La Otra Escuela é umha organizaçom fundada em Colômbia que leva desde o ano 2000 trabalhando “temas de construçom de Culturas e Pedagogías de Paz em diferentes regions de Colômbia, o Estado espanhol e múltiplos países”. Luisa María Ocaña M. e Yaneli García Ríos fam parte da sua equipa multidisciplinar, que tem “umha relaçom estreita com a Galiza”, onde há pouco vinhérom lecionar umha formaçom em feminismo decolonial e onde voltarám em outubro com um novo curso.
Por que lecionades formaçons através do jogo e da arte?
Desde Otra Escuela cremos que, para as aprendizagens poderem ser transformadoras e coletivas, é necessário recorrer a processos alternativos frente à educaçom hegemónica, confrontando os supostos de que a educaçom com “sangue entra” e de que o conhecimento só o tem a pessoa docente. A nossa proposta é umha educaçom onde todas sejamos parte da construçom coletiva dumha educaçom horizontal, afetiva e senti-pensante. A participaçom em grupo é um elemento chave; por isso, a nossa metodologia é baseada na focagem sócio-afetiva, que consiste em viver na própria pele a situaçom que queremos trabalhar, para assim termos umha experiência em primeira pessoa que nos permita entender e sentir o que estamos a aprender. Para o lograr, valemo-nos precisamente de diferentes disciplinas artísticas, como as artes plásticas ou o teatro.
“Desde ‘Otra Escuela’ cremos que, para as aprendizagens poderem ser transformadoras e coletivas, é necessário recorrer a processos alternativos frente à educaçom hegemónica”
Que objetivos tenhem as vossas formaçons?
Buscamos oferecer bases e ferramentas concetuais, pedagógicas e lúdico-artísticas que integrem o cuidado de grupos/equipas, o acompanhamento psico-social, a inovaçom pedagógica e a transformaçom positiva de conflitos no âmbito laboral, social e pessoal. As nossas formaçons tenhem muito coraçom —como dizia o Doutor em Neurociências Francisco Moura, “só aprendemos o que nos emociona”— e esse é o caminho que percorremos em cada módulo que realizamos. As bases teóricas e metodológicas ocupam um papel mui importante; contodo, nom abordamos a carga temática à ‘velha maneira’, é dizer, com projetor, apresentaçom powerpoint e muito discurso, senom que abordamos os objetivos através de dinâmicas de açom participativa.
Como foi acolhida a formaçom em feminismo decolonial na Galiza?
Temos unha relaçom mui estreita com a terra galega. Já no 2019 figemos a primeira ediçom do Diplomado em “Transformaçom positiva de conflitos através da arte e o jogo” e, a partir disso, criamos vínculos com pessoas maravilhosas que fórom chave para que podamos seguir levando as nossas propostas agora. A partir dessas alianças, a nossa companheira Raquel de ACPP (Asemblea de Cooperación pola Paz) convidou-nos a fazer parte do grande projeto “Elas deciden” onde participamos na formaçom “Decolonialidade e focagem de género”. Foi um processo emocionante e cheio de reptos. Para nós é mui importante fazer da nossa prática pedagógica um exercício político, que possibilite um olhar crítico das relaçons de poder, os privilégios, as identidades e, portanto, as emoçons que isso nos suscita. Procuramos trazer à reflexom, a partir das vivências, experiências e saberes do grupo, as práticas que se realizam dentro do mundo das asociaçons civis e a cooperaçom internacional —que continuam a reproduzir privilégios e lógicas coloniais devido à situaçom pessoal e geopolítica de quem as promove—. Por suposto, isso significa confrontar-nos, expor-nos, rever-nos e incomodar-nos vendo-nos imersas em contradiçons. Foi um convite para des-romantizar o fazer e as boas intençons do labor de “ajudar”. Sem dúvida, foi um processo mui intenso e à vez mui satisfatório que as participantes assumirom com grande recetividade.
Que está acontecendo em Colômbia?
