Periódico galego de informaçom crítica

Quem vai cuidar de nós agora que nos sabemos vulneráveis?

por
ge­off mcfetridge

Nos úl­ti­mos tem­pos o de­bate dos cui­da­dos, tra­zido po­los fe­mi­nis­mos, pas­sou a de-cen­trar a agenda de mui­tos es­pa­ços que se pre­ten­dem al­ter­na­ti­vos, de es­quer­das e/ou an­ti­ca­pi­ta­lis­tas. No foco já fô­rom pos­tos te­mas como a con­ci­li­a­çom fa­mi­liar, o re­parto de ta­re­fas, o uso dos es­pa­ços e a ne­ces­si­dade de as­su­mirmo-nos vul­ne­rá­veis e co­lo­car as emo­çons no cen­tro. Todas me­di­das ne­ces­sá­rias para adu­bar o ter­reno da igual­dade mas nom de avondo para a enorme ta­refa de co­lo­car as vi­das ‑e nom o ca­pi­tal- no centro.

Ao fa­lar­mos de cui­da­dos nom fa­la­mos só do di­reito a ser cui­da­das, mas tam­bém do di­reito ao auto-cui­dado e do di­reito a nom cui­dar. Partimos da base de que as pos­si­bi­li­da­des para aca­dar e fa­zer uso des­tes di­rei­tos nom som iguais para to­das e, por­tanto, con­ver­tem-se em pri­vi­lé­gios duns frente à pri­va­çom de­les das ou­tras (pri­va­çom que será maior quanto mais baixo seja o tipo de gé­nero, pro­ce­dên­cia, cor da pele ou classe com que cada pes­soa seja lida).

Colocar as vi­das no cen­tro passa ne­ces­sa­ri­a­mente por des­mon­tar um mo­delo de re­la­ci­o­na­mento sus­ten­tado na cen­tra­li­dade do individualismo 

As mais das mu­lhe­res que co­nheço ‒ bran­cas e de classe mé­dia ‒ le­vá­mos anos a lui­tar por­que es­tes di­rei­tos nos se­jam re­co­nhe­ci­dos e, so­bre­tudo, por re­co­nhe­cer-no-los a nós pró­prias (luita para a qual nós te­mos mais pos­si­bi­li­da­des de aceso do que as mu­lhe­res ra­ci­a­li­za­das e/ou de classe baixa). Mas o ba­lanço en­tre es­tes três di­rei­tos é com­plexo, pois se eu te­nho o di­reito a auto-cui­darme e a nom cui­dar, mas a ou­tra tem o di­reito a ser cui­dada: quem cui­dará de quem?

Se hoje mui­tas nos sen­ti­mos cul­pa­das cada vez que de­ci­di­mos nom cui­dar é por­que sa­be­mos que, ao fazê-lo, pe­riga o di­reito da ou­tra a ser cui­dada. Isto evi­den­cia que umha trama sus­ten­tá­vel de cui­da­dos das pes­soas em es­pe­cial es­tado de vul­ne­ra­bi­li­dade está ainda por cons­truir. E tam­bém que o mo­delo de fa­mí­lia nu­clear he­te­ro­pa­tri­ar­cal, que se tra­duz em pri­o­ri­zar re­la­ci­o­na­men­tos de duas a duas, nom avonda para co­brir os cui­da­dos que as vi­das pre­ci­sam para se­rem dignas.

Se a pen­som de meus pais nom dá para irem a um lar de ido­sos, ou se a sua von­tade é en­ve­lhe­cer na casa, como exer­cer da­quela o meu di­reito a nom cui­dar? Quem vai cui­dar das que te­mos en­fer­mi­da­des cró­ni­cas ou de­ge­ne­ra­ti­vas? As nos­sas cri­an­ças? Quem se nom te­mos quar­tos para re­pro­du­zir a ca­deia glo­bal de cui­da­dos, ou se ainda tendo-os, nom que­re­mos re­pro­duzi-la? Quem se nom te­mos pa­re­lha, se vi­ve­mos soas, se es­ta­mos a mi­lha­res de qui­ló­me­tros da casa cui­dando de ou­tras pes­soas para so­bre­vi­ver, quem?

Colocar as vi­das no cen­tro passa ne­ces­sa­ri­a­mente por des­mon­tar um mo­delo de re­la­ci­o­na­mento que nunca pos­si­bi­li­tará a igual­dade por­que está sus­ten­tado na cen­tra­li­dade do in­di­vi­du­a­lismo, do salve-se quem pu­der, do “eu cuido do que é meu”.

O di­fí­cil ba­lanço en­tre o di­reito a ser cui­da­das, o di­reito ao auto cui­dado e o di­reito a nom cui­dar só será pos­sí­vel na cons­tru­çom de umha co­mu­ni­dade am­pla de afe­tos onde cai­ba­mos to­das ‒ e nom só as as­sa­la­ri­a­das, as pen­si­o­nis­tas, as bran­cas, as que som do meu san­gue ou aque­las com que te­nho um re­la­ci­o­na­mento afe­tivo-se­xual. Umha co­mu­ni­dade am­pla de afe­tos onde to­das as vi­das im­por­tem por igual.

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