
Para este ano estám marcados vários processos eleitorais, os primeiros em que os partidos políticos terám a possibilidade legal de tratar dados com as opinions políticas das usuárias de redes sociais para difundir a sua propaganda eleitoral. A recente legislaçom estatal sobre proteçom de dados criou umha exceçom baseada no “interesse público” para que os partidos políticos que se apresentem a umhas eleiçons podam trabalhar com os dados as opinions políticas na rede, umha categoria especial de dados cujo tratamento proíbe o Regulamento Geral de Proteçom de Dados (RGPD) europeu.
Talvez o seu efeito mais visível seja que através das redes sociais ou das aplicaçons de mensagens instantáneas dos dispositivos móveis se receberám sem consentimento prévio comunicaçons dos partidos políticos. Porém, a inclusom de umha rubrica na legislaçom de proteçom de dados deste carácter vem a salientar que a criaçom dessas bases de dados já estám a ser feita, tal como foi desvendado com o escándalo da Cambridge Analytica, a consultoria que empregou dados de milhons de usuárias da rede social Facebook para depois vendê-los à equipa de campanha do atual presidente estadounidense Donald Trump.
Baseado no “interesse público” a nova legislaçom permite o tratamento de dados recolhidos nas redes sociais para fins eleitorais
Um artigo polémico
A Lei Orgánica de Proteçom de Dados Pessoais, que entrou em vigor no passado 7 de dezembro, modificou a Lei Orgánica do Regime Eleitoral Geral (LOREG), introduzindo neste texto um artigo 58 bis, com o título ‘Utilizaçom de meios tecnológicos e dados pessoais nas atividades eleitorais’. No seu primeiro ponto estabelece-se que “a recompilaçom de dados pessoais relativos às opinions políticas das pessoas que levem a cabo os partidos políticos no quadro das suas atividades eleitorais encontrá-se amparada no interesse público unicamente quando se ofereçam as garantias adequadas”. Umha vez realizada esta exceçom passa-se a afirmar no segundo ponto que “os partidos políticos, coaligaçons e agrupaçons eleitorais poderám utilizar dados pessoais obtidos em páginas web e outras fontes de acesso público para a realizaçom de atividades políticas durante o período eleitoral”. Continuando com a consideraçom de que esta atividade de propaganda eleitoral entra dentro do interesse público, o tercerto ponto afirma que “o envio de propaganda eleitoral por meios eletrónicos ou sistemas de mensagens e a contrataçom de propaganda eleitoral em redes sociais ou meios equivalentes nom terám a consideraçom de atividade ou comunicaçom comercial”. Quer dizer, nom precisarám de consentimento prévio por parte da pessoa destinatária. Os dous pontos finais desta lei estabelecem que essas comunicaçom devem identificar de modo destacado a sua natureza eleitoral e se tem que facilitar à pessoa usuária o exercício do seu direito de oposiçom.

A legislaçom de proteçom de dados chegou tarde
O estado espanhol demorou até dezembro deste ano para ter concluída a nova Lei Orgánica de Proteçom de Dados (LOPD) adaptada ao regulamento europeu. No seu apressado procedimento foi incorporada umha emenda, a número 331, cuja modificaçom em comissom parlamentar deu lugar à redaçom da disposiçom final que cria o citado artigo 58 bis da LOREG. O facto de que este artigo nom estivesse no rascunho inicial da lei impediu que a Agência Espanhola de Proteçom de Dados (AEPD) pudesse dar a sua opiniom prévia. Porém, o seu gabinete jurídico sim que emitiu um relatório posterior em que pretende rebaixar os alarmes criados pola modificaçom do regime eleitoral.
