Há umhas semanas Teto e mais eu atravessámos o umbral dos oito anos encarcerados e decidim-me a quebrar pontualmente a discreta resistência diária que vem caracterizando o meu périplo carcerário.
Invariavelmente, o passo dos anos converte as imagens dos presos políticos num elemento acompanhante, quase ornamental, dos nossos espaços de convívio e de açom política. Nom pode ser doutro jeito, a vida prossegue ao seu ritmo, cada vez mais frenético, e daríamo-nos por satisfeitos se os nossos nomes e rostos fossem testemunhos de fidelidade à Galiza e estímulo de novas luitas. Mas, a estas alturas, confesso pessoalmente que a minha vivência atual situa-se fora de pretensons sócio-políticas, quando menos no curto prazo, e cobra pleno sentido na vontade de exercer a insubornável liberdade de espírito, insubmisso a qualquer cálculo de rendibilidade pessoal ou transaçom política.
O passo dos anos converte as imagens dos presos políticos num elemento acompanhante, quase ornamental, dos nossos espaços de convívio e de açom política.
Sabemos que o nosso prolongado encarceramento responde à decisom político-repressiva de converter-nos em exemplo dissuasório, representando nas nossas vidas o escarmento a toda umha geraçom de jovens forjada na luita independentista em finais da década de 90 e começos de século XXI, que assumiu um compromisso militante que já nom se estilava no nosso contexto geopolítico.
Hoje assistimos ao esfarelamento do corpo social, ao naufrágio da vida em tempos de precariedade totalizadora, de perda de referentes identitários, tradiçons e valores honoráveis baixo a divisa da valorizaçom económica de todos os aspetos da existência. O controlo social absoluto e o domínio mental massivo a través da cibernética e do cálculo algorítmico, junto à hipertrofia punitiva, debuxam-nos um cenário de “democracia tele-dirigida” invejável para qualquer ditadura fascista.
A mentira ganha terreno nesta sociedade líquida, fragmentada, desorientada e consequentemente deprimida, onde cada sujeito busca desesperadamente um salva-vidas particular tam ilusório como real é o caos civilizatório que nos tem reservado este capitalismo agónico.
Frente a esta distopia feita realidade, a decisom de nom claudicar, de mantermo-nos coerentes, com todo o que nos identifica e nos situa no mundo é um exercício radical de liberdade que segue dando sentido à própria vida.
Frente a esta distopia feita realidade, a decisom de nom claudicar, de mantermo-nos coerentes, com todo o que nos identifica e nos situa no mundo é um exercício radical de liberdade que segue dando sentido à própria vida.
Nom nos entendem, nom. Os inquisidores 2.0, os assalariados da repressom, os mercenários da dor incapazes de imaginar um mundo mais alá da imperante razom instrumental, segundo a qual todo deve submeter-se ao benefício imediato e ao rédito individual, olham desconcertados o nosso percurso fora do seu decadente espetáculo de luzes de natal, smartphones, redes sociais e embriagamento consumista.
Nom compreendem o compromisso como voluntários da liberdade que é recompensado com a irmandade patriótica e revolucionária e com a consciência tranquila, e isto nom entende de números nem de contas, nem está em oferta algumha do Black Friday.
A cadeia peneira todo o mundo. Nós, a nossa gente e o nosso movimento. É certo que algumhas pessoas ficárom no caminho mas a prisom também nos agasalha com a solidariedade verdadeira, com a amizade real e sacrificada, com uns vínculos a prova de lume em que sustentamos a nossa comunidade de vida e de luita. Nesse valor incomensurável reside a esperança de qualquer liberdade coletiva.
Irmás, irmaos, apertas!