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Martinho: lideranças amorosas da Galiza Combatente

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Recebemento po­pu­lar de ‘Martinho’ após a sua saída de pri­som em Fene, o 14 de abril de 1996.

No ano 1986 Martinho, Jose Manuel Samartim Bouça, obreiro do na­val fer­ro­lano de 27 anos, in­te­grava umha base ope­ra­tiva na le­ga­li­dade do Exército Guerrilheiro do Povo Galego Ceive (EGPGC), en­car­re­gada de do­tar de re­cur­sos ma­te­ri­ais e eco­nó­mi­cos ao nas­cente pro­jeto mi­li­tar. A este mesmo fim con­tri­bui­ria com o seu pró­prio fi­ni­quito no es­ta­leiro, em torno a cinco mi­lhons de pe­se­tas (35.000 eu­ros). Numha fa­lida açom de ex­pro­pi­a­çom a umha su­cur­sal ban­cá­ria das Pontes, cairá preso de­pois de ser bru­tal­mente tor­tu­rado a mans da Guarda Civil.

Após algo mais dum ano preso, re­cu­pera a li­ber­dade e re­toma a sua mi­li­tân­cia no Exército Guerrilheiro, desta vez já na clan­des­ti­ni­dade. Nestes anos a or­ga­ni­za­çom de­cide fa­zer das in­fra­es­tru­tu­ras de es­pó­lio elé­trico um dos seus ob­je­ti­vos pri­o­ri­tá­rios. Na al­tura, o pro­jeto ini­ci­ado com o fran­quismo de con­ver­ter a Galiza numha co­ló­nia ener­gé­tica, tem cul­mi­nado a fase de cons­tru­çom das gran­des bar­ra­gens para a ge­ra­çom de ener­gia hi­dráu­lica. A Galiza pro­duz mais do du­plo da ener­gia que con­some e isto agrava-se mais se te­mos em conta que ar­re­dor de me­tade da ener­gia que se gasta no país fai-se nou­tros en­cla­ves co­lo­ni­ais: in­dus­trias como ENCE, Alumina-alu­mi­nio… Responsável da base que opera na zona da pro­vin­cia de Ponte Vedra, Martinho terá um pa­pel mui im­por­tante no de­sen­vol­vi­mento da tec­no­lo­gia que per­mi­tirá ao EGPGC ata­car tor­res de alta ten­som, sendo obra sua a que abrirá a cam­pa­nha, em Matamá (Vigo) em Novembro de 1987. 

Desenhará e co­man­dará umha das ope­ra­çons mais exi­to­sas e im­por­tan­tes da or­ga­ni­za­çom ar­mada, aquela que em 1988 pa­ra­li­sará ENCE du­rante vá­rios dias, por pri­meira e única vez desde que fora inau­gu­rada por Franco no ano 1963. O ca­rá­ter co­lo­nial e bi­o­cida desta in­fra­es­tru­tura, a ter­ro­rí­fica po­lí­tica flo­res­tal que ini­ciou a sua im­plan­ta­çom e a opo­si­çom po­pu­lar que des­per­tou desde que o go­verno fas­cista anun­ci­ara o seu pro­jeto, con­ver­te­ram ENCE em ob­je­tivo do Exército Guerrilheiro. O 30 de Abril, um pe­queno grupo de com­ba­ten­tes com Martinho à frente, vo­a­ria com car­gas ex­plo­si­vas as in­fra­es­tru­tu­ras de água e ele­tri­ci­dade que abas­te­ciam a ce­lu­lose, obri­gando a pa­ra­li­sar a sua atividade. 

‘Martinho’ tra­tava com o mesmo res­peito ao ve­lho e re­co­nhe­cido mi­li­tante que à jo­vem re­cém che­gada ao mo­vi­mento. Dava con­se­lhos e nom li­çons, e mos­trava-se aces­sí­vel, afetuoso

Em 1988, o EGPGC conta com duas ba­ses nos mon­tes ga­le­gos e Martinho agirá como res­pon­sá­vel de ‘Augas Limpas’, o re­fú­gio que se es­ta­be­le­cerá ao pé da bar­ra­gem das Portas, nos mon­tes do Invernadeiro. Será nesta al­tura em que en­tre a for­mar parte do Estado Maior Irmandinho (EMI), a di­re­çom da or­ga­ni­za­çom ar­mada. Assiste a umha jun­tança de dito ór­gao quando será de­tido, tor­tu­rado no monte e de­pois no ca­la­bouço, onde, para evi­tar que con­ti­nue aquela si­tu­a­çom, se aba­lan­çará con­tra umha vi­draça, após o qual terá de ser tras­la­dado ao hospital. 

No cár­cere con­ti­nu­ará a sua mi­li­tân­cia no Exército Guerrilheiro: de­pois de in­gres­sar em pri­som, ini­ci­ará umha greve de fame como pro­testo polo seu tras­lado a um cár­cere es­pa­nhol. Dinamizará o co­le­tivo de pre­sos e pre­sas in­de­pen­den­tis­tas, que le­vará adi­ante múl­ti­plas açons de pro­testo pola si­tu­a­çom de dis­per­som. Permanecerá na cela por volta de seis me­ses em pro­testo po­las con­di­çons car­ce­rá­rias e par­ti­ci­pará em gre­ves de fame do co­le­tivo, sendo amo­nes­tado em ce­las de iso­la­mento em di­ver­sas ocasions. 

