
Em outubro, Claudia Bernal Estrada visitou o Estado espanhol a convite do Movimiento Estatal de Solidaridad con Cuba (MESC) e fez ainda paragem na Galiza com a Associação de Amizade Galaico-Cubana Francisco Villamil. Bernal Estrada trabalha no Centro de Ingeniería Genética y Biotecnología de Cuba (CIGB).
Antes de mais, gostávamos de saber o que é o CIGB.
O CIGB é o porta-estandarte da biotecnologia cubana, e não é por acaso: é o resultado do pensamento do Comandante-em-Chefe Fidel Castro, que identificou imediatamente a importância de desenvolver este sector em Cuba. Fundado em 1986, desenvolveu produtos únicos no mundo no seu género, como o Heberprot, e é capaz de desenvolver as suas próprias vacinas. Realiza o ciclo completo desde a investigação, desenvolvimento, estudos clínicos em todas as suas fases, produção e comercialização de produtos orientados para a saúde e para a indústria agrícola.
Quais são os produtos mais importantes que este centro comercializa?
Entre os produtos mais significativos contam-se: Heberprot‑P (para úlceras do pé diabético, evitando o risco de amputação), Abdala (vacina contra a covid), Jusvinza (reduz os níveis de hiperinflamação em doentes com covid-19), GAVAC (vacina contra carraças em bovinos), PORVAC (vacina contra a peste suína clássica) e ACUABIO 5 (estimulador do crescimento e da imunidade em espécies do sector da aquacultura).
Qual é o seu trabalho no Centro?
Sou responsável pela parte comercial, no Departamento de Importação, na compra de insumos, matérias-primas e tecnologias para a investigação e produção dos nossos medicamentos.
“A biotecnologia cubana nasceu marcada pelo bloqueio económico, comercial e financeiro”
Que impacto tem o bloqueio no vosso trabalho de investigação e produção?
A biotecnologia cubana nasceu marcada pelo bloqueio económico, comercial e financeiro, que se intensificou ao longo do seu desenvolvimento. Nestas condições, foi aberto o caminho para uma indústria que é dispendiosa em qualquer parte do mundo e, no entanto, tão necessária para a população. Não se pode prescindir dela, e há um reconhecimento internacional do CIGB e de outros centros científicos em Cuba.
Um dos principais problemasdo dia a dia é a perseguição às nossas transações comerciais e financeiras, as represálias contra empresários e entidades com ligações a Cuba, a limitação das operações bancárias; é uma constante no sector comercial em que trabalho no Centro. Esta perseguição e outras medidas dificultamo acesso às matérias-primas no mercado. O resultado pode ser visto nas receitas que perdemos com as exportações e isso afeta o sistema produtivo.
O bloqueio não só tem repercussões e viola os direitos dos cubanos, como também priva o mundo e as pessoas necessitadas dos benefícios dos produtos biotecnológicos e farmacêuticos desenvolvidos no nosso país. Devido ao elevado nível de risco das empresas norte-americanas para a negociação e futura comercialização do produto Heberprot‑P, o único do género no mundo para o tratamento de úlceras do pé diabético, não podemos entregar este produto a quem dele necessita.
Na impossibilidade de obter artigos fabricados nos EUA ou noutros países por empresas detidas pelos EUA ou com componentes dos EUA, somos forçados a adquiri-los em países terceiros, a um custo muito mais elevado, ou a comprar substitutos mais caros.
A isto junta-se a impossibilidade de efetuar transferências através de bancos com interesses americanos, dominantes na Ásia e na América Latina e muito importantes no resto do mundo, e a impossibilidade de utilizar o dólar para as transferências.
O bloqueio afeta não só a instituição, mas também cada indivíduo. Limita as oportunidades de os nossos cientistas poderem realizar o seu trabalho com tecnologias atualizadas e de ponta utilizadas a nível internacional e que constituem um elemento essencial para o desenvolvimento dos seus respetivos domínios deinvestigação. Torna impossível para o pessoal científico pagar por publicações atualizadas em diferentes domínios de investigação. Isto conduz a um roubo de talentos, com um impacto sobre este capital humano em formação.
Também nos deparamos, porvezes, com a impossibilidade de pagar patentes ou com dificuldades de pagamento, custos acrescidos devido a penalizações e problemas sérios com a manutenção de patentes em países como a Austrália e a Índia, chegando mesmo a perder-se algumas. Estas perdas de reconhecimento de propriedade intelectual afetam quaisquer futuras acções de negociação, registo ou comercialização que possam ter interesse ou ser possíveis nesses territórios.
O trabalho no Centro deu-me a conhecer as repercussões do bloqueio dos EUA a Cuba, especialmente durante os anos mais difíceis da pandemia de Covid-19, em que o nosso Centro, entre outras instituições e a vontade política do Estado cubano, desempenhou um papel decisivo para enfrentar um vírus que nos mostrou que vivemos num mundo cada vez mais globalizado, que nos tornou iguais. E em condições tão graves, tivemos como agravante 243 medidas que ameaçaram o desenvolvimento social e económico do país. É difícil pensar nestes últimos anos de pandemia.
“Um dos principais problemas é a perseguição às transações comerciais e financeiras”
Que papel desempenham a juventude e sobretudo as mulheres neste e noutros centros de investigação de referência em Cuba?
O CIGB e qualquer outra esfera da sociedade seria impensável sem o papel preponderante das mulheres cubanas. Trabalhar no Centro dá-me a oportunidade, o privilégio e a experiência de partilhar com excelentes profissionais mulheres, que se destacam pela sua capacidade e qualificação no Centro e noutras instituições do País. Hoje é uma mulher que lidera o CIGB, é uma mulher que lidera as organizações do Centro e a que lidera a área em que trabalho. A secretária-geral da juventude do nosso centro é uma mulher; são inúmeras as mulheres que gozam de prestígio e reconhecimento científico na área da investigação a nível internacional, no pessoal de apoio, administrativo e de serviços. É difícil não se sentir orgulhoso do empenho com que nos dedicamos a uma tarefa e dos resultados que daí advêm. A biotecnologia cubana seria impensável sem o papel preponderante e avançado das mulheres cubanas.
Os jovens devem desempenhar um papel de liderança na vanguarda e na mudança geracional. No nosso centro existe um dinamismo interno que incentiva a participação dos jovens nas suas próprias tarefas, bem como noutras de impacto social e comunitário que sensibilizam e humanizam, semeando valores. Há uma convivência mágica entre as diferentes gerações no Centro, da qual me orgulho de fazer parte.