
No dia 9 de maio do presente ano, no Centro Penitenciário da Lama, praticamente a totalidade dos presos do Módulo 4 organizárom-se para reclamar a entrega do chamado lote higiénico, que nom lhes fora fornecido no mês de abril nem no período decorrido do mês de maio. Este lote, que deve entregar-se com carácter mensal, consta de papel higiénico, pasta dental, um talher de plástico, umha garrafa de lixívia, gel de banho e compressas, entre outros. Na data desta reivindicaçom, os presos levavam desde o mês de abril sem o lote, o que deu lugar a situaçons tam degradantes como as de nom ter papel higiênico, comer com as mans ou ter de compartilhar o talher com algum companheiro.
Neste ponto, compre ter presente que os meios que tenhem os reclusos para organizarem-se de jeito colectivo e organizar demandas e reivindicaçons comuns som mui escassos. Por um lado, a própria natureza das relaçons de sujeiçom e de poder da instituiçom sobre eles é absoluta, e fai que mal tenham facultade de decisom e atuaçom, vendo restringidos muitos direitos de carácter político que quedam em suspenso e nom podem exercitar-se, tais como o direito de associaçom, o direito de manifestaçom ou o direito à greve. Por outro, a realidade do que acontece na prisom está deliberadamente agachada ‑nom é casualidade que desde os anos noventa a construçom das macrocárceres figera-se afastada dos núcleos urbanos- polo qual é mui difícil que transcenda ao exterior o que ocorre dentro e, lamentavelmente, quando há conhecimento de situaçons injustas e vulneraçons de direitos, topam a indiferença da meirande parte da sociedade, que vê como alheios os problemas da prisom.
Em maio a práctica totalidade dos presos do módulo 4 organizárom-se para reclamar a entrega do lote higiénico, que nom recebiam desde o mês de abril
Todo isto dá lugar a que a maioria das vezes o único jeito de rebelar-se contra a prisom e fazer reclamos legítimos por parte da populaçom reclusa seja através do próprio corpo: jejum ou greve de fome, tragar pilhas, fazer-se cortes ou prender lume na própria cela som só algumhas das formas de procurar que os carcereiros atendam as situaçons limites nas que se encontram, com o conseguinte risco para a saúde que suponhem, dando conta dum contexto de enorme desesperaçom e necessidade.
É por todo isto que, desde Esculca, apoiamos e amossamos a nossa solidariedade com a açom que protagonizárom os presos do módulo 4 da cadeia da Lama. Ante a insofrível situaçom com a falta de entrega dos lotes higiénicos acordárom nom levantar-se das mesas quando fossem chamados para recolher a ceia no refeitório, açom que foi apoiada por 58 dos 68 presos do módulo. Umha vez que os funcionários os interpelárom para saber que acontecia e que os reclusos manifestárom a sua demanda, os primeiros comprometêrom-se a atender a mesma, com a conseguinte satisfaçom para os segundos. Ademais, os presos figérom um peto comum onde fazer umha achega, quem pudo, para mercar algo de comida no economato e ceiar, um gesto solidário que mostra os laços que se podem tecer mália a desumanizaçom pretendida pola instituiçom.
Porém, esta açom tivo fortes e desproporcionadas represálias. Quando estavam nas suas celas, meia dúzia de funcionários entrárom com capacetes e cacetes para algemar e trasladar ao módulo de isolamento os seis que considerárom cabeças da protesta, ao tempo que lhes davam golpes e os insultavam. Desde A Lama estimárom que o protesto era um plante, tipificado como falta mui grave no regulamento penitenciário, com sançom de isolamento de entre 6 e 14 dias, o qual supom estar só numha cela e ter apenas umha ou duas horas de pátio ao dia, sem contacto com ninguém.

Ademais, a Junta de Tratamento propujo que sofressem a repressom dum regime ordinário ‑segundo grau- a um fechado ‑primeiro grau- e que fossem trasladados de prisom. Trás quase vinte dias de isolamento, desde a Secretaria Geral de Instituiçons Penitenciárias resolveu-se que nom deviam passar a um primeiro grau, mas sim se acordou o seu traslado, com a conseguinte repercussom tanto para os presos como para as suas famílias e achegadas. Além disso, quando informárom a um dos presos de que o levavam à cadeia de Bonge, devolvérom-lhe as três instâncias que presentara ante o juiz de vigilância penitenciária para que levantasse a medida do isolamento e que nom foram tramitadas, conculcando gravemente o seu direito fundamental à tutela judicial efectiva, sem que ninguém assumisse responsabilidade por isto.
Em suma, a cadeia ocupou-se de dar umha resposta exemplificadora e desproporcionada ante umha louvável e digna forma de reivindicaçom colectiva, um castigo para alguns e umha advertência para todos: a de nom artelhar cauces de resistência ante as injustiças da prisom, que nom deu explicaçom nengumha pola falta de entrega do devandito lote.
A cadeia ocupou-se de dar umha resposta exemplificadora e desproporcionada ante umha louvável e digna forma de reivindicaçom coletiva, um castigo para alguns e umha advertência para todos: a de nom artelhar cauces de resistência ante as injustiças da prisom
Concluindo, compre fazer finca-pé na importância do apoio e solidariedade da sociedade com as pessoas presas. Na hora de analisar o papel ideológico da prisom, a criminologia crítica ou de corte marxista aponta que, em base ao chamado princípio de menor elegibilidade, a existência da instituiçom descansa num contrato psíquico-social de aparente estabilidade que obvia a violência intrínseca a umha sociedade desigual e dividida em classes, estabilidade assegurada pola ameaça constante dum castigo severo.
A prisom produz um sentimento de seguridade na cidadania, que crê que os seus direitos e liberdades estám garantidos com a existência das cadeias. Através dos meios de comunicaçom, da literatura ou do cinema, consumimos umha quantidade ingente de representaçons da prisom, reforçando assim a ideia da sua suposta necessidade, ao mesmo tempo que nos resistimos a conhecer que acontece dentro dos seus muros, simultaneidade que fai que estejam à vez presentes e ausentes nas nossas vidas. Aguardamos que dar voz a esta reivindicaçom e denunciar a sua repressom sirva para vencer essa resistência a conhecer esta realidade e, sobretodo, sirva para luitar coletivamente contra a sua existência.