Sairá do cár­cere em 1996 e, má­lia to­par o in­de­pen­den­tismo der­ro­tado, sem ape­nas es­tru­tu­ras pró­prias e mans para cons­truí-las, re­toma o seu com­pro­misso na rua. Participará nas Juntas Galegas pola Amnistia (JUGA), o co­le­tivo que dá apoio anti-re­pres­sivo às pre­sas do EGPGC, e con­tri­bui ao re­nas­ci­mento do mo­vi­mento ao lado dumha nova ge­ra­çom de mi­li­tan­tes or­ga­ni­za­das na Assembleia da Mocidade Independentista (AMI). Também apor­tará a sua ba­ga­gem ao ger­mo­lar dumha nova ex­pe­ri­ên­cia de re­sis­tên­cia com­ba­tiva que se ini­ci­ará com o lume dos co­que­te­les mo­lo­tov nos pri­mei­ros anos do novo sé­culo. Aliás, será umha pes­soa ativa nos pro­je­tos so­ci­ais da sua con­torna, na Fundaçom Artábria e nas apos­tas po­lí­ti­cas que o in­de­pen­den­tismo leva avante nes­tes anos. 

No ano 2010, umha en­fer­mi­dade ful­mi­nante atra­ves­sou a vida de Martinho, que mor­reu no mês de Novembro com 51 anos de idade. A dor que dei­xou em todo o mo­vi­mento só se ex­plica se en­ten­de­mos o es­cas­sas que som as no­tas bi­o­grá­fi­cas des­cri­tas nos pa­rá­gra­fos an­te­ri­o­res para re­fe­rir­mos quem foi ele. Para fa­lar­mos de Martinho e en­ten­der a im­por­tân­cia da sua pe­gada, há que ir muito além das qua­li­da­des ha­bi­tu­al­mente pro­cla­ma­das dos bons mi­li­tan­tes ‑que tam­bém per­so­ni­fi­cou- como a va­len­tia, di­li­gên­cia, au­dá­cia… Cumpre aten­der­mos àque­las ou­tras re­le­ga­das a um se­gundo plano (ou mesmo in­vi­si­bi­li­za­das): Martinho inau­gura um novo tipo de li­de­rança, umha li­de­rança sau­dá­vel, res­pei­tosa com as fra­que­zas pró­prias e alheias, hu­milde, sin­gela, bondosa. 

Em pa­la­vras do seu ir­mam Antom Garcia Matos: “Um rasgo do seu ca­rác­ter define‑o mui bem: a ti­mi­dez. A ti­mi­dez em Martinho era um pre­ci­oso re­galo po­lí­tico (…) ti­nha muito a ver com a ge­nuína ma­ni­fes­ta­çom ex­terna dum es­tado in­terno de no­tá­vel sub­me­ti­mento do ego, essa pul­som cor­ro­siva que nos em­purra ao fra­tri­cí­dio, à pre­po­tên­cia, ao exi­bi­ci­o­nismo, ao ódio e o sei­ta­rismo. Que lindo senti-lo vi­ver nas pon­tas dos pés! Deixou pe­gada sem pi­sar; foi es­cui­tado sem al­çar a voz, res­pei­tado sem acu­mu­lar ca­dá­ve­res. Sobressaiu sem com­pe­tir, foi reto sem ser al­tivo, ín­te­gro sem fe­rir. Fijo o que ha­via que fa­zer, sem nunca se exi­bir e ga­bar; ex­ce­lente com­ba­tente, mas nunca agres­sivo e iras­cí­vel. Fijo da sua pró­pria vida e dos seus atos a sua grande obra mes­tra, fer­mosa e trans­cen­dente. Ou en­ten­de­mos algo do que uma vida como a de Martinho nos trans­mi­tiu ou nom po­de­re­mos fa­zer-lhe frente ao cai­nismo que nos reclama”. 

Martinho tra­tava com o mesmo res­peito ao ve­lho e re­co­nhe­cido mi­li­tante que à jo­vem re­cém che­gada ao mo­vi­mento. Dava con­se­lhos e nom li­çons, e mos­trava-se aces­sí­vel, afe­tu­oso. Silandeiro, es­co­lhia os tra­ba­lhos de me­nor re­co­nhe­ci­mento, fa­lava o justo nas as­sem­bleias, cum­pria com as suas res­pon­sa­bi­li­da­des sem ga­bar-se por isso; fu­gia dos pro­ta­go­nis­mos, nom pre­su­mia de cur­ri­cu­lum. É por isto que este ano se lhe de­dica o dia da Galiza Combatente, com atos de ho­me­na­gem que de­cor­re­rám o dia 15 de Outubro na vila de Burela, onde pas­sou os seus úl­ti­mos anos: para pôr o foco nos va­lo­res mi­li­tan­tes que ins­pi­ram ou­tros ti­pos de com­pro­mis­sos e li­de­ran­ças, li­de­ran­ças amo­ro­sas, as que en­chem de sig­ni­fi­cado o con­ceito de irmandade. 

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