Margarita Ledo volve à tela com “Nación”, um filme sobre as trabalhadoras da fábrica de cerâmica Pontesa —que anos depois do feche seguem pelejando polos seus salários—, mas também sobre todas as mulheres galegas de classe obreira.
Por que escolhestes a história de Pontesa?
Quando rodei A cicatriz branca, sobre as mulheres que migravam sozinhas e que centrei em Buenos Aires, fum comprovando o grande passo que era, a nível emancipatório, deixar o trabalho doméstico, que implica estar fechadas numha casa, e passar a trabalhar numha fábrica com um salário. Isto foi o que aconteceu na Argentina dos anos 50.
De aqui, pensei que seria interessante fazer algo sobre a minha geraçom, concretamente sobre a geraçom expulsada precisamente do trabalho industrial com a chamada reconversom dos anos 80 e 90. E aí fum buscar indícios, vestiários, e dei com a Pontesa.
E como foi a primeira toma de contato?
Primeiro, vim uns cortes de ex-trabalhadoras da Pontesa num vídeo feito pola cooperativa de trabalho cultural Maos. No vídeo, estas mulheres explicavam um pouco a sua experiência, e interessei-me em concreto por conhecer umha delas, Nieves Lusquiños —que finalmente se converteria num dos fios condutores que enlaça com os outros fios em “Nación”—. Mas, num primeiro momento nom é que falássemos de se lhes interessava sair ou nom no filme, senom que eu ia mais bem pensando que a historia destas mulheres podia funcionar como unha base informativa para orientar-me a como focar o filme.
Depois resultou que, quando falei pola primeira vez com Nieves, em setembro de 2019, justo esse mês havia umha vista de um juízo que tinham pendente as ex-trabalhadoras de Pontesa, cousa que eu ignorava completamente. Entom, assistim a esta primeira vista nos Julgados do Laboral em Corunha e aí fum vendo as mulheres que havia. E foi ali também onde conformei um pouco o grupo que podia funcionar e que finalmente é o que aparece no filme.
“Em setembro de 2019 assistim à vista de um juízo que tinham pendente as ex-trabalhadoras de Pontesa nos julgados da Corunha. Aí fum conhecendo as mulheres que havia e conformando o grupo que finalmente aparece no filme”
Por que o formato mistura a ficçom com o documentário?
Por umha banda, é o que fago eu sempre, por tanto já tinha um certo adestramento. Interessa-me que vejamos a realidade, o imaginário, a utopia, o desejo… Aquilo para o que quiçá nom temos força mas polo que sabemos que temos que seguir pelejando. E, sobretudo, o passado, o que nom é visível, como pode ser a repressom sexista ou o berro proibido das mulheres. Todo isso forma parte do real.
Mas para mim o real só se pode fazer num formato que tem elementos que chamamos ficcionais, mas que bom, podem chamar-se doutra maneira. Habitualmente a este cinema já se lhe chama “Cinema de Nom-ficçom”, a nível contemporâneo. Noutras palavras, eu nom fago senom continuar —seguramente arriscando mais— o meu próprio processo de trabalho e as minhas escolhas formais. Como lhe dou corpo material ao que fago para que se veja, porque obviamente, se nom se vê, quedamos no terreno do invisível. É um formato que se demonstrou ademais que de facto se recebe mui bem por parte do público e fai que se fixe muito mais a ideia mesmo naquele que poda entrar pensando que vai ver um documentário convencional.
“Interessa-me que vejamos a realidade, o imaginário, a utopia, o desejo… E o passado, o que nom é visível, como pode ser a repressom sexista ou o berro proibido das mulheres”
No filme jogas a que as imagens do presente podam ser intercambiáveis com o passado. Quiçá porque o problema segue aí?
Sim, é justo isso. Há essa certa intemporalidade no sentido de que o passado está no presente. E, portanto, nom queria marcar a nível formal esse presente. Da mesma maneira, há intençom de passar por varias geraçoms e por isso está por exemplo a personagem que interpreta Mónica de Nut, umha trabalhadora cultural que representa essa precarizaçom atual.
