Este ano, no dia da Galiza Combatente, lembramos umha mulher galega e combativa cujo coraçom latejou com a força dumha coragem indómita: María Concepción Álvarez Álvarez, conhecida popularmente na vila da Guarda como Maria das Auroras.
Era umha mulher republicana convencida e de coraçom. Trabalhava numha sucursal funerária familiar e presenteava caixas a quem nom podia pagá-las. Independente, autodidata, agrarista e grande leitora, mostrou sempre umha forte iniciativa própria, que a levou a dar aulas grátis a crianças nas horas em que nom tinham que ajudar as suas famílias nas tarefas da casa ou no campo, emprestando-lhes também livros da Biblioteca Circulante da Sociedade Pro-Monte da Guarda.
Foi atriz dos quadros de declamaçom da Guarda. Como sindicalista e nacionalista galega, exerceu umha dupla militância: na federaçom local obreira da CNT (dirigindo o Ateneu de divulgaçom social) e fazendo parte da fundaçom da secçom local do Partido Galeguista, umha agrupaçom com grande peso da militância de prática sindical, a qual sofreu especialmente a repressom franquista. Nos anos finais da ditadura de Primo de Rivera, participou na fundaçom da Agrupaçom Republicana da Guarda e chegou a ser umha referência política que encabeçou a manifestaçom do 1° de Maio à chegada da II República.
A sua trajetória na Guarda ficava longe do carácter submisso e do espaço privado que supostamente lhe correspondiam. Isso estivo perto de lhe custar a vida quando, após o golpe de estado, foi detida nos primeiros momentos da entrada das tropas na vila, o 27 de julho do 1936. Maria foi presa durante dias e foi vítima dum ritual de humilhaçom cujas características eram determinadas polos roles de género. O propósito destes castigos era enviar umha clara mensagem sobre qual deveria de ser o modelo de conduta feminina.
Em primeiro lugar, queimárom-lhe todos os livros que possuia num ato público, diante dos militares e falangistas, assim como das vizinhas, cuja presença foi obrigatória. Aliás, foi obrigada a beber óleo de rícino e também foi submetida a outra das práticas com poder simbólico mais comuns naquele período: rapárom-lhe a cabeça, pretendendo assim umha despossessom da sua “feminidade”. O regime tinha claro que publicitar os resultados destes castigos provocava mais terror e parálise, à vez que gerava lealdades compulsivas.
Longe de se deixar engolir polo regime, nom duvidou em abrir as portas da sua casa familiar a outras vítimas da repressom
Finalmente, María das Auroras foi desterrada por uns meses a Salvaterra do Minho e foi-lhe negado o direito a fazer luto polos seus achegados fuzilados. Contudo, no seu regresso, longe de se render e se deixar engolir polo regime, nom duvidou em abrir as portas da sua casa familiar a outras vítimas da repressom e fazer um exercício vital de resistência paralelo ao objetivo da recuperaçom da memória silenciada, desafiando assim os relatos oficiais que divulgava o franquismo. De novo na Guarda, junto com a sua mãe e a sua cunhada, abriu a sua casa a outras vítimas da repressom fascista. Assim, na sua vivenda passou a residir Manuela Baz Domínguez e o seu filho, Antonio Amado, de quem Maria das Auroras acabou sendo madrinha. Também acolheu e cuidou Josefina García Segret, mestra nacionalista de Tominho que passara seis anos em distintas prisons do estado.
No dia da Galiza Combatente, projetamos a experiência de Maria das Auroras e a de todas essas mulheres luitadoras, relegadas à posiçom secular de vítimas apolíticas. Maria das Auroras é mais um exemplo da nossa resistência secular como povo que continuamos a lembrar. Por elas, hoje podemos dizer que a luita continua.