Talla Diop deixou há umha década Senegal “polo que se di sempre, na procura duma vida melhor” e para “ajudar a família que ficava no país”. O que encontrou ao chegar aqui nom se parecia muito com o que lá lhe contaram, e depois de seis anos trabalhando na venda ambulante noturna em diferentes sítios da Galiza, agora por fim tem um trabalho que lhe permite uma maior tranquilidade. Talla conta que ele foi dos mais afortunados, porque nem sequer tivo que trabalhar pola rua durante a pandemia, mas também di que no seu caso voltaria a fazer a viagem de ida outra vez — ainda que o início foi mui duro—, mas conhece muitas outras pessoas que regressárom ao Senegal, fartas do racismo, a violência, as dificuldades para legalizarem a sua situaçom e o cansaço dum trabalho que desgasta o corpo e o ânimo.
Tés amigos que se dedicavam à venda no estado de alarma, nom?
Sim. Mais claro, durante o estado de alarma era quase impossível vender nada. Estando toda a gente confinada, por muito que tentassem sair vender igual — que já era perigoso — nom viam ninguém porque as ruas estavam desertas. E ao nom terem contrato, tampouco cobrárom nada durante esses três meses.
Por essa razom, figemos como umha caixa comum para nos ajudarmos: os que podíamos ajudávamos com dinheiro e comprávamos comida ou cousas para as pessoas que mais precisavam. Há que ter em conta que muitos dos meus companheiros nom podiam deixar de cobrar tanto tempo porque tenhem que enviar dinheiro para a família, além de pagar os gastos necessários para viver aqui. Por isso, a cultura senegalesa é muito de ajudar os demais, porque sabemos o penoso que pode ser sobreviver. E sempre pensas em que te poderia acontecer a ti.
Quando tu ainda vendias tampouco seria simples?
Era difícil, sim. Aos fins de semana ainda era um pouco mais fácil vender, mas entre semana a situaçom mudava bastante. E já nom é só questom de se che compram algo ou nom, se nom que diretamente há bares que nom te recusam a entrada. O mesmo se passa com os clientes, nom? Há pessoas de todo tipo: gente que se queixa, que di que somos pesados… e cousas piores. Chamam-te de todo. Mas também há gente boa, que compram cousas para ajudar.
Contodo, há noites em que te topas com uma pessoa mui desagradável e dis-te a ti mesmo que já nom queres vender mais, a mim isso aconteceu-me um monte de vezes. Indivíduos que se metem contigo, sobretodo quando bebem. E se já de por si o trabalho é penoso, em momentos assim som muitos os que pensam que nom aturam mais. A venda ambulante é‑che mui fodida.
E sempre de madrugada.
Claro, é de noite, o que implica que podes topar-te com qualquer tipo de pessoa. E também está o problema da polícia, que tenhem na cabeça que som os negros os que roubam. Eu conto muitas vezes uma experiência que tivem aqui, na Corunha, quando uma amiga me pediu que lhe termara do bolso e a polícia veu atrás de mim acusando-me de o roubar. Berrando-me diante de todo o mundo. Em momento como esse sai toda a a raiva. E queres deixar todo, porque já é um trabalho duro para ainda aturar essas cousas que se repetem demasiado.
A gente aguanta?
Se tu falas hoje em dia com uma pessoa que venda à noite, a maior parte leva mui pouco tempo, porque poucas pessoas aguantam os insultos, a violência, o esgotamento, o medo… Ademais, quando acabas de chegar, nom conheces bem o idioma polo que tampouco entendes o que di a gente. Pero assim que começas a entender o que dim de ti, aí a cousa muda, fai-se mais penoso ainda. Também, quando entras num bar vês que e as pessoas se afastam, escondem os bolsos… Por estas cousas, a maior parte tentam deixar a venda passados alguns meses.
Contodo, normalmente nom tés outra alternativa senom aguantar, porque nom tés papéis, nem trabalho, nom conheces o idioma, tés gastos, tés que enviar dinheiro à casa… e isso obriga a sair e ganhar a vida.
Em Portugal, durante a crise, dérom a residência a imigrantes sem papéis, que opinas de que aqui nom?
Que nom se figera aqui foi mui duro. Há gente que leva dez anos polo menos e ainda nom tenhem nem autorizaçom de residência. Para que cho deem, tés que residir três anos no país, e conseguir um contrato de trabalho. Mas quem che há de fazer um contrato, tal como está agora a situaçom? E sem teres a situaçom regularizada. É como um circulo vicioso de que é mui complicado sair.
Após a morte de George Floyd houvo concentraçons para denunciar racismo na Galiza, como viveches isto?
Como algo mais que necessário. Nom digo que Galiza seja racista a 100% , pero si que há muita gente que tem atitudes que o som, ainda que eu tente centrar-me na gente que me quer bem e respeita. Por exemplo, eu tenho tentado entrar a discotecas e que nom me deixem. E quando pergunto por que, nom me dam uma resposta concreta, só dim «porque nom», e já podes imaginar por quê.
“É fundamental que a gente entenda que nengum ser humano é ilegal. O governo deveria pensar em que as pessoas que chegamos aqui deixamos atrás uma família e uma vida e vimos aqui trabalhar, e isso é impossível senom nos facilitam as cousas”
E apesar todo, dis que és afortunado.
Sim, porque eu nem sequer o passei tam mal como outras pessoas para chegar aqui. Mais tenho companheiros que tivérom experiências horríveis. Gostaria de avisar aos que querem vir aqui do duro que é. E que tentem aguantar ao princípio, porque se nom, nom vale a pena o esforço.
Há que ter em conta, ademais, que muitas das pessoas que chegam até aqui tenhem estudos superiores, que poderiam conseguir algo alá, pero deixan todo e venhem aqui porque lhes dixérom que aqui viverám melhor. Mais também há pessoas que venhem de famílias pobres, que o passam mui mal no Senegal, e decatam-se de que nom podem ficar de braços cruzados sem ajudar, e por isso venhen aqui e arrependem-se de nom ter vindo antes.
Que deveria mudar?
É fundamental que a gente entenda que nengum ser humano é ilegal. O governo deveria pensar que as pessoas que chegamos aqui deixamos atrás uma família e uma vida, e vimos aqui trabalhar, e isso é impossível se nos dificultam a vida .
Um amigo meu, que levava aqui um monte de anos, nom tinha papéis ao nom ter um contrato, Tinha um carnê de conduzir do Senegal, e esforçava-se em ir vender a todas as feiras. Pero claro, nom lhe reconheciam o carnê de conduzir e a polícia, que o sabia, parava‑o constantemente para lhe pedir 200 euros que tinha que pagar no momento. E acabou por ir embora. Porque se deu conta de que tanto tinha o muito que se esforçasse tentando fazer as cousas bem, e nom vendendo nada ilegal… era impossível.
Por isso pido que facilitem as cousas para conseguir a residência, só isso. Porque há gente que leva aqui muito tempo, sem poder ver a família, pero aguantam, porque por mui mal que lhes vaia aqui, para muitos é melhor de como lhes iria no Senegal.