Nas semanas passadas, o povo galego levou adiante dúzias de mobilizaçons para exigir, no imediato, o fim da agressom sionista contra a Palestina e, além disso, umha política decidida e direta contra o criminal estado de Israel. O manifesto lido em trinta e duas vilas e cidades do país terminava com um apelo direto a exigir «a instituiçons e empresas que cessem os seus contratos e colaboraçons com entidades israelitas» e a premer «a comunidade internacional para que deixe dumha vez de expressar consternaçon e imponha sançons coletivas contra Israel». Um pronunciamento que ia um passo além de lamentar e denunciar os crimes sistemáticos do sionismo e do imperialismo para exigir açons concretas de boicote, desinvestimentos e sançons (BDS) a quem, em casa, tece relaçons com entidades sionistas e, deste modo, normaliza o apartheid e os seus crimes.
Mas as mobilizaçons nom tivérom lugar apenas na Galiza. O povo galego aderiu com dinámica própria e nacional a outros centos de convocatórias por todo o planeta, que incluíam os lugares habituais, mas também manifestaçons maciças no coraçom das potências imperialistas e dos seus aliados: de Washington a Ancara; de Londres a Riade; de Paris a Rabat. Mesmo em Doa, o governo catarense que proíbe qualquer reuniom política, viu-se obrigado a autorizar pola primeira vez os protestos contra a barbárie sionista. E isto em meio a umha calculada política de aproximaçons diplomáticas entre os governos reacionários árabes e Israel, promovidas polos Estados Unidos.
Em Doa, o governo catarense que proíbe qualquer reuniom política, viu-se obrigado a autorizar pola primeira vez os protestos contra a barbárie sionista
Mas este nível de mobilizaçom, que deixou a chamada «comunidade internacional» muito atrás na sua política de se limitar a expressar consternaçom pola violência, nom foi o único de novo. Na realidade, em relaçom a outras ocasions em que Israel atacou Gaza e Cisjordánia de maneira brutal e saímos às ruas para protestar, a situaçom atual na Palestina está repleta de novidades que convém ter em conta e que apresentam um panorama diferente o suficiente como para analisarmos a situaçom com certo otimismo.
A começar pola unidade da resistência palestiniana. Por mais que os meios imperialistas teimem em apresentar a agressom sionista e a defesa palestiniana como umha guerra entre Israel e Hamas — lembrando sempre que Hamas é umha organizaçom islámica, à procura de invocar os receios ocidentais pola questom religiosa ou querendo apresentar as partes como equivalentes ou mais ou menos igualadas —, o certo é que a Palestina nom é só Hamas. E isto é chave. Hoje existe um quartel geral da resistência, onde estám representadas e a colaborar abertamente todas as forças palestinianas que rejeitam de maneira clara a ocupaçom: de Hamas à Frente Popular para a Libertaçom da Palestina, passando pola Frente Democrática, os Comités de Resistência Popular e o Movimento da Jiade Islámica da Palestina. Apenas al-Fatah fica fora, enquanto a sua direçom, cada vez mais encurralada, continua a jogar a carta possibilista do colaboracionismo. A unidade de açom da resistência é umha novidade significativa, mas também o é que essa direçom da direita que se agrupou ao calor dos interesseiros acordos de Madrid e Oslo e que ocupa a Autoridade Nacional Palestiniana — as últimas eleiçons legislativas fôrom hai quinze anos — é cada vez menos representativa e tem cada vez menos apoio popular. Justo o contrário do que acontece com os braços armados da resistência, que estám hoje melhor equipados, mais treinados e melhor coordenados do que nunca.
Hoje existe um quartel geral da resistência, onde estám representadas e a colaborar abertamente todas as forças palestinianas que rejeitam de maneira clara a ocupaçom. Apenas al-Fatah fica fora
Outro aspeto novo é o muito maior envolvimento da populaçom palestiniano nos Territórios Ocupados: os chamados palestinianos do 48. Nom é por acaso que o último pico do conflito tenha deflagrado justamente por um intento de Israel de despejar um grupo de famílias palestinianas no bairro árabe de Sheikh Jarrah, em Jerusalém Leste — famílias que, aliás, já foram expulsas do bairro de Talbiyah em 1948. Este tipo de expulsons estám a deixar claro para os e as palestinianas que aceitarem o estado de Israel nom é qualquer garantia, e que o que procura o sionismo nom é espaço para os judeus viverem em paz, mas um lebensraum exclusivo e homogéneo onde o diferente nom cabe e tem que ser banido. Incluídos eles e elas, a quem o mundo insiste em chamar árabes-israelitas no canto e palestinianos ou palestinianas. Nom esqueçamos que fôrom as suas manifestaçons contra estes despejos, começadas em Maio, que levárom Israel a responder com umha escalada de violência que durou onze dias. Umha violência que Tel Aviv procurava por questons puramente internas, mas cuja origem, à margem de Gaza e Cisjordánia, nom deixa de representar um novo vetor a considerar.
