“Conciliar é o nosso direito a adequar as condiçons da nossa jornada ainda que a empresa jogue a enfrentar as trabalhadoras”, sustém Raquel Lema, secretaria geral das mulheres da CUT e ex-presidenta do comité de empresa da CRTVG. A advogada e militante feminista Sandra Garrido critica que “todo o mundo tem claro como nom cortar um dedo mas nom como evitar o acosso” já que “num mundo masculino como o das empresas, só se valoram os riscos físicos”. Marga Corral, secretaria geral das mulheres da CIG, dixo com firmeza que “os problemas das mulheres trabalhadoras nom se estám a coletivizar” e que a cumplicidade também se agacha no silêncio.
Nos últimos meses ditárom-se em Galiza duas sentenças mui importantes para as trabalhadoras. Numha, o Julgado do Social da Corunha condenava o Corte Inglés por acosso sexual e moral contra umha empregada, um caso levado pola advogada Sandra Garrido com a força do sindicato CIG. Que precedente criam estas sentenças no âmbito jurídico e social?
Sandra Garrido: Começam a dar-se sentenças condenatórias graças ao trabalho de consciencializaçom realizado polas trabalhadoras, feministas e sindicalistas do que as juízas tenhem que fazer-se eco. As advogadas tenhem um enorme trabalho porque a igualdade de armas da que fala a justiça nom existe, trata-se dumha empresa contra umha pessoa. A informaçom dada das luitas está a conseguir estas condenas já que o acosso existe desde que começou o trabalho.
O outro caso, que impulsou a Central Unitaria de Traballadoras/es, conseguiu que o Tribunal Superior de Justiça de Galiza condenasse a CRTVG por vulnerar o direito à igualdade das mulheres trás negar-lhe a conciliaçom laboral e familiar a umha trabalhadora usando um parte médico da mutua na sua contra. Como se entende o direito a conciliar nesta entidade pública?
Raquel Lema: Na CRTVG vemos a diário como a empresa joga a enfrentar as trabalhadoras para que creiamos que conciliar nom é um direito na pirâmide ética. Querem confrontá-lo a outros direitos como o do horário estável e essa batalha está‑a ganhando a empresa. Cumpre desenharmos umha estratégia para consciencializar sobre a importância do direito da conciliaçom frente outros.
Marga Corral: Na CIG temos o caso da trabalhadora Nélida Pisco. A empresa Edagasa, num intento de apropriar-se do feminismo, usava‑a por ser a primeira mulher em conduzir um ónibus urbano. Mas Nélida foi mae e quixo compatibilizar o seu trabalho com o cuidado da sua filha que tem problemas médicos. Nesse momento deixou de ser sujeito de desejo a nascer o acosso contra ela.
Tem sentenças ao seu favor mas a persecuçom continua. Como dixo Raquel, a empresa usa as demais trabalhadoras para atormentar e fomentar um clima de trabalho hostil. Se de verdade tivéssemos umha consciência de classe nom haveria esse acosso por exigir o teu direito a conciliaçom.
Sandra: Ambas sentenças derivam dumha valentia do tribunal. Lastimosamente, a maioria das mulheres do mundo judicial ainda som mui cúmplices do patriarcado e as que nom o som apenas chegam ao posto de juízas. Qualquer pessoa que reivindique a dignidade é demonizada. Mas estas duas sentenças sim criam um bom precedente no âmbito social e psicossocial.
“As empresas som um mundo masculino que valoram os riscos físicos mas nom os psicossociais”
Como sentárom ambas sentenças nos centros?
Sandra: A denúncia por acosso da empregada do Corte Inglés sacou muitos mais casos a luz e mesmo mais graves que o seu. Topamos acosso sexual e laboral noutros centros do Corte Inglés até o ponto em que descobrimos que a empresa, em si mesma, fomenta essa situaçom. As empresas som um mundo masculino que valoram os riscos físicos mas nom os psicossociais. Todo o mundo tem claro como nom cortar um dedo mas nom como evitar o acosso.
Marga: Valorar o acosso inicialmente é complicado. Se cortaste um pé sabes onde e como foi.
Sandra: Por isso é tam necessária a formaçom sanitária e jurídica neste âmbito. Valorar um testemunho requer de formaçom porque a pessoa atravessa um trauma trás os abusos sofridos.
Raquel: Na CRTVG, a sentença foi pedagógica. O caso perdera-se ao primeiro porque a empresa presentou um informe de saúde da trabalhadora cedido pola mutua e usou-no no juízo para negar-lhe a conciliaçom. Graças à sentença sabemos que a empresa só pode rejeitar a conciliaçom por um único motivo, a alteraçom na produçom da empresa. Ao mesmo tempo, ganhar o caso no TSXG foi umha vitória contra a mutua e umha visibilizaçom do trabalho mercenário que fam.
Marga: No caso de Nélida também se filtrou um informe médico confidencial que provocou o seu despedimento. Som cúmplices da empresa.