Este relatório da AEPD que interpreta o novo texto legal chama a fazer umha interpretaçom restritiva deste artigo, devido ao seu carácter excecional, à sua relaçom com diversos direitos fundamentais e a própria motivaçom que move as novas legislaçons sobre proteçom de dados. Também estabelece que nom se poderám realizar com esses dados sobre opinions políticas campanhas de ‘microtargeting’ nem permite que as mensagens tenham a finalidade de desviar a vontade dos eleitores. No parágrafo em que isto é exposto acrescenta-se que “as modernas técnicas de análise de conduta sobre a base de tratamento massivo de dados e a inteligência artificial, unidas a modalidades de conduta agressivas para com os interessados, poderiam chegar a produzir um efeito pernicioso”. Ou seja, reconhece-se que as atuais técnicas de análise de dados e marketing social já tornam possível a mudança de orientaçom do voto.
Mergulho em perfis públicos
Ainda que da AEPD se pretenda lançar esta mensagem de calma, “o que se permite, é muito”, expom Miguel Garcia, consultor em proteçom de dados e promotor de Bitnós. “Permite-se que os partidos — ou antes os analistas de dados contratados por estes — mergulhem em perfis públicos de redes sociais, comentários em foros da internet, abaixo-assinados, etc… para recompilar a ideologia política das pessoas, e depois as cruzem com outras bases de dados para assim poder dirigir mensagens eleitorais. Isto, na prática, significa que os partidos — e as agências por eles contratadas — manejarám essas bases de dados”.
A AEPD também expom que só poderám tratar-se dados sobre opinions políticas que sejam públicos, assim como estabelece que só poderá realizar-se o tratamento de dados durante o período eleitoral. Antes deste período, permitirá-se realizar as atuaçons necessárias para preparaçom do tratamento a desenvolver durante a campanha, após da qual todos os dados pessoais deverám ser suprimidos.
Pola sua banda, Garcia pom a dúvida sobre se os partidos políticos estám preparados para guardar de jeito seguro esses dados, com o risco de que esta informaçom poda ficar exposta em qualquer momento umha vez criadas essas bases. Este consultor acrescenta que “é de umha ingenuidade enorme que a lei diga que estas cousas só se vam podem fazer em período eleitoral, pois no mundo digital, todo tende a ficar registado e disponível para sempre”. Garcia também apela a nom despreocupar-se por que só se podam tratar dados que já sejam públicos, lembrando que o RGPD “proíbe o tratamento de dados de categorias especiais — como opinions políticas, crenças religiosas, orientaçom sexual…- ainda que já sejam públicos, porque entende que a possibilidade que há hoje de realizar perfis, construir bases de dados e difundi-las pola internet, multiplica o impacto desse tipo de tratamento”.
Miguel garcia, experto em proteçom de dados: “é de umha ingenuidade enorme que a lei diga que estas cousas só se vam podem fazer em período eleitoral, pois no mundo digital, todo tende a ficar registado e disponível para sempre”.
Redes e movimentos sociais
Com a regularizaçom do uso deste tipo de dados nas campanhas eleitorais dá-se mais um passo na consagraçom do que será um elemento principal nas próximas campanhas: os telemóveis com ligaçom à internet ou, melhor, o marketing ligado a estes dispositivos, que permitirá umha liberalizaçom total da propaganda política. “Nestes tempos”, reflexiona Miguel Garcia, “a gente olha cem vezes mais para o telemóvel do que para a TV. E resulta que aií, no mundo da internet e no século do big data, a inteligência artificial e as técnicas avançadíssimas de marketing social, a publicidade política é completamente liberalizada. Vai-se multiplicar por mil o que já acontecia antes: quem tiver mais dinheiro para contratar os melhores publicitários, os melhores analistas ou as melhores bases de dados será quem levará a água ao seu moinho ”.
Para além das questons legais, Garcia também quer alertar para a “importáncia de os movimentos sociais tomarem consciência de cara onde caminhamos, que projetem as tendências que estamos a viver dez anos para a frente e se apercebam do papel que estám a desempenhar as novas tecnologias como ferramentas de controlo político e social. Publicando as nossas vidas e ideologia em plataformas de espionagem como Facebook, estamos a normalizar hábitos e ferramentas de controlo e submetimento da sociedade”. Assim, este consultor conclui que “já há suficientes dados da sua nocividade que cheguem para fazer umha análise estratégica, nom afetada polas urgências e modas do momento, de que som, como funcionam e para que fôrom criadas as redes sociais comerciais”.