
«Eu estou vivo e vós estades mortos». A todos os líderes de partido prestaria-lhes valorar os resultados do 28M botando mao do título do ensaio que Emmanuel Carrère dedicou a Philip K. Dick. Mas, à parte da vitória esmagadora (ou pírrica), o sucesso eleitoral adota outras muitas formas: sobreviver, resistir…. O adianto para o 23J das eleiçons gerais e a constituiçom das novas corporaçons achegou um contraste realista que abaixou o brilho dos entusiasmos da noite eleitoral. Para mais cidadaos, o BNG é a principal força da mudança política na Galiza. O PSdeG, desacougado polos avanços do nacionalismo de esquerdas, enrócase em governos em minoria com políticas de colaboraçom de baixo perfil que, longe de acelerar a erosom do domínio conservador, favorece que o PPdeG se recomponha, na oposiçom local, como alternativa de relevo na quenda do bipartidismo. Rueda, aliviado, celebra umha vitória inexistente.
Júbilo em Génova 13, alívio em Monte Pio
A euforia de Génova 13 camuflou o cativo balanço do PPdeG. A potência do «cambio conservador» nom tivo traduçom na Galiza. Rueda tivo resultados muito por baixo das expetativas. A medra de votos apenas se concretizou em mais recursos de poder. Os sucessos: a alcaldia de Ferrol, ganhar a Deputaçom de Ponte Vedra e conservar, graças ao laissez faire de Jácome, a de Ourense. Fracasso no assalto às alcaldias da Corunha, Compostela, Ponte Vedra, Vigo e mais nas de Lugo e Ourense que eram a chave da maioria nas duas deputaçons. Forte nos pequenos e medianos concelhos, nom logra avanços significativos na Galiza urbana. Fora das cidades, em 2019, nos 15 concelhos de mais de 20 mil habitantes conseguiu 4 alcaldias (Arteijo, Ribeira, Lalim e Marim). Desta volta, perdeu Ribeira e só ganhou Ponte Areias. Com umha dúzia de corporaçons locais por constituírem-se, o PPdeG soma mais alcaldias (146) do que PSdeG e BNG (99 e 32, respetivamente); contodo, os seus governos municipais alcançam menos cidadaos. Continua a corrosom da sua hegemonia na Galiza.
A via ferrolá
Os inquéritos de Sondaxe-La Voz de Galicia acoutam a competiçom eleitoral e enquadram o que é desejável segundo o critério da Coaligaçom Imobilista que, desde 2009 ajunta os interesses políticos, económicos e mediáticos dos mais favorecidos como alternativa de ordem e estabilidade. Os tracks de Sondaxe som um requintado produto da indústria da consciência cidadá. Em campanha servírom para sublinhar só os avanços do PPdeG, santificar a sua vitória certa em Ferrol e cartografar Lugo e Ourense como cenários proclives a um êxito conservador.
O PPdeG tivo resultados muito por baixo das expetativas. A medra de votos quase nem se concretizou em mais recursos de poder. Os sucessos: a alcadia de Ferrol, ganhar a Deputaçom de Ponte Vedra e conservar graças ao ‘laissez faire’ de Jácome, a de Ourense
Como estratégia de fundo, clausurar o ciclo de rebeldia municipal iniciado em 2015 polas marés e normalizar soluçons de governo dos partidos fundamentais do Regime do 78. Preferentemente do PPdeG, garantia de continuísmo das políticas de ordem. Subsidiariamente, de um PSdeG, à margem de coaligaçons, ao modo do novo vazquismo de Inés Rey. No tático, tentou-se conter todo sorpasso que reforçasse Pontón e o BNG no liderado de umha alternativa para a mudança. Também, desterrar Jácome de Ourense e adelgaçar o seu peso na Deputaçom.
O desejável para o Partido de Ordem é que se imponha a via ferrolá: despejo das marés governantes — governo minoritário do PSdeG — maioria absoluta do PPdeG. Em definitivo, despluralizaçom do autogoverno local, fortalecimento dum bipartidismo imperfeito com a bençom dum PPdeG dominante, o PSdeG como complemento indolor e o BNG como força subordinada. Desacougo nos palafreneiros mediáticos da Coaligaçom Inmobilista: no 28M, a vontade popular nom se acomodou ao padrom de Sabom.
Avanço do BNG
Sucesso contundente do BNG. Melhora nas cidades, beneficia-se do colapso das marés municipalistas e da falta de engado do PSdeG. Logra a alcaldia para Goretti Sanmartín em Compostela, conserva (mesmo com a perda de eleitores e representaçom) o governo de Ponte Vedra, aumenta votos e atas na Corunha, Ferrol, Ourense e Vigo, acada um magnífico resultado em Lugo.
O 28M, o BNG somou 590 atas, 134 mais do que em 2019. Das 28 alcaldias logradas em 2019, repetirá em 23. Cede as de Rianjo, Rivadéu, Banhos de Molgas, As Neves, Poio e Ponte Areias. Compensa as perdas com as de Arçua, Vilar de Santos, Corcubiom, Muros, A Teixeira, Ribeira, A Rua, Catoira e Soutomaior. Contará com 32 alcaldias, ganha peso político em muitos concelhos onde era parte da coaligaçom de governo e é decisivo na investidura de muitos alcaldes do PSdeG.