Umha mobilizaçom social transcendental para o povo colombiano. É um paro que leva dous meses, de denuncia e de visibilizaçom das profundas desigualdades que há no país e que aponta a umha transformaçom da sociedade. A raiva estalou por umha reforma tributária injusta, precedida polo recrudescimento da guerra, o assassinato de líderes e lideresas sociais e a profundidade das desigualdades económicas e sociais —exacerbadas pola gestom da pandemia—. Todo isto fijo que grande parte da sociedade se levantasse. A resposta institucional foi a repressom, a estigmatizaçom e a criminalizaçom da protesta, traduzida em lamentáveis casos de assassinatos, desapariçons, violência sexual, agressons físicas e detençons arbitrárias —modus operandi de quem está no poder institucional—.
Por sua vez, a resistência organizou-se convocando distintos setores da sociedade —moças, os povos negros, afrodescendentes, indígenas, camponeses, estudantes, artistas, jornalistas, nais, feministas, dissidentes sexuais…—, quem através de expressons criativas, culturais, assembleias populares e açons diretas demostrárom ser umha esperança de cambio e de poder do povo.
Como se enquadra precisamente o feminismo decolonial na situaçom de Colômbia agora?
O feminismo decolonial recolhe umha pluralidade de vozes, de experiências e de análises contra-hegemónicas que resulta necessária para transformar as estruturas de dominaçom, para nos re-educar, decolonizar o pensamento, as relaçons, a açom política coletiva e pôr no centro os cuidados e o comunitário. Como proposta política incita-nos a ultrapassar um olhar fragmentado das problemáticas que nos afetam e das nossas luitas: trata-se de pôr o foco na engrenagem de distintos sistemas de opressom como o racismo, o classismo, o patriarcado, a heterossexualidade… que som produzidos e sustentados num sistema moderno colonial que estruturou as relaçons de poder, o conhecimento “válido” e as nossas próprias subjetividades.
“Nom é apenas umha questom ‘do governo de Duque’ senom de como esse malgoverno responde a um modelo de ‘desenvolvimento’ que leva séculos a se sustentar na exploraçom global dos territórios do Sul”
Justo o que passa em Colômbia responde ao devandito sistema. Nom é só umha questom ‘do governo de Duque’ senom de como esse malgoverno responde a um modelo de “desenvolvimento” que leva séculos a se sustentar na exploraçom global dos territórios do Sul, dos corpos racializados, das mulheres e de todas as que nom ocupam o lugar do privilégio e a “normalidade”. Cremos que posicionar-nos desde o feminismo decolonial nos abre caminhos para atopar formas criativas de articular projetos políticos e apostas de transformaçom que logrem complexizar a análise e a açom: abrir caminhos que nos conectem com a terra, os seres vivos, a espiritualidade, resgatando outras formas de fazer, de pensar, de sentir, de nos cuidar e de sandar em coletivo.
“O futuro vai ser áspero e por isso invitamos a permanecer com umha atitude receitiva, propiciando espaços e atos de resistência”
Há possibilidades de aproveitar estes anos de crises para mudar as cousas?
Para Otra Escuela é fundamental manter um olhar crítico e analítico frente a este cenário. É importante destacar que a crise nom afetou igual todos os corpos. A crise da COVID, por exemplo, deixou entrever a profundidade das violências estruturais que afetam a nossa sociedade e a importância que tenhem os afetos nos processos de interveçom psico-social para apostar por mudanças estruturais.
Contodo, as crises sempre som oportunidades para nos reajustarmos, flexibilizarmos velhos padrons de comportamento social, velhos paradigmas, e pôr em funcionamento a criatividade. Quem forma parte de Otra Escuela sabe que o conflito é algo inerente à existência. Isto nom significa que o cenário de crise nom seja um repto. O futuro vai ser áspero e por isso invitamos a permanecer com umha atitude recetiva, propiciando espaços e atos de resistência. No fazer estamos a ser, juntas e em coletivo.