No passado 7 de fevereiro o Tribunal Supremo aceitava o recurso apresentado por Ence e outras entidades contra a sentença da Audiencia Nacional, de julho de 2021, que revogava a prórroga por 60 anos à pasteira em terreno público marítimo-terrestre, concedida polo governo em funçons de Mariano Rajoy em janeiro de 2016.
A decisom apaga as sentenças favoráveis ao Concelho de Ponte Vedra e Greenpeace, onde se determinava que Ence, para justificar a sua continuidade em Louriçám, tinha que demonstrar que a atividade, pola sua natureza, só se podia desenvolver numha localizaçom costeira; questom que a Audiencia Nacional nom considerou provada. Naquele juízo, a própria Abogacia del Estado renunciara a defender a prórroga ao considerar que fora concedida de forma ilegal, requerindo que o tribunal desse a razom às entidades demandantes. A sentença do Tribunal Supremo argumenta que, no caso das concessons prévias à Lei de Costas de 1988, a autorizaçom de prórrogas só depende da existência de informes ambientais positivos por parte da administraçom, neste caso a Xunta de Galicia, umha tese que para os sectores opostos à pasteira supom deixar sem efeito a lei. Num tribunal composto de magistrados maioritariamente conservadores houvo, porém, um voto particular contrário que rejeita a interpretaçom da jurisprudência do Tribunal Constitucional amparar umha prórroga como esta a umha instalaçom incompatível com a Lei de Costas, assinalando também os efeitos negativos e potencialmente irreparáveis no ecossistema derivados da atividade da fábrica durante mais de um século como umha questom a ser levada em conta.
Do movimento anti-Ence destacárom-se fatores alheios ao estritamente judicial como determinantes nesta sentença. Em declaraçons ao Novas da Galiza, o presidente da APDR, Antón Masa, indicou que “de modo direto ou indireto, evidentemente houvo pressons de Ence”. Da sua visom, o tribunal “retorceu a lei sistematicamente” na sentença “para adaptá-la a umha decisom tomada previamente”, mesmo botando mao de leis posteriores ao requerimento e à concessom da prórroga “que nom se poderiam aplicar”. O certo é que a pressom em favor de umha sentença favorável aos interesses da pasteira fijo-se sentir em todo momento. Nom só do lado da Xunta e o PP, tradicionais aliados da empresa e com vínculos bem conhecidos desde há tempo, mas também de parte das organizaçons patronais. A isto somou-se, e nom é novidade na história do conflito, umha forte pressom mediática da imprensa vinculada a esses mesmos poderes políticos e económicos. Assim, ao tradicional papel pró-Ence da imprensa local e nacional acrescentava-se nos dias prévios à sentença o de jornais estatais que, como Expansión e El Mundo ou Cinco Días, publicavam artigos com um claro conteúdo em defesa da continuidade da factoria na ria de Ponte Vedra.
No contexto de um conflito com muitas décadas de história e com posiçons bastante definidas, as reaçons a esta notícia nom causárom surpresa. Do lado de Energía y Celulosa SA e dos seus apoios empresariais, sindicais, mediáticos e políticos, a sentença foi recebida com satisfaçom e apresentada como “definitiva”. A alegada defesa dos postos de trabalho e do “peso económico” da empresa que reivindica todo esse conglomerado ocultaria, porém, a privatizaçom de facto de terrenos públicos ambientalmente sensíveis e um trato de privilégio cara a umha empresa que nom terá que pagar nada polo espaço que ocupa.
Oposta foi a reaçom no movimento popular que defende a saída de Ence de Louriçám. Associaçons vizinhais ou comunidades de montes, por exemplo, manifestárom publicamente o seu rejeitamento. Por parte da APDR, pendente de conhecer a sentença que atinge diretamente a associaçom e de convocar as suas sócias e sócios a umha assembleia para informar e decidir o caminho a seguir, nom se dá por perdida a batalha. Apesar do passo atrás, Masa assinala que, além da importância de manter a mobilizaçom social, “há resquícios para reverter a situaçom pola via judicial, requerindo amparo ao Tribunal Constitucional, recorrendo aos tribunais europeus e solicitando a volta do caso à Audiencia Nacional para que se pronuncie sobre se a prórroga deveria contabilizar-se desde 1958 ou desde o requerimento da mesma”.
A alegada defesa dos postos de trabalho e do “peso económico” da empresa ocultaria, porém, a privatizaçom de facto de terrenos públicos ambientalmente sensíveis
A nível político e institucional as reaçons também fôrom predizíveis. No âmbito do nacionalismo tanto o alcalde de Ponte Vedra, Miguel Anxo Fernández Lores, como a porta-voz nacional do BNG, Ana Pontón, mostrárom a sua surpresa perante umha sentença que contrasta com a contundência da anterior na Audiencia Nacional, vinculando‑a de novo à influência de Ence nas altas esferas do Estado. De parte da Xunta e do PP instou-se ao Concelho de Ponte Vedra a aceitar a situaçom e abandonar a luita contra a pasteira, qualificada de “assédio à Ence” por parte do presidente Alfonso Rueda. No PSOE, a força tradicionalmente mais ambígua neste conflito social, as reaçons fôrom mais diversas, com o secretário-geral Valentín González Formoso chamando bem aginha a “conviver com a realidade” da presença da pasteira na ria. Umha posiçom que se pode vincular com a sua condiçom de alcalde das Pontes e com o projeto de construçom no concelho eumês de umha fábrica de produçom de fibras por parte de Ence. O seu posicionamento, porém, causou mal-estar noutros setores do partido. Pola sua parte, o governo espanhol limitou-se a dizer que “estudará a sentença em detalhe”.
Finalmente, para definir o novo contexto, cumpre acrescentar o anúncio do expediente aberto pola UE contra o Estado espanhol por infringir a normativa de serviços europeia ao nom garantir processos de seleçom transparentes para as concessons em zonas costeiras, achando aliás que as prórrogas de até 75 anos sem justificaçom som contrárias à legislaçom europeia. Umha novidade, esta, que pode abrir novas possibilidades para o movimento anti-Ence.
Numha luita com tantos anos de história, fôrom muitas as vezes em que a satisfaçom e a decepçom mudárom de bando. De momento, o Concelho de Ponte Vedra já confirmou que continuará a batalha judicial. Nom é descartável que novas sentenças judiciais e decisons políticas modifiquem de novo a situaçom nos próximos meses e anos. A luta vai seguir porque, ao fim e ao cabo, o que está em disputa é o modelo de país, o futuro do mar, do rural, da indústria e do ambiente.