
Arantxa Tirado é politóloga e doutora em Relaçons Internacionais pola Universidade Autónoma de Barcelona (UAB) com umha tese sobre ‘A política exterior da Venezuela durante a presidência de Hugo Chavez’. Também é doutora em Estudos Latinoamericanos pola Universidade Nacional Autónoma de México (UNAM). Residiu mais de 11 anos em vários países da América Latina, principalmente no México e na Venezuela, com estadias em Cuba. Em março visitou Vigo por intermédio da Asociación de Amizade Galego-Cubana Francisco Villamil e da Asociación Galega Bolivariana Hugo Chávez (AGABO).
Os meios dedicárom durante anos milhares de horas de rádio e televisom, e páginas e páginas de jornais, a mentir e manipular sobre Cuba, a Venezuela, o Equador, o Brasil, e outros países da América Latina. Neste momento desceu muito a intensidade destas campanhas, qual é a situaçom agora na América Latina?
Sempre há manipulaçom e distorçom a respeito da realidade da América Latina e do Caribe, especialmente quando chega ao governo algumha força da esquerda, pois, de repente, esses países recebem umha atençom mediática excecional. Multiplicam-se as notícias negativas ou tendenciosas em funçom das conjunturas políticas internas em cada caso e dos movi entos da geopolítica mundial. Na atualidade, desceu a campanha contra alguns países, mas cresceu a pressom em outros. Por exemplo, a Venezuela deixou de protagonizar tantas notícias negativas quando os EUA decidírom pôr fim ao experimento do “governo paralelo” de Guaidó e melhorar as suas relaçons com o governo da Venezuela, para que as suas empresas pudessem comerciar com o petróleo venezuelano num contexto de disputa energética pola guerra na Ucrânia. Porém, o México, que tem pola primeira vez em décadas um presidente progressista disposto a gerir os recursos mexicanos –como o lítio– de maneira soberana, recebe mais atençom mediática sobre problemas que antes nom interessavam tanto, junto a um aberto questionamento das decisons do López Obrador por parte da imprensa.
“O ‘lawfare’ pode qualificar-se de golpista pois aplica-se com a finalidade de provocar um câmbio de regime favorável aos interesses dos EUA”
Que é o ‘lawfare’ e que papel joga nesta situaçom?
Em termos gerais, o lawfare ou guerra judicial é umha tática bélica através da qual se combatem os inimigos políticos nos tribunais ou fazendo um uso da lei, em sentido amplo. O seu propósito é conseguir por métodos teoricamente legais um mesmo objetivo estratégico, isto é, acabar com os governos da esquerda na América Latina. É umha nova modalidade que se pode qualificar de golpista pois aplicase com a finalidade de provocar um câmbio de regime favorável aos interesses dos EUA. Para lográ-lo serve-se de leis, juízes, tribunais e, aliás, duns meios de comunicaçom imprescindíveis para realizar campanhas de desprestígio necessárias para convencer a opiniom pública da culpabilidade a priori das vítimas do lawfare.
Pensas que a irrupçom dessas novas formas de golpismo estám a enmascarar a “clássica” repressom que vem dos tempos da Operaçom Condor, que nunca cessou?
Sim, sem qualquer dúvida. Após décadas mui duras de repressom aberta, com práticas de golpes de estado militares, com magnicídios, desapariçom de dezenas de milhares de militantes e um prático extermínio da esquerda, os povos tenhem memória e os golpistas devem ser mais subtis à hora de desestabilizar os processos de transformaçom social. Esta modificaçom também tem a ver com a irrupçom da opiniom pública mundial como ator internacional, e as necessárias transformaçons da guerra e da contrainsurgência para seduzir essa opiniom pública que, em tempos das redes sociais, tem mais capacidade de incidência nos assuntos globais. Ainda que, paradoxalmente, também se usem essas mesmas redes sociais para tratar de manipular a opiniom pública e assentar a construçom mediática das mentiras necessárias para justificar o golpismo, seja em forma de lawfare ou de outro tipo.
Que papel jogam atualmente a Europa, os EEUU e as suas multinacionais no espólio dos recursos destes países e como influem nas políticas internas e na repressom?
Um papel protagonista em muitos casos, pois som os grandes beneficiados polos câmbios de governo. Quando se aparta da vida política mandatários como Rafael Correa, Lula da Silva ou Cristina Fernández busca-se sacar do jogo político líderes que querem explorar os recursos dos seus países de maneira soberana, quer seja através de empresas nacionais, quer seja decidindo ampliar concessons a empresas de terceiros países nom ocidentais e inimigos para os EUA (a China, o Irám, a Rússia e outros). Este tema é fundamental para entender a política na América Latina e a geopolítica mundial. Encontramos-nos num momento em que as grandes potências estám numha escalada de confrontaçom polo controlo de recursos naturais e minerais, a maior parte finitos, imprescindíveis para o desenvolvimento das suas respetivas economias e para posicionarem-se num sistema internacional em transiçom geopolítica. Umha disputa que se dá também no âmbito energético. Muitos destes recursos estám na América Latina, nom esqueçamos, o qual coloca a regiom no centro da disputa geopolítica.
Estás a trabalhar em algum novo projeto?
Sim, tenho em mente um novo livro que quero começar a escrever neste ano e que aguardo saia no início de 2024. Também me vou introduzir numha investigaçom sobre como se aplicou o lawfare no Estado espanhol, especialmente focado no caso do combate ao independentismo catalám.