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Umha ponte com muito trabalho e pouco salário

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Em fe­ve­reiro de 2015, a mi­nis­tra de Fomento, Ana Pastor, e o pre­si­dente da Junta da Galiza, Alberto Núñez Feijóo, des­co­briam a pri­meira pe­dra da am­pli­a­çom da ponte de Rande, o tramo da AP9 que co­necta a pe­nín­sula do Morraço com Vigo. Iniciavam-se en­tom umhas obras onde mor­rerá um tra­ba­lha­dor na sua jor­nada la­bo­ral e que in­dig­na­rám os con­ce­lhos da co­marca. Em de­zem­bro de 2017, o pró­prio Mariano Rajoy inau­gu­rava a ponte, mas as obras em Rande con­ti­nuá­rom com jor­na­das la­bo­rais de 12 ho­ras, sa­lá­rios por baixo do con­vé­nio e afe­ta­çom ao trá­fico viário.

A am­pli­a­çom da ponte de Rande é mais umha mos­tra da ex­plo­ra­çom la­bo­ral nas obras pú­bli­cas, com grande pre­sença das em­pre­sas sub­con­tra­tan­tes. Estas en­car­re­gam-se da con­tra­ta­çom do pes­soal da obra, fazendo‑o ge­ral­mente por baixo do con­vé­nio co­le­tivo cor­res­pon­dente. Segundo in­di­cam as cen­trais sin­di­cais e os pró­prios tra­ba­lha­do­res, as jor­na­das la­bo­rais du­ra­vam umha meia de doze ho­ras e os pa­ga­men­tos re­a­li­za­vam-se em “ho­ras cor­ri­das”, quer di­zer, no preço de umha hora es­ta­vam in­cluí­dos todo tipo de complementos.

A jornada laboral na ampliaçom de Rande é de 12 horas.

Em 2011, o mi­nis­tro de Fomento na al­tura, José Blanco, as­si­nava um con­vé­nio com Audasa ‑em­presa con­ces­si­o­ná­ria da cons­tru­çom, con­ser­va­çom e ex­plo­ra­çom da AP9‑, polo que lhe ou­torga li­cença para ad­ju­di­car a am­pli­a­çom da ponte de Rande e da cir­cun­va­la­çom de Compostela. Fomento apro­vava tam­bém que os in­ves­ti­men­tos re­a­li­za­dos pola con­ces­si­o­ná­ria se­riam com­pen­sa­dos por umha suba nas por­ta­gens. Em 2014, o BOE pu­bli­cava a con­ces­som, re­sul­tando be­ne­fi­ciá­ria das obras na ponte de Rande, com um v alor de 130 mi­lhons de eu­ros, a Uniom Temporal de Empresas (Ute) de Dragados – do grupo ACS, que di­rige Florentino Pérez – e Puentes y Calzadas.

Cobrar pola lei”
Luís ‑nome fic­tí­cio- tra­ba­lha na am­pli­a­çom de Rande, pre­fere man­ter-se no ano­ni­mato por pos­sí­veis re­pre­sá­lias na em­presa e ex­plica que an­tes da inau­gu­ra­çom “co­brava 7 eu­ros por hora. Afinal ti­vem que de­nun­ciar por­que no úl­timo mês ti­nha que co­brar 1800 eu­ros e dé­rom-me um che­que de 1500”. As lon­gas jor­na­das de tra­ba­lho jun­ta­vam-se, res­tando em oca­si­ons tempo para o des­canso diá­rio, “quase to­dos os dias eram onze ou doze ho­ras, mesmo al­guns dias ha­via que es­tar até as 12 ou 1 da ma­nhá, e ao dia se­guinte tendo que ir às 8 para tra­ba­lhar”, explica.

