A precariedade e o maltrato no serviço de oncologia do Complexo Hospitalário Universitário de Compostela (CHUS) marcou o tratamento de quimioterapia de María Freire por mor dum cancro de peito. María reivindica a humanizaçom do espaço e a dotaçom de recursos materiais e pessoais para que mais ninguém tenha que viver um processo de cura como um castigo.
Durante horas, María fica sentada numha cadeira rígida numha sala sem luz natural nem fontes de água. Aguarda o passo das horas até que pronunciem o seu nome. Ás vezes espera duas horas, outras quatro. “Houvo quem chegou às seis”, di. Mira ao seu lado. Com o passo do tempo, o ambiente vai-se carregando até resultar “muito desagradável”. Entre estas condiçons permanece na sala de aguarda do serviço de oncologia do Complexo Hospitalário Universitário de Compostela onde recebe o seu tratamento de quimioterapia. “O tratamento já é mui doloroso e topar-se o serviço nestas condiçons… afunde-te”. María Freire é umha das 30.120 doentes que passárom polas instalaçons oncológicas deste hospital entre o 2014 e 2015, segundo os dados facilitados pola Associaçom de Pacientes do CHUS ao que pertence.
A espera começa desde o primeiro momento em que umha pessoa chega ao serviço. “Aguardas meia hora para a analítica e arredor de duas horas e meia para entrar a consulta”. Aponta a que ultimamente estám a descentralizar as analíticas aos centros de saúde mas considera esta “umha soluçom parcial”. As colas nom rematam aí. Na hora de acudir à farmácia, as doentes aguardam num espaço sem janelas. “A profissional aparece e todo o mundo se acumula para dar-lhe o papel e se te despistaste, volta começar”.
María Freire considera-se umha pessoa autossuficiente mas sempre precisou umha acompanhante para acudir ao serviço de oncologia. Primeiro, di, “se nom tés umha pessoa que che saque psicologicamente de aí acabas chorando numha esquina”. Mas também cumpre ter umha acompanhante que poda, por exemplo, vigiar que nom se che passe o turno de consulta enquanto fás cola na farmácia.
Umha das razons da angustia que sentem as doentes é a carência de ajuda psicológica em todo o processo
Umha das razons da angustia que sentem as doentes topa-se também na carência de ajuda psicológica em todo o processo. Nom tés umha psicóloga com a que podas digerir a má notícia nem com a que seguir o teu processo de cura. “Se curo dum cancro mas o processo causou em mim umha doença psicológica é que nom houvo um bom tratamento”, assinala María. Para ela, a soluçom passa pola imediata humanizaçom do sistema sanitário. “Humanizar o espaço, o trato… sentir que vamos curar e que nom vimos a ser castigadas” e com um gesto de raiva acrescenta “cheguei a sentir-me como um objeto ao que lhe vam meter um chute”. Algo que, mantém, nom devemos consentir como sociedade.
“Precisamos de humanidade”
As profissionais da saúde também sofrem as carências dum sistema cada vez mais precarizado em recursos materiais e humanos. As condiçons nas que trabalham afetam à qualidade do serviço e, nesta lógica, “se umha médica está frustrada nom vai poder fazer bem o seu trabalho”. Tal e como está estruturado o serviço sanitário, amiúde as profissionais tenhem que fazer de psicólogas. “E por vezes há umha profissional que é mui boa oncóloga mas mui má comunicadora” e isso fai-te botar muito de menos a necessidade da humanizaçom de todo o sistema sanitário. “Semelha que o nosso sistema de saúde nom admite que tenhamos sentimentos e só quer engolir-nos numha engrenagem”. Por isso, insiste, em que as melhoras som possíveis. “Achegar humanidade é possível e é bom tanto para as trabalhadoras como para as doentes”.
María insta a caminhar cara a um sistema sanitário mais humano, próximo e baseado no cuidado das pessoas. Na sua cabeça guarda múltiplas propostas. “E se som as profissionais as que se achegam às pacientes e nom temos que ir nós como bolas de ténis de mesa?”, pergunta-se ao mesmo tempo que lamenta o vazio em que cai a experiência de todas as pessoas que um dia fôrom doentes.
Caminho da privatizaçom da sanidade
A Valedora do Povo e a gerência do hospital fecham a porta às demandas sociais com o mesmo gesto. O silêncio é a resposta das demandas realizadas pola associaçom de pacientes do CHUS sobre a precariedade do serviço de oncologia do hospital de dia do centro clínico de Compostela. “Pedimos que se reduzam as listas de aguarda ou que as salas cumpram com os standards de qualidade”; aponta o presidente da associaçom Fernando Abraldes que critica que quase um ano depois da demanda assinada por 28 doentes “o resultado é a nada”.
O de oncologia nom é o único serviço que se topa numhas condiçons precárias no CHUS. María Freire conta, por exemplo, como nunca lhe ofrecêrom serviço de fisioterapia após a cirurgia que recebeu a raiz do cancro de mama. “Se nom fás fisioterapia a cicatriz endurece-se e isso doe muito”.
“Só há 30 fisioterapeutas em toda a área sanitária pública de Compostela”, aponta Gloria Chousa
“Só há 30 fisioterapeutas em toda a área sanitária pública de Compostela”, aponta Gloria Chousa, que também forma parte da associaçom. “E só há umha pessoa psicóloga para todo o hospital!”, exclama. Gloria explica como as experiências som mui duras a nível emocional e lamenta que o sistema sanitário se encontre “nestas condiçons”. “E logo presumem de lei de morte digna! Se nom som capazes de fazer umha boa gestiom, que demitam!”.
Fernando considera que a gestiom do CHUS fai águas por todas partes. Coloca como exemplo o serviço de urgências onde só há umha ambulância nom medicalizada para levar as pacientes ao seu domicílio nos fins de semana. “Tenhem que esperar até três e quatro horas para voltar às suas vivendas”, sustém.
As três coincidem ao vincular a má gestiom do CHUS com um sistema sanitário galego que continua a usar as famílias como recurso, sobre todo as mulheres. “É umha forma gratuita para o sistema privatizar a sanidade à custa delas”, sustém Fernando, um dos críticos de que nom existam centros sócio-sanitários onde podam permanecer as doentes que precisam de ajuda sanitária nom urgente. “A funçom da sanidade é curar e nom só fisicamente senom também psicologicamente”, relata María que considera que o sistema sanitário deve encarregar-se de “devolver à sociedade a doente em condiçons dignas para reincorporar-se à sua vida”.
“Como nom vamos ter voz num sistema do que formamos a base?”
Como pacientes consideram-se a peça fundamental do sistema de saúde. “Sem pacientes a quem tratar, nom há profissionais”, apontam, “a nossa experiência é irrefutável e por isso nom querem que existamos”. O serviço de atençom às pacientes topa-se reduzido a um aplicaçom telemática para que “apenas haja contacto com as pessoas”. Nom solucionar os problemas das cidadania que se topa enferma é um incentivo para a sanidade privada, critica Fernando Abraldes que também considera que o atual sistema sanitário fomenta que as doentes “procurem melhoras pola porta de atrás favorecendo o caciquismo sanitário”. Para trabalhar na melhora do sistema de saúde, “cumpre contar com a voz das doentes”. Por isso, pidem que associaçons de pacientes como a que ele preside podam formar parte dos órgãos de controlo da gestiom sanitária. “Como nom vamos ter voz num sistema do que formamos a base?”