Chamam a atençom as imagens de arquivo de mulheres luitando, porque som imagens de mulheres que normalmente nom se mostram.
Com certeza, e nelas há mulheres de todo tipo. Mulheres de muita idade —que muitas vezes nom se tenhem em conta—, outras mais novas… . Para topá-las simplesmente escolmei no Arquivo Carlos Varela Veiga, que foi o grande cineasta militante que morreu de jeito acidental e trágico nos anos 80. No seu arquivo, essa presença das mulheres é intensíssima. E ademais em posiçom ativa: son mulheres que tenhem o megafone, que intervenhem, que falam, que se confrontam. Isto acontece também quando vemos os arquivos da televisom pública, por exemplo, que tenhem umha riqueza imensa. O que passa é que há que reutilizá-los e seguramente nunca foram ensinados porque estavam ainda em bruto, sem editar. E aí vês também as mulheres defendendo, fazendo, confrontando e berrando. Dizendo o que tenhem que dizer. Aí é onde entra a autoria: ti escolhes aqueles materiais que te reforçam e com os que queres expressar o conteúdo do filme.
E como foi esta labor de investigaçom, suponho que enorme, nom foi?
É complexo na hora de topar o que queres, porque os materiais estám às vezes sem classificar. Mas, é muito mais complexo poder pagá-los. Essa é a verdadeira dificuldade e o trabalho pendente. Que arquivos que deveriam pertencer ao bem público estejam ainda a comercializar-se.
“Nas imagens filmadas polo cineasta militante Carlos Varela Veiga a presença das mulheres é intensíssima. E ademais em posiçom ativa: son mulheres que tenhem o megafone, que intervenhem, que falam, que se confrontam”
Outra cousa em que reparei é que nas imagens as mulheres trabalham, mas os homens seguem presentes em forma de capatazes, controlando.
Sim, mas isso nom é nem buscado, simplesmente aparece nas imagens. No momento em que tu busques ou nom essa relaçom, aí é quando imediatamente o vês. Outra pessoa que nom vaia buscando isso, provavelmente nom o veja. Mas nom é algo que seja anedótico, quer dizer, nom escolhim essas imagens em concreto porque me interessasse usá-las. Nom. Na realidade é umha constante nas imagens que topamos.
O arquivo ao que te estás a referir é ademais unha homenagem ao nosso cinema, para José Gil em concreto e para o trabalho que fixo no ano 28 para os talheres Alonarte em Vigo. E também umha homenagem à nossa história e ao ciclo das mulheres no trabalho industrial no S.XX. E isso enlaça com a folga das conserveiras na fábrica de Odosa, que fam um argumento fortíssimo de género sobre o rol dos seus companheiros masculinos, que vai completamente à par da posiçom da patronal.
“Na labor de investigaçom é complexo topar o que queres. É umha verdadeira difuculdade que arquivos que deveriam pertencer ao bem público estejam ainda a comercializar-se”
Como está a situaçom da luita das mulheres hoje?
Por umha banda há tercerizaçom do trabalho das mulheres, no setor serviços é muito mais difícil protestar, às vezes porque estás muito mais deslocalizada. Mas também há protesta, com certeza. E ademais contra grandes empórios como Inditex. Certo é que as formas tivérom que mudar, porque mudou toda a conformaçom do trabalho, sobretudo com esta terciarizaçom. Mas eu nom creio que se rebaixasse a consciência, polo menos, da dependência neste sentido. Há unha consciência da precarizaçom. Também, na pandemia, o rol que recaiu sobre as trabalhadoras e as mulheres de todos os sectores —sanitário, comércio, cuidados…— foi realmente abismal e nom há reconhecimento nengum. Esse é um dos problemas. E é um problema também de como manifestá-lo. Por isso penso que há que buscar outros modos de intervençom pública para que chegue a toda a sociedade e se faga mais consciente e solidaria. Penso que essa é a questom.