Também é novo o grau de envolvimento dos países árabes e muçulmanos da regiom. É verdade que a questom palestiniana tem sido, historicamente, umha questom nacional para muitos dos países vizinhos. Mas décadas de apoio a Israel por parte das potências imperialistas (sem fissuras), de cooptaçom lenta das elites árabes (principalmente nas petromonarquias da Península Arábica, Jordánia, Marrocos ou até o Egito), e de agressom e debilitamento dos aliados palestinianos mais fiéis (a resistência libanesa, a Síria, o Iraque, o Irám ou até a Líbia) tinham dado um cenário onde a «questom palestiniana» na regiom arrefecera de maneira drástica. Contodo, em 2021, na sequência da guerra imperialista na Síria e da derrota (ainda nom definitiva) do Ocidente e dos seus proxies, a maioria desses países e forças estám hoje numha situaçom objetivamente melhor. E isso significa umha maior capacidade para ajudar as forças da resistência palestiniana. No resto da regiom, como foi dito, a populaçom reagiu ao devalo colocando mais umha vez a questom palestiniana no centro da mesa. Até os governos do Líbano e Jordánia tivérom que ver grandes contingentes da sua própria populaçom a tentarem passar as fronteiras com os Territórios Ocupados para defender a Palestina. É certo que o exército israelita conseguiu deter a «invasom», matando várias daquelas pessoas que empurravam nos muros da fronteira, mas também é certo que nom se viam imagens assim desde 1967.
Por último, interessa também notar a maior debilidade de Israel, nom só quanto aos apoios internacionais, como também no plano doméstico. No que di a respeito dos apoios, nom cabe dúvida de que a derrota eleitoral de Donald Trump nos Estados Unidos é um problema para as elites sionistas. E nom porque a administraçom Biden seja menos pró-sionista que a anterior. Mas o certo é que, por enquanto, e mesmo que seja por interesses internos, a sua política atual em relaçom a Israel é bem menos incendiária do que na época Trump. E o mesmo pode ser dito em relaçom à Uniom Europeia, que para já quer evitar, seja como for, um confronto maior com o Irám e os seus eventuais apoios russo e chinês.
Mas o mais interessante desta debilidade israelita é no plano interno. Israel atravessa um período de forte crise política, e a saída de um Netanyahu cercado pola corrupçom do seu governo nom a apazigua. Antes ao contrário. O novo governo de Israel — umha coligaçom mais unida contra o Likud do que para efetivar qualquer programa conjunto — representa mais instabilidade e umha fuga para a frente tanto na guerra contra Palestina quanto na repressom interna dos conflitos domésticos, que também existem. Ademais, ao contrário de agressons anteriores, nas quais víamos colonos comodamente sentados nos terraços a celebrar os bombardeamentos sobre a Faixa de Gaza como se se tratassem de um espetáculo pirotécnico, desta vez, o terror nom foi sentido só na Palestina. A Cúpula de Ferro de que Israel tanto presume nom conseguiu parar todos os mísseis caseiros lançados de Gaza nem toda a resposta da Cisjordánia, que chegou a lugares tam afastados como Haifa. O resultado é umha crescente desafeiçom dos colonos face ao seu governo e face à própria ideia de Israel. E isto também é novo. Inquéritos internos entre grupos de russos-israelitas (à volta de 1 milhom de pessoas) apontam que até 30% consideram a opçom de abandonar o país, e nas redes sociais multiplicam-se os chamados aos novos colonos para cancelarem a sua viagem a Israel.
Numha das suas últimas medidas, o governo de Netanyahu deu luz verde ao estabelecimento de novos colonatos na Cisjordánia –umha prática que antes decorria à socapa e agora se quer fazer à luz do dia
Nom cabe dúvida de que a situaçom na Palestina é complexa. E estas mudanças nom significam que Israel nom esteja a progredir na sua guerra de ocupaçom. Numha das suas últimas medidas, o governo de Netanyahu deu luz verde ao estabelecimento de novos colonatos na Cisjordánia — umha prática que antes decorria à socapa e agora se quer fazer à luz do dia, confiando em que nom haverá consequências. E nada aponta a que o novo governo Bennett-Lapid vá mudar de rumo. Antes ao contrário. Mas, mesmo assim, som mudanças importantes no cenário dumha lenta guerra que já passou por momentos piores para a Palestina. Nos olhos da resistência, a esperança brilha com mais intensidade do que em muitos anos, e das suas bocas abrolha um chamado à paciência e à determinaçom: «a Argélia estivo sob domínio francês 132 anos. Nós estamos há 73 debaixo da bota de Israel. Somos pacientes, mas estamos decididos».