Nom é fácil abordar umha situaçom tam inesperada e complexa como a pandemia da covid-19, mas nom deixamos de olhar com preocupaçom certas derivaçons que poderiam ser um magnífico caldo de cultura para retornar a períodos pré-democráticos. Nom o podo evitar, umha e outra vez volta-me ao recordo O conto da criada, de Margaret Atwood.
O governo do estado busca legitimar as suas decisons políticas – como a de centralizar a gestom da pandemia – com base em critérios “puramente” técnico-sanitários. Basear as decisons em investigaçons científicas é inteligente, mas a gestom pertence ao ámbito da decisom política; o contrário poderia deslizar-nos cara a estados tecnocráticos. Convém lembrar que o “técnico” tamém é político! Por isso governos como os da Finlándia ou Taiwan abordárom a situaçom de jeito diferente e é positivo que assim seja.
Por outro lado, pôr a “segurança” em primeiro lugar, em detrimento doutros parámetros, leva-nos a normalizar as restriçons, os controlos policiais, a presença do exércitos nas ruas… Até se falava de rastrejar os nossos movimentos através do telemóvel, como na China ou na Coreia do Sul. Nom se trata de que cada qual faga o que quiger em nome dessa “liberdade individual” que defendem os setores conservadores, mas permitir limitar direitos básicos e liberdades sociais – açom própria de estados totalitários – poderia tornar “normal” o pontual e excecional.
Basear as decisons em investigaçons científicas é inteligente, mas a gestom pertence ao ámbito da decisom política e o contrário poderia deslizar-nos cara a estados tecnocráticos.
Além disso, toda esta situaçom esta-nos a conduzir a umha hiper-medicalizaçom da sociedade: hospitalizaçons maciças, UCI, geles hidroalcoólicos, máscaras, luvas, mediçom da temperatura… Portanto, a um controlo do nosso corpo e da nossa saúde por parte do sistema de saúde, sem podermos ter voz própria nem decidir.
Ao mesmo tempo, quase nom se fala de que a degradaçom dos ecossistemas favorece que os vírus cheguem aos seres humanos… De que as partículas de contaminaçom poderiam ser agentes transmissores do coronavírus… De que o derretimento do permafrost no Ártico vai liberar centos de vírus desconhecidos…
Todo isto estamos a vive-lo no afora. E agora que iniciamos o tam esperado desconfinamento, seguem as normas de afastamento para nom contagiar nem contagiar-nos: guardar distáncia e, claro, nom beijar, nom abraçar… Começamos a sentir que as “outras” som perigosas, que o mundo está cheio de ameaças, e algumhas pessoas – tamém crianças – estám com medo de saírem da casa. O afora esta-nos a meter num dinamismo de desconfiança, numha separaçom que nos pode conduzir ao isolamento. E isso, indefetivelmente, gera decaimento e tristura, desesperaçom, e leva-nos a debilitar o nosso sistema imunológico e a ficarmos doentes.
Como nos colocar no afora a partir dumha responsabilidade pessoal que favoreça a segurança de todas e, a um tempo, cultivar no adentro a confiança nas outras, que o mundo é seguro?
Como nos colocar no afora a partir dumha responsabilidade pessoal que favoreça a segurança de todas e, a um tempo, cultivar no adentro a confiança nas outras, que o mundo é seguro? Parecem dous dinamismos em contradiçom e, de facto, som, mas com eles havemos ter de conviver durante um tempo. Precisamos cultivar o adentro a partir de um dinamismo de acougo e lazer: escuitando passeninho o nosso corpo, sustentando com sensibilidade as nossas emoçons, acompanhando-nos sempre com delicadeza. A terra pode ser umha grande aliada para esse “reconectar-nos” com nós mesmas, com as outras e com a Vida a partir de umha nova consciência. Aprender a colaborar com umha natureza em equilíbrio vai ser a melhor garantia contra qualquer “pandemia”.