Raquel: Usar as mutuas para vulnerar os direitos das trabalhadoras é gravíssimo. Resulta-me aberrante que umha empresa pública como a CRTVG recorra esta sentença de conciliaçom ao Tribunal Supremo.
Marga: Denega-se o direito à conciliaçom por sistema porque nom querem mulheres trabalhadoras em ativo. Inspeçom de Trabalho, outro cúmplice habitual.
Na hora de denunciar os abusos laborais contra as trabalhadoras há muitos obstáculos, sobretodo na recoleçom de provas. Mas ao mesmo tempo, estes tipo de casos habituam focalizar a luita nos julgados e nom na açom sindical. Por que sucede isto?
Marga: Nom existe umha coletivizaçom dos problemas laborais que sofrem as mulheres trabalhadoras. Há outro nível de consciência. A cumplicidade também é o silêncio das companheiras e as mulheres sindicalistas ainda somos umha minoria. Por isso tratamos de que saia adiante no julgado.
“Se de verdade tivéssemos umha consciência de classe nom haveria esse acosso por exigir o teu direito a conciliaçom”
Raquel: Há poucas mulheres nos comités de empresa e nom se fai a mesma força ao redor do direito de conciliaçom que no resto. Inclusive toleramos que se negocie com a conciliaçom e haveria que examinar detidamente todas as causas disto.
Sandra: Os sindicatos som organizaçons patriarcais.
Marga: Tenhem mais responsabilidade outros organismos mas devemos fazer autocrítica e assumir essa responsabilidade.
Sandra: Um sistema desigual sempre gera maltrato seja numha organizaçom sindical, nas instituiçons, numha empresa… E as primeiras em sofrer o maltrato somos as últimas, as mulheres.
Marga: A precarizaçom fai que aguentes mais por menos e muitas pessoas nom demandam. Existe tanto medo a perder o trabalho ou ver-se prejudicada que acodem ao sindicato para informar-se mas nom para denunciar. A reforma laboral aplacou a classe trabalhadora.
Sandra: Foi direta a botar as mulheres. O acosso maternal criou-se para que as maes marchem do mundo laboral.
Raquel: Com todos os retrocessos e reformas, acabou-se instaurando a jornada irregular e incompatível com a construçom da conciliaçom.
Existe a conciliaçom dentro dos próprios sindicatos?
Raquel: Nom, nom existe nem por parte dos companheiros nem por parte dalgumhas companheiras. As reunions às oito ou nove da noite fam-no impossível e acabas sacrificando. Na minha vida sacrifico muito, muito, para dar-lhe ao sindicato.
Marga: Concordo com Raquel, estamos numha organizaçom patriarcal e acabas reproduzindo‑o. Tenho três crianças e vivo a 50 quilómetros de onde trabalho. Sacrifico tempo, a minha família e a mim mesma. Também levo doze anos trabalhando no sindicato e vejo certa mudança nos homens que passárom de ser os patriarcas a pessoas que vam socializando com as companheiras. Também resulta mais fácil defender a conciliaçom no trabalho que na militância.
"Levar a criança a umha reuniom nom é conciliar"
Raquel: Nós mesmas temos trabalho que realizar. Diziam-me: trái a nena à junta quando era lactante mas era impossível, ti nom és capaz de prestar atençom ao encontro. Acabei sentindo-me como umha floreira.
Marga: Sim, é impossível.
Raquel: É umha frivolidade dizer que leve a nena porque isso nom é conciliaçom. As crianças nom podem chapar-se essas reunions e buscar umha alternativa, é responsabilidade nossa.
Sandra: Da minha ótica externa, nom é difícil pôr um jardim de infância quando crias trabalho sindical. Mas no dia a dia nom é umha prioridade, segue falhando essa consciência e isso repercute na luita.
Considerades que a secretaria de mulheres dos sindicatos deveria ter mais pontos de encontro?
Sandra: Há sinergias. Estar unidas na luita sindical também tem que ver com a vida e a química existente entre nós como feministas e protetoras dos direitos fundamentais.
Raquel: É importante tecer redes entre nós e desde as nossas diferenças.
Sandra: Necessitam-se muitas heroicidades para criar os referentes. Na CIG e na CUT verám-se as vitórias sindicais mas detrás há muita luita de pessoas com nomes concretos que se deixam a pele nelas.
“Nom se oferta a vitória senom a peleja e na peleja está a dignidade”
Marga: Os nossos direitos como trabalhadoras devem-se às mulheres que dixerom “ata aqui!”. Estou a favor da unidade mas nom da uniformidade. Topamo-nos para fins comuns mas das nossas respetivas estratégias. A luita das mulheres é por serem feministas, tenhas ou nom o licença. Precisamos dessas mulheres que se revelam contra o poder estabelecido. Umha mulher pusilânime nom fai nada, precisamo-las rabudas.
Sandra: Houvo empoderamento das trabalhadoras mas também nosso.
Marga: O enroupo, a sororidade e o calor das mulheres.
Sandra: Nom se oferta a vitória senom a peleja. E na peleja está a dignidade.