Alba Cobo é ativista feminista, experta em nutriçom e em terapias psico-expressivas. Após sofrer as consequências da pressom estética, a estigmatizaçom, a cultura da dieta e a restriçom, encontrou umha saída nos feminismos gordos. Através de formaçons em centros educativos, de atividades artísticas e do serviço Outro Conto, fundado com Isaac Pujales e que combina menus a domicílio e serviços de acompanhamento corporal, Cobo dedica-se a combater de modo integral a gordofobia. Nesta entrevista explica-nos algumhas chaves desta discriminaçom e as bases do seu trabalho contra ela.
Como definirias a gordofobia? Na tua experiência, achas que interage com outros fatores como o género, a classe ou a raça?
A gordofobia é a opressom sistemática contra as pessoas gordas polo facto de o serem. Cimenta-se em preconceitos sobre os nossos hábitos e a nossa saúde. Estes preconceitos nutrem-se da ideia de que os corpos gordos respondem a umha falta de vontade, de auto-cuidado, de esforço suficiente para umha pessoa ser magra, motivo polo qual merece ser punida. É essa violência que encontramos no médico quando vamos por umha dor de perna ou de estômago e, em lugar de nos fazerem qualquer prova, saímos com umha dieta na mão; no mercado laboral, quando nom há pessoas gordas trabalhando na frente do público e nos anúncios ainda lemos “necessária boa presença”; nas lojas de roupa, que nos berram que nom merecemos ser vestidas; na rua, nas conversas à nossa volta, com a família e as amizades, no centro educativo, nas infraestruturas públicas quando nom cabemos num assento, na hora de encontrarmos relaçons sexo-afetivas… E sim, está ligada absolutamente a outras opressons e fatores como o género, a classe ou a raça. Porque, quem encarna o ideal de pessoa magra? Tem toda a gente a segurança e a acessibilidade alimentar que exigem a tirania da beleza e a cultura da dieta? Pode toda a gente permitir-se comer o considerado saudável? O que é realmente comer de forma saudável? Como funciona a indústria alimentar e quem está a beneficiar? Podem todos os corpos chegar a ter nom só o tamanho, mas a forma que marca o ideal?
Como dizes, o questionamento aos corpos gordos é justificado na saúde. Porém, este juízo envolve muitos preconceitos e erros diagnósticos. Que dados poderias sinalar neste sentido?
Considero que a violência médica é brutal. A indiferença, o tratamento negativo, a falta de provas, a falta de diagnoses e o medo a sermos maltratadas no consultório: embora tenhamos doenças evitamos ir, porque, afinal, para quê, se o problema é nosso? Abusam do seu poder sem admitirem questionamento.
Existem mais de cem fatores que determinam a saúde de umha pessoa e é muito grave que sempre os limitemos a dous: como comemos e como nos movemos. Dentro destes fatores, unicamente 36% corresponde ao comportamento individual e neles incluem-se a saúde mental, o otimismo, os padrons de sono, o consumo de álcool e drogas, o movimento, a alimentaçom, a saúde sexual… 22% tem a ver com a genética e a biologia: estrutura corporal, densidade óssea, pressom arterial, força, funçom sensorial, sexo… 24% corresponde às circunstâncias sociais: identidade de género, orientaçom sexual, etnia, classe social, trabalho, cultura e tradiçom, desenvolvimento e educaçom, discriminaçom, conexons sociais… 11% corresponde ao cuidado médico, isto é, atençom primária, atençom individualizada e de qualidade à pessoa doente, acesso a atençom sanitária, conhecimentos profissionais… e, por último, 11% corresponde ao ambiente: contaminaçom, qualidade de vida, localizaçom etc.
“Existem mais de cem fatores que determinam a saúde de umha pessoa e é muito grave que sempre os limitemos a dous: como comemos e como nos movemos”
Eu sempre digo que tudo isto vai em nome da saúde, sim, mas na verdade a minha saúde importa unicamente à minha família, o meu par e as minhas amizades mais próximas. De resto, ninguém se preocupa com a saúde: unicamente é incomodado polo meu corpo, pola existência de pessoas que decidem amar-se num corpo gordo. Vimos em tamanhos e formas diferentes e em cada umha delas pode existir saúde, desde que entendamos a saúde como um todo em que intervenhem muitos fatores e que, na maioria das vezes, nom tenhem nada a ver com o peso.
