O paradigma económico dominante que tem ditado as orientações políticas um pouco por todo o mundo está a revelar-se incapaz de lidar com a confluência de crises ambiental, social e económica que vivemos. Pelo menos, no sentido de conseguir conferir, de forma equitativa, níveis razoáveis de qualidade de vida à generalidade das populações, sem comprometer o bem-estar das gerações futuras e a sustentabilidade dos ecossistemas de que dependemos. Os dados e as conclusões de recentes relatórios e estudos internacionais não deixam margem para dúvidas: a prossecução do ‘business as usual’ e dos actuais padrões de vida dos países ditos desenvolvidos é incompatível, quer com a manutenção das condições ambientais propícias à vida humana (e à de muitos outros seres vivos), quer com a capacidade biofísica do planeta para gerar a energia e os recursos necessários. Como muitos autores vêm afirmando, a probabilidade de ocorrência de colapsos ambientais e/ou sociais será cada vez maior. O que é ainda possível fazer para evitar estes eventuais cenários traumáticos e para promover uma transição eco-social (de que fala amiúde Carlos Taibo)?
Os promotores das perspectivas decrescentistas, oriundos do meio académico europeu das ciências sociais e políticas, denunciam e criticam há vários anos os modelos económicos baseados no crescimento permanente da produção e do consumo, na mercadorização radical, na externalização dos impactos ambientais e na distribuição injusta dos impactos sociais. Põem também em causa os mitos neocoloniais e ‘ocidentocéntricos’ do desenvolvimento e do progresso tecnocientífico, e propõem a relocalização das actividades económicas e a redução dos níveis de produção e consumo de bens e serviços nos países e territórios com pegadas ambientais e sociais excessivas. Os decrescentistas defendem que a resultante redução de bens materiais e de conforto será acompanhada dum aumento dos níveis de satisfação emocional e psicológica, individual e colectiva, bem como do aumento dos bens relacionais e conviviais. Estas críticas e propostas têm sido não só naturalmente rejeitadas pela direita política, como também por largos sectores da esquerda que não concebem a prosperidade social dissociada do crescimento, do produtivismo e do extractivismo. Acresce que os grandes meios de comunicação têm ignorado estas mesmas ideias, o que leva a que sejam desconhecidas da maioria dos cidadãos.
As redes decrescentistas –movimentos de cidadãos auto-organizados e auto-gestionados, como o que surgiu na Galiza e está a surgir em Portugal– emergem como possibilidade real de inverter aquela situação. Os principais papeis que estas redes podem desempenhar são: divulgar e clarificar as propostas decrescentistas no espaço público (publicações, encontros, debates); denunciar as políticas públicas baseadas em falsas soluções ou em soluções insuficientes ou incoerentes; divulgar, potenciar e ligar projectos e práticas que promovam o decrescimento; promover hábitos e práticas que não alimentem ‘o sistema’ e que sejam coerentes com as premissas do decrescimento. Os decrescentistas estão cientes do desafio que será implementar a verdadeira revolução cultural que permitirá descolonizar o imaginário e desintoxicar as mentes e as narrativas dominantes – estou convicto de que as redes decrescentistas terão um papel central neste processo, que já está em andamento.