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Luís tra­ba­lha atu­al­mente para umha sub­con­tra­tante na ponte. “Entro às 8 da ma­nhá e boto até as 20.30 da tarde, ou­tras ve­zes até as 21h. Nom há ho­rá­rio. Em oca­si­ons tra­ba­lho sá­ba­dos e do­min­gos e dam-me um dia li­vre. Estou a co­brar oito eu­ros por hora, e os sá­ba­dos, do­min­gos e fe­ri­a­dos 10,50, como ‘ho­ras corridas’”.
Luís ex­plica que as pes­soas que es­tám con­tra­ta­das di­re­ta­mente pola UTE “co­bram pola lei”, isto é, polo con­vé­nio da cons­tru­çom de Ponte Vedra. Porém, os tra­ba­lha­do­res das sub­con­tra­tan­tes per­ce­bem me­nos di­nheiro. Os em­pre­ga­dos pola UTE “tra­ba­lhando as ho­ras que es­tou a tra­ba­lhar eu le­vam-se 3000 eu­ros para a casa, ou mesmo 4000. Eu podo le­var 2000 eu­ros, se os levo”, in­dica Luís, quem acres­centa que há al­gumhas sub­con­tra­tante que es­tám a pa­gar aos seus tra­ba­lha­do­res, com os mes­mos ho­rá­rios, seis eu­ros por hora.

“Nom vou cobrar indenizaçom por despedimento, nem tenho direito a férias nem nada”.


“As sub­con­tra­tan­tes dim ‘este é o preço’ e tés que acei­tar”, sa­li­enta Luis. “Senom, o que fas? Estás na casa e o paro acaba-se-che. No meu caso co­bro 8 eu­ros, mas sei que quando me di­gam que nom há tra­ba­lho nom vou co­brar a in­de­ni­za­çom por des­pe­di­mento, nem te­nho di­reito a fé­rias nem nada. Já cho dim dum prin­cí­pio, se que­res, bem, e se nom cha­mam a ou­tro”, ex­pom Luís.

 

Umha morte anunciada
Em ju­nho de 2017, um tra­ba­lha­dor per­ten­cente ao Grupo Syo ‑umha das sub­con­tra­tan­tes- mor­reu na jor­nada de tra­ba­lho. Como pre­mo­ni­çom, uns dias an­tes a CIG-Construçom pa­ra­li­sara os tra­ba­lhos para de­nun­ciar as con­di­çons la­bo­rais nas obras de Rande.

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Carlos Méndez, se­cre­tá­rio co­mar­cal da CIG-Construçom em Vigo, ex­pom que este sin­di­cato par­ti­ci­para nas pri­mei­ras reu­ni­ons da co­mis­som de se­gui­mento das obras, mas que a ne­ga­tiva das em­pre­sas da UTE em che­gar a acor­dos le­vá­rom a que a cen­tral a aban­do­nasse em fe­ve­reiro de 2017. “Entre as rei­vin­di­ca­çons en­con­tra­vam-se a ela­bo­ra­çom de um re­gisto ho­rá­rio da en­trada e saída das pes­soas que tra­ba­lha­vam na obra e o pa­ga­mento das nó­mi­nas atra­vés de umha trans­fe­rên­cia ban­cá­ria” ex­pom Méndez.

Em junho de 2017 morria um trabalhador na ampliaçom de Rande.


Da CIG ex­po­nhem que se es­tám a pro­ces­sar al­gumhas re­cla­ma­çons por parte de tra­ba­lha­do­res do Grupo Syo – que che­gou a con­tra­tar mais de 30 pes­soas- que re­cu­sá­rom co­brar o úl­timo mês para re­cla­mar à em­presa com­ple­men­tos como as li­qui­da­çons, as fé­rias, as ho­ras ex­tras ou as in­de­ni­za­çons. “Isto só o fi­gé­rom al­guns tra­ba­lha­do­res da co­marca de Vigo”, ex­pom Méndez, que acres­centa que a mai­o­ria das pes­soas que tra­ba­lham nes­tas obras som ori­gi­ná­rias de ou­tras par­tes da pe­nín­sula, polo que ve­nhem ape­nas com a von­tade de pas­sar uns me­ses na obra e logo mar­char com di­nheiro, umha si­tu­a­çom que di­fi­culta efe­tuar re­cla­ma­çons. A CIG cal­cula que a meia de di­nheiro que se está a re­cla­mar nes­tes ca­sos si­tua-se en­tre os 6000 e 7000 euros.