Na tua experiência em palestras nos liceus, quais som as ideias no relativo à gordofobia e a cultura de dieta nas adolescentes galegas? Observas diferenças geracionais?
Penso que ainda seguem a ser conceitos mui pouco estendidos. Na maioria dos obradoiros ninguém sabe o que é a cultura da dieta, porque no seu imaginário a única forma de se cuidar é restringir, compensar, nom comer demais, isto é, os fundamentos da cultura da dieta. Qualquer outra forma de discurso cria resistência. Porém, a gordofobia é um conceito mais ou menos conhecido; sem muitos matizes, mas entendem em que se fundamenta.
Considero que as adolescentes galegas enfrentam um repto brutal, porque, ainda que o movimento anti-gordofóbico está tomando cada vez mais força, também estám imersas no culto à imagem das redes sociais, que exigem estarmos perfeitas; também há muita mais acessibilidade a reptos com condutas muito perigosas e, ante tudo isto, o imaginário coletivo continua a ser o mesmo: o único corpo válido é o magro. Falta representaçom, educaçom, informaçom… É urgente o professorado e as famílias terem conhecimento nom enviesado.

Podes falar-nos um bocado sobre o festival Y se a®mó la gorda que impulsaste em Vigo? Que atividades se desenvolvêrom? Qual foi o perfil das pessoas participantes?
Y se a®mó la gorda foi um pequeno sonho. Foi um espaço seguro em que habitar os nossos corpos partindo do amor; um espaço de formaçom mas também de celebraçom, em que os nossos corpos e nós éramos o centro. Queria criar umha comunidade forte na Galiza para poder berrar, denunciar e celebrar que existimos e que temos direito a existirmos em paz, a vontade com o que somos e o corpo que temos; queria criar rede e a verdade é que ainda nom consigo descrever com palavras o que se gerou ali.
Desenvolvêrom-se atividades de formaçom com grandes ativistas do feminismo gordo a nível estatal, sobre gordofobia, amor próprio, a construçom de umha relaçom saudável com o corpo… Houvo conversas, concertos, recitais de poesia, DJs, açons na rua, mercado de roupa, atividades de fotografia, biodança… Penso que o mais bonito foi o clima que se formou, porque vinhêrom pessoas mui diversas: gordas, magras, discas, racializadas, pessoas idosas, crianças, adolescentes, pessoas involucradas no assunto e outras que ouviram algumha cousa mas nom tinham claro de que se tratava… Foi brutal, honestamente.
“A principal motivaçom para criar Outro Conto foi dar um giro completo ao conceito de comida saudável e lutar contra a cultura da dieta; converter o ato de comer num autêntico ato de auto-cuidado”
Por último, qual é a motivaçom do serviço de reparto semanal de comida que levades em Outro Conto?
Acho que a principal motivaçom foi dar um giro completo ao conceito de comida saudável e lutar contra a cultura da dieta; converter o ato de comer num autêntico ato de auto-cuidado. A nai de Isaac enfermou e tivo que mudar os seus hábitos e Isaac começou a cozinhar e a investigar sobre como influía em nós também o modo em que comíamos e a nossa saúde mental. Neste processo eu, que estivem de dieta toda a minha vida, descobrim um modo diferente de comer, aprendim a ver a comida como umha cousa a desfrutar sem culpa.
Cada vez que alguém fai umha encomenda a Outro Conto, entra num grupo de Telegram chamado “Diet Riots” em que partilho meditaçons para comer de forma consciente, os princípios da alimentaçom intuitiva, informaçom e exercícios para identificar o dano que fam as dietas, conteúdos sobre diversidade e respeito ao corpo… Isaac por sua vez partilha cozinha consciente, receitas simples para o dia a dia, tips de cozinha… Nom é apenas comida: Outro Conto é comunidade e luta.