Joga, presidenta da Adegal, nom vê conflito social, como refletem os documento da Mesa. «Nom o definiria assim. Temos pontos de vista contrapostos. Ninguém tem a verdade absoluta. Todos temos parte de razom. Chegamos a algumhas situaçons tensas por falta de diálogo. A dia de hoje, estamos a dialogar. A premissa é viver em harmonia, em paz, os nossos modos e formas de fazer agricultura e pecuária som diferentes.
Na plataforma vicinal Auga Limpa, os seus porta-vozes acreditam nas possibilidades de diálogo. Na Mesa expugérom as suas demandas: moratória e avanços reais no tratamento de resíduos. “A mesa é umha oportunidade”, dizem. “Estamos numha fase muito inicial. Tirar conclusons é prematuro ”, afirma a presidenta da Adegal. Na Mesa, a Administraçom senta ministérios, conselharias, concelhos e umha vasta lista de entidades públicas de gestom e controlo. Os vizinhos som os únicos que pulam pola moratória. A empresa e os produtores assumem que exista margem para melhorar, “estamos dispostos, é claro, mas leva tempo, investimento, a melhoria nom vai acontecer da noite para o dia”, confessa Joga. A Xunta prometeu há dezassete meses que iria instalar 4 estaçons de tratamento, mas nem a antiga estaçom de Sarreaus recuperou a sua atividade nem nada se sabe das outras três. Foi anunciado pola primeira vez por Silvestre Balseiros, diretor-geral da Pecuária, que repete no cargo na Junta de Feijóo; em seguida, o próprio presidente no debate sobre o orçamento para 2020. Por enquanto, nada.
As projeçons populacionais do IGE também permanecem inalteradas, em 2030, A Límia terá perdido 16,4% da populaçom; a populaçom da Baixa Límia, a comarca mais empobrecida, envelhecida e despovoada do sul de Ourense e que sofre de problemas de poluiçom sem qualquer retorno económico terá regredido em 19%. Para as comarcas vizinhas de Celanova e Verim as projeçons do IGE nom som menos pessimistas e terám perdido 11% até 2030… isso se as condiçons nom mudarem. Porque o problema dos xurros — um dos fatores de expulsom da populaçom — embora reconhecido pola Administraçom, está a se expandir. E nom há nenhum elemento que indique que a indústria da pecuária, que domina social e politicamente esta parte do País há meio século, vaia deixar de espargir os resíduos ocupando cada vez mais território.
Enquanto a Mesa da Limia mói e remói sem nenhum progresso aparente, Manuel García e o Greenpeace colocárom os holofotes de volta nos xurros da Límia. Numha publicaçom de grande impacto, a associaçom ambientalista mais famosa do mundo resumiu a luta em um título: “Coren contra Manuel.” O Greenpeace explicou que se trata de um processo estratégico contra a participaçom pública (SLAPP, polas suas siglas em inglês): “Som ações movidas por atores poderosos, geralmente grandes empresas ou firmas, para assediar e silenciar quem denuncia qualquer irregularidade em relaçom aos assuntos públicos. As vítimas mais comuns dessas açons som ativistas, jornalistas freelance ou investigadores, que desempenham um papel essencial no monitoramento dos sistemas democráticos.”
“Estas açons judiciais de «mordaça» som umha forma de intimidaçom legal e assédio judicial (…) o seu principal objetivo é ameaçar e anular a capacidade de reaçom daqueles que exponhem as suas críticas. Em última análise, é umha forma privada de limitar a liberdade de expressom. ”
Na Límia, os ativistas som poucos, o jornalismo independente nom compareceu e os pesquisadores pregam num deserto social. Portanto, o Greenpeace pode resumir a manchete nessas três palavras. Manuel simboliza o bom espírito do ativismo. Coren, a ameaça que nunca cessa.
Enquanto isso, o município de Ginzo continua a receber pontualmente os relatórios da concessionária de águas, Viaqua. No momento, esses relatórios nom parecem ter produzido nenhum alerta. Os relatórios da Confederaçom Hidrográfica Miño-Sil (CHMS) causam alarme. O rio Límia está poluído, esta é outra das verdades oficiais estabelecidas que dificilmente suscitaram umha resposta da Administraçom. Em Sandiás, garantem da plataforma vicinal, nom há notícias de novos cortes de água. No ano passado, Bande e Moinhos não precisaram estabelecer nenhuma limitaçom para o banho nas áreas de lazer da barragem das Conchas. Nom havia banhistas. A pandemia ajudou a desligar os alarmes. A pandemia também cortou a comunicaçom com o outro lado da Raia e pouco se sabe hoje na Límia se mais abaixo no Lindoso também há gente preocupada porque as águas estám manchadas de esmeralda. A pandemia desligou alarmes e holofotes. Mas a pecuária Limiá e arredores continua a aumentar.