 

Lucros e fraudes
Nas épo­cas de maior carga de tra­ba­lho che­gá­rom a par­ti­ci­par das obras de am­pli­a­çom mais de 30 em­pre­sas sub­con­tra­tan­tes. Em ju­nho de 2017 tra­ba­lha­vam um to­tal de 341 pes­soas. Nesse mo­mento a sub­con­tra­tante com mais tra­ba­lha­do­res era o Grupo Syo Estructuras SL, se­di­ada em Málaga. Outra das em­pre­sas com maior ní­vel de sub­con­tra­ta­çom nesta obras foi Guilherme Coutinho Construcciones SL, com sé em Tui e que par­ti­lha en­de­reço com ou­tras em­pre­sas cons­tru­to­ras; e tam­bém Sos-Sosia Obras e Servicos, se­di­ada em Portugal.

Alguns trabalhadores reclamárom poder cobrar os complementos salariais.


As em­pre­sas sub­con­tra­tan­tes cos­tu­mam per­ten­cer ao mundo da cons­tru­çom. Algumhas de­las en­con­tram-se sal­pi­ca­das por ca­sos de fraude, como pode ser Altarser Civil SL, com sé num ático de Ponte Vedra e vin­cu­lada com o em­pre­sá­rio José Antonio Malvar Vázquez, quem teve que com­pa­re­cer nos jul­ga­dos no caso de Las 5 Jotas por um su­posto fraude com fa­tu­ras fal­sas quando ad­mi­nis­trava a em­presa Pedras e Mampostería SL.
Outra das em­pre­sas foi Construcciones Boqueixón SL, em­presa que tem saído nos meios de co­mu­ni­ca­çom vin­cu­lada à trama Pokemon, sus­peita de ama­nhar con­tra­ta­çons de obras junto com a Aquagest nos con­ce­lhos de Compostela e Valdovinho.

 

Após a inau­gu­ra­çom, as obras con­ti­nuam e pro­vo­cam pro­ble­mas de trânsito
As obras de am­pli­a­çom da ponte de Rande ge­rá­rom in­dig­na­çom nos con­ce­lhos da co­marca do Morraço. Os pro­ble­mas para o trân­sito ví­rom-se mul­ti­pli­ca­dos após a inau­gu­ra­çom, pois as obras con­ti­nuá­rom mas nesta oca­siom com cor­tes de car­ris e in­ci­dên­cias para as usuá­rias. As al­cal­dias de esta co­marca le­vam desde fe­ve­reiro aguar­dando umha res­posta de Fomento para esta situaçom.
A al­cal­desa de Moanha, Leticia Santos, de­nun­cia que “as obras es­tám oca­si­o­nando no Morraço re­ten­çons diá­rias desde que se re­to­má­rom”. Santos in­dica que “com as obras está di­mi­nuído o nú­mero de car­ris, por­tanto quando a gente vai para Vigo em hora ponta pola ma­nhá nom cabe por eles. As re­ten­çons atin­gem um qui­ló­me­tro na es­trada PO-551, co­lap­sam o cor­re­dor e co­lap­sam a N554”.
Santos de­nun­cia tam­bém que du­rante os co­lap­sos viá­rios, a con­ces­si­o­ná­ria Audasa em ne­nhum mo­mento ace­deu a abrir as bar­rei­ras das portagens.

As empresas subcontratantes costumam pertencer ao mundo da construçom. Algumhas delas encontram-se salpicadas por casos de fraude.


A al­cal­desa de Moanha tem de­nun­ci­ado pu­bli­ca­mente nos meios que a inau­gu­ra­çom de de­zem­bro foi ape­nas umha co­ar­tada para que a em­presa pu­desse re­a­li­zar a suba de por­ta­gens pro­gra­mada. “Essa am­pli­a­çom nom está jus­ti­fi­cada”, acres­centa Leticia Santos, “ade­mais, os car­ris no­vos som es­trei­tos e pe­ri­go­sos no caso de aci­dente ou ne­ces­si­dade de eva­cu­a­çom. A dia de hoje, as pas­sa­re­las que co­mu­ni­cam os car­ris ex­te­ri­o­res com o tron­cal da ponte, que se uti­li­za­riam em caso de emer­gên­cia, es­tám ocu­pa­dos com ma­te­rial da obra e por­tanto nom sei o que se po­derá pas­sar caso que haja al­gum acidente”.

