Desde há alguns meses, a artista Carla Souto (A Corunha, 1994) mora na aldeia de Loureiro, no concelho de Nogueira de Ramuim, onde tem estado a tratar de um projeto a partir das leiras da família materna.
Estudaste o grau em Belas Artes, tendo-te especializado em escultura. Quando resolveste tomar este caminho?
Desde pequena que os meus pais potenciárom as minhas aptidons artísticas. Até que cheguei à carreira, aquilo que tinha trabalhado mais tinha sido a pintura. Quando terminei apercebim-me de que precisava aprender das técnicas escultóricas, tomar mais consciência da tridimensionalidade, assim como da perceçom do meu próprio corpo e as possibilidades dos materiais.
Em vários projetos (‘Obstetra: que cuida’, ‘Muller ou árbore’, 2017) apontas para a desconexom das pessoas em relaçom à natureza e exploras a relaçom entre esta e o corpo.
Nom tanto das pessoas, mas da relaçom da mulher com a natureza. Quando realizei estas séries de obras estava a começar a investigar sobre este nexo. Agora, com perspetiva, julgo serem uns trabalhos com um certo tom essencialista, onde som comparadas a mulher e a natureza como criadoras de vida. Para além deste vínculo, intento apreciar e desexualizar as formas corporais femininas equiparando-as com a organicidade das formas do ambiente natural. Quero pensar que este interesse começou por umha necessidade de procurar umha conexom pessoal com o meio e por umha escassez de contato com a natureza.
Em ‘Conquistar Montañas’ (2018) acrescentas umha denúncia sobre a propriedade e exploraçom da terra.
Sim. Quando dei polo absurdo de que um só indivíduo possa ser dono de umha montanha e explorá-la é que me apercebim da necessidade de abordar esta questom. Conquistar Montañas fala da paisagem, do espaço natural e urbano, ao tempo que propóm umha reflexom crítica sobre a posse da terra. Para isto, dediquei-me a conquistar montanhas criadas polo ser humano, que depois seriam recolhidas por ele mesmo, e colocava-me acima delas com solenidade para enfatizar o facto de terem sido tomadas por mim. Esta conquista nom envolvia qualquer tipo de resistência. A partir disto, perguntava-me como podíamos identificar a pertença desse local e em que medida somos «donos» de um espaço. A partir de um registo fotográfico, mostro açons efémeras que perduram apenas na documentaçom.
Feminista ou ecologista som adjetivos que tenham a ver com a tua obra?
Talvez se trate de práticas e ideologias cada vez mais presentes, e com mais força, na minha vida e, portanto, na minha obra.
Atualmente trabalhas nas leiras que pertencérom à túa avó, hoje à tua mae, um projeto com umha forte carga emocional. Como é que surge e como se foi desenvolvendo?
Surge depois do projeto Conquistar Montañas. A partir das dúvidas antes mencionadas, percebim que nalgum momento iria ser dona real dalgumhas terras. Apercebim-me de toda a história que tem Galiza de resistência e luita dos labregos polos direitos sobre a terra e comparei-na com o momento atual, em que a minha geraçom e já algumhas anteriores mostram estarem desvinculadas da terra, dos cuidados e responsabilidades inerentes. A partir do solo, o nome deste projeto, é umha tomada de consciência sobre a futura posse da terra e as responsabilidades que isto pode trazer.
Como foi a experiência de voltar à aldeia dos veraos da infância? Como mudárom os teus laços com o lugar?
É um lugar que sempre estivo muito presente nos meus propósitos vitais. Ao desenvolver este projeto, tivem que me mudar para poder ter contato direto com as leiras e as suas imediaçons. Tomei assim contato também com a gente e fiquei a saber das desigualdades que sofrem as mulheres do lugar e da necessidade existente de que se estabeleça um diálogo entre todas para podermos evoluir enquanto comunidade.