Resulta difícil falar de Sopas New Campbell, o último romance de Teresa Moure, sem desvendar nengumha das suas muitas surpresas. Finalista em 2017 do Premio Antón Risco de Literatura Fantástica, o romance aparece em 2020 na editora Cuarto de Inverno. O facto de os textos deste prémio, aberto a propostas “en galego e en portugués”, serem publicados por Urco Editora, pode explicar que o romance tenha sido resgatado polo projeto de David Cortizo e Andrea Jamardo, que trabalharam previamente na editora especializada em literatura fantástica. A mençom finalista a este texto soma-se aos quinze prémios recebidos pola professora da USC, catorze dos quais foram entregues previamente à sua viragem reintegracionista em 2013.
A pandemia e o modelo de trabalho a pequena escala de Cuarto de Inverno marcárom a modesta receçom do livro, que, porém, foi recomendado por alguns dos críticos de literatura galega mais ativos. Sopas New Campbell é um texto breve, com altas doses de humor e ironia, marcado por um denso universo metafórico e constantes referências à literatura de diferentes tradiçons. De facto, é frequente as digressons ganharem o pulso à acçom narrativa; o emprego da primeira persoa e a forma do diário, que vamos intuindo a medida que lemos, explicam esta tendência.
A premissa inicial do texto enxerta com o chamado “realismo mágico” identificado noutras obras da autora: a protagonista da história, Nádia, começa a descobrir elefantes no seu armário. Quando compreende que os paquidermes se nutrem da culpa, controla os seus sentimentos até fazer emagrecer os animais, para depois exterminá-los. Finalmente, a mulher acaba por fazer do extermínio de elefantes a sua profissom. Contudo, há um inconveniente: como se desfazer da carne dos enormes animais? É na resoluçom deste problema que som tecidas todas as redes persoais da história, cuja complexidade só pode ser compreendida quando se chegar ao final do relato.
‘Sopas New Campbell’, o último romance de Teresa Moure editado por Cuarto de Inverno, é um texto breve, com altas doses de humor e ironia, marcado por um denso universo metafórico e constantes referências à literatura de diferentes tradiçons
Além da complexidade de linhas argumentais, som também intricadas as relaçons intertextuais dentro da obra da própria Moure: a protagonista, Nádia, está intimamente ligada com Ana Brower, a também protagonista do romance Um elefante no armário (Através Editora, 2017) e é o heterónimo sob o qual Moure publica com Chan da Pólvora a plaquette Nãotenhoculpa de viver (2017). Aliás, a personagem de Ana Brower aparece já em A intervención (Xerais, 2010), marcando umha longa genealogia na obra da autora monfortina.
Igual de complexas –e até desconcertantes– som as possíveis interpretaçons do texto: como a própria autora tem indicado, existe a possibilidade de ver em Sopas New Campbell umha reflexom sobre a saúde mental na nossa sociedade; existe, aliás, a oportunidade de ver um jogo que testa a elasticidade dos limites entre fantasia e realidade. Também podemos ver nos elefantes crescentes a ameaça de ideologias supostamente superadas, alentadas pola pressom de grupo e o desclassamento. Por último, o epílogo permite entrever um irónico comentário sobre o estándar ou, até, sobre a evoluçom da receçom da obra da autora: as sopas Campbell eram “um dos poucos produtos a beneficiar de uma campanha de publicidade maciça –quer dizer, de uma narrativa capaz de modificar os hábitos de consumo […]”. Contudo, “ninguém se lembra já do tomate. Se no século XXI se fizesse alguma modificação importante na forma de cozinhar essa sopa […] o menos relevante seria que contivesse um ingrediente surpreendente ou exótico”. Como, por exemplo, os elefantes que seguem à solta pola cidade, para quem os quiger ver