Tinha pensado escrever (outra volta) do 8 de março, refletir mais uma vez na questom dos cuidados, na organizaçom dos nossos trabalhos e dos nossos dias, em como é que somente UM sindicato (a CUT) convocou greve no 8 de março este ano, como se neste tempo precário nom houvesse quem trabalhasse em domingo (a empregada do restaurante onde vais comer churrasco, as padeiras, as jornalistas, as professoras particulares em negro, o pessoal sanitário, a precária em bicicleta com a saca da Glovo às costas… Faz falta seguir?), como se nom houvesse pessoas a fazerem um trabalho ingente de cuidados que é o que sustenta a vida, que nom é remunerado, que nom goza de direitos nem feriados para as suas trabalhadoras invisíveis. Mas nom dei. Umha, pola própria (péssima) organizaçom dos meus trabalhos e dos meus dias, que me levam sempre a escrever no limite de prazo. Outra, porque a realidade destas últimas semanas deu-nos a volta de pernas para o ar.
Apenas um sindicato, a CUT, convocou greve no 8 de março este ano, como se neste tempo precário nom houvesse quem trabalhasse em domingo, como se nom houvesse pessoas a fazerem um trabalho ingente de cuidados que é o que sustenta a vida, que nom é remunerado, que nom goza de direitos nem feriados.
Nestes dias em particular: estado de alerta. Vírus, contágio, mortes, pandemia. Histeria coletiva, os estantes do papel higiénico vazios nos super-mercados, suspensom de tudo, o mundo parado, tele-trabalho (quem puder). Mas mentalmente fico no 8 de março. Pensando na peixeira do super que nom tem com quem deixar a miúda, pois ela tem de trabalhar, o seu homem também, e as suas famílias estão no Equador. Pensando na professora que se tinha de deslocar para ir tele-trabalhar no seu centro de trabalho sem alunado. Pensando na repartidora da Glovo. Pensando na autónoma, e também na que trabalha em negro. Nas que limpam a merda, dam de comer, transportam. Nas mulheres em prostituiçom. Nas presas (o que se passa dentro das prisons sempre fica nas margens da atualidade, mas segue a passar-se). Nas que nom tenhem casa para ficar nela. Nas sem refúgio (dizer “refugiadas” há muito tempo que constitui um oxímoro).
Fico pensando na peixeira, na professora, na repartidora de Glovo, na autónoma, na que trabalha em negro. nas que limpam a merda, dam de comer, transportam. Nas mulheres em prostituiçom. Nas presas. Mas que nom tenhem casa. Nas sem refúgio (dizer “refugiadas” há muito tempo que constitui um oxímoro).
E penso, iniciando a quarentena na casa, a reler aquele romance de Albert Camus, A peste, que me dera como presente o meu caro professor de Ética no bacharelato, o Xabi, no mesmo de sempre: o que fazer. O único meio para lutar contra a peste é a honestidade, diz o doutor Rieux num momento. Também diz que nom sabe o que é a honestidade, mas sim que sabe o que é para ele, e no seu caso é o único que sabe fazer: o seu ofício. Nom poderemos juntar-nos na rua, mas podemos seguir a tecer canais de solidariedade e de organizaçom. Lermos, escrevermos, falarmos (mesmo na distância), pensarmos nas outras que ficam fora do nosso âmbito de privilégio e no que fazer (e até no que NOM fazer) se for preciso para que a precária nom esteja mais precária com esta crise. #Ficaremcasa nom significa ficar inativas. E lembro ao Roque Dalton: “a quem che diga que o nosso amor é extraordinário porque nasceu de circunstâncias extraordinárias diz-lhes que precisamente lutamos por que um amor como o nosso (amor entre companheiras de combate) chegue a ser em El Salvador o amor mais comum e corrente”. Cuidemo-nos todas.