A estratégia de alargamento da base do BNG concreta-se desigualmente; mais nos apoios cidadaos que na abertura social ou a pluralidade das candidaturas nacionalistas. A maior diversidade dos seus votantes tem um pobre deslocamento para as listas eleitorais
O BNG ampliou os seus recursos institucionais e o seu enraizamento territorial. Com avanços notáveis fica ainda longe dos máximos eleitorais das autonómicas nas cidades. Por enquanto, aumenta a fidelidade dos seus votantes nas vilas. Na Galiza urbana, tem mais arraste eleitoral que porosidade cidadá. A estratégia de alargamento da base do BNG, abandeirada por Ana Pontón, concreta-se, assim, desigualmente; mais nos apoios cidadaos que na abertura social ou a pluralidade das candidaturas nacionalistas. A maior diversidade dos seus votantes tem um pobre deslocamento para as listagens eleitorais. O BNG necessita de abertura social e inovaçom programática para validar-se como cerna da alternativa da mudança na Galiza.
O revés do PSdeG
O 28M, o PSOE sofreu um serio revés político, mais duro pola perda de recursos de poder que pola mingua de apoios eleitorais. 403.741 votos, 1557 concelheiros menos, umha pequena recuada (-1,26 pontos percentuais) da qual resultou, porém, a perda de alcaldias importantes (e severas derrotas nas autonómicas). O balanço do PSdeG tampouco é satisfatório, umha caída de 76 mil eleitores, 171 concelheiros e 12 alcaldias menos, entre elas as de Compostela e Ferrol, e a perda (contra prognóstico) da Deputaçom de Ponte Vedra.
O seu sucesso de 2019 (111 alcaldias, 1.181 atas de concelheiros, um terço dos sufrágios) ficou sensivelmente abaixado (99 alcaldes, 1.010 edis e um devalo de 3,7 pontos na percentagem de votos). O balanço seria mais catastrófico nom sendo porque o BNG absorve as suas perdas eleitorais e de representaçom em muitos concelhos, fechando o passo ao PPdeG às alcaldias.
O modelo de governos socialistas em minoria, como ante-salas de maiorias absolutas, adornados frágeis marcos de cooperaçom com outras forças, deitou benefícios cativos na Corunha e derrotas: mínima em Ferrol e catastrófica em Compostela. Ao PSdeG foi-lhe melhor nas experiências de coaligaçom como força maioritária em Lugo ou minoritária em Ponte Vedra.
Em Ourense, sem um horizonte de regeneraçom democrática, impujo-se a entente cordial das duas direitas
Em municípios de mais de 15.000 habitantes com governos do PSdeG, derramárom-se maiorias absolutas em Vila Garcia, Culheredo, Tui, Betanços, Ogrove… onde conservarám a alcaldia com acordos ativos ou passivos de investidura. Acordos semelhantes garantirám-lhe o governo em Ames, Redondela, Tui, Gondomar, Viveiro, Verim, O Carvalhinho, Barbadás… Conservárom, sim, as maiorias absolutas em Monforte, As Pontes, Nigrám e, o 28M, conseguírom-na em Boiro.
A doutrina Formoso-Lage Tunhas
Umha epidérmica análise demoscópica esteia a estratégia de Formoso e Lage: os eleitores socialistas marchárom à abstençom ou transferírom-se ao PPdeG. Para recuperá-los o 23J, dizem que o PSdeG nom pode aparecer como umha força subordinada ou condicionada polo BNG. De aí, por exemplo, a sua negativa a fazer parte do governo de Sanmartín em Compostela, a rutura a coaligaçom governamental em Ames ou a aposta em manter governos socialistas em minoria. Incapazes de suster as suas maiorias absolutas em condiçons menos adversas, pior resistirám os governos minoritários na próxima tirada.
O enroque resistencialista do PSdeG debilitará a construçom dumha maioria social alternativa frente ao PP na Galiza e a continuidade do Governo Progressista no Estado. Objetivamente, mais do que abrir campo para o cambio político, senta condiçons para o relevo municipal do PSdeG polo PPdeG. A mudança na Galiza, e no Estado, fundamentará-se em alianças plurais e nom na senhardade de maiorias absolutas doutro tempo. A doutrina de Formoso e Lage Tunhas favorece a via ferrolá e antecipa futuras e mais dolorosas derrotas.
Ourense, a entente das duas direitas
Regeneracionismo zero. Nom fôrom os Baltar os que trouxérom o caciquismo, foi o caciquismo o que permitiu que a dinastia familiar assente durante 33 anos na Deputaçom de Ourense. O clientelismo do PPdeG sobreviverá José Manuel Baltar. Fracassou o cinturom sanitário em beneficio da lista maioritária. A operaçom de normalizaçom do Concelho de Ourense para impedir um novo mandato de Jácome acompanhou-se dum jogo sujo mediático que provocou um efeito rebote que ajudou a camuflar o seu desgoverno autoritário. Pouco crédito de quem assinala a corrupçom de Jácome e camuflam a de Baltar. Sem um horizonte de regeneraçom democrática, encaixado o seu relevo na lógica do bipartidismo tradicional, finalmente, impujo-se a entente cordial das duas direitas. Como em 2019, a direita populista serve para a direita conservadora como soluçom de emergência para encorar as forças progressistas e eivar a democratizaçom do governo municipal e a Deputaçom de Ourense.