 

12 ho­ras ao dia, 50 anos atrás
A cons­tru­çom da ponte de Rande de­cor­reu en­tre 1973 e 1977, se bem nom foi aberta ao trân­sito até 1981 com a inau­gu­ra­çom da AP9. A obra es­tivo ad­ju­di­cada para as em­pre­sas de cons­tru­çom MZOV e Cubiertas y Tejados SA ‑as quais se­rám o germe de umha das gran­des em­pre­sas de ener­gia e in­fra­es­tru­tu­ras es­pa­nho­las: Acciona- e con­tou com um am­plo abano de em­pre­sas subcontatantes.

cons­tru­çom da ponte na dé­cada de setenta

O tes­te­mu­nho de um tra­ba­lha­dor nes­sas obras, que atu­al­mente re­side na co­marca do Morraço, evi­den­cia a ex­plo­ra­çom la­bo­ral nes­tas obras e mos­tra os li­mi­tes na me­lhora das con­di­çons la­bo­rais nos úl­ti­mos 50 anos.
Alberto ‑nome fic­tí­cio, pois o tra­ba­lha­dor pre­fere man­ter o ano­ni­mato- ex­pom que em 1974 es­tava a tra­ba­lhar como fer­reiro em Múrcia quando “a em­presa dixo-nos que tí­nha­mos que vir para Vigo por­que es­ta­vam a cons­truir umha ponte e sei que nom ha­via pes­soal qua­li­fi­cado”. Assim, “ar­ran­ca­mos para Vigo sem sa­ber se­quer quais iam ser as con­di­çons la­bo­rais”, lem­bra Alberto. “Em to­tal che­ga­ría­mos uns 40 tra­ba­lha­do­res de Múrcia, Cuenca, Albacete e Valência”, lembra.
“Nada mais bai­xar do com­boio às 11 da ma­nhá fo­mos para a pen­som e pola tarde já es­tá­va­mos a tra­ba­lhar. Começamos com jor­na­das de 12 ho­ras: de oito da ma­nhá a oito da tarde e de oito da tarde a oito da ma­nhá”, ex­pom Alberto no seu re­lato, quem sa­li­enta que “no mês de fe­ve­reiro de 1975 tra­ba­lha­mos 28 dias se­gui­dos 12 ho­ras diárias”.
“Havia gente que bo­tava ainda mais ho­ras. Por exem­plo, os ele­tri­cis­tas ti­nham que fa­zer guar­das, polo que che­ga­vam a do­brar jor­nada. Numha oca­siom, um de­les en­tre­gou um parte diá­rio de tra­ba­lho em que fi­gu­ra­vam 25 ho­ras”, lem­bra Alberto. Este tra­ba­lha­dor in­dica tam­bém que houve re­cla­ma­çons dos tra­ba­lha­do­res para su­bir o preço das ho­ras ex­tras e que mesmo os ope­rá­rios do for­mi­gom che­gá­rom a re­a­li­zar pa­ros para me­lho­rar o seu sa­lá­rio. “Ao ser tan­tas sub­con­tra­tan­tes as re­cla­ma­çons iam por se­to­res”, lem­bra Alberto.

Calculando a morte de operários
“Houve aci­den­tes la­bo­rais (am­pu­ta­çons de de­dos, gol­pes, caí­das, ele­tro­cu­ta­çons…) mas ne­nhum foi mor­tal”, as­si­nala Alberto. Porém, lem­bra umha ane­dota que mos­tra como para as gran­des em­pre­sas as vi­das do pes­soal ope­rá­rio som nú­me­ros de umha es­ta­tís­tica. “Curiosamente, as pró­prias em­pre­sas che­gá­rom a cal­cu­lar que po­de­ria pro­du­zir-se a morte de três ou qua­tro tra­ba­lha­do­res du­rante umha das ope­ra­çons mais com­pli­ca­das, que foi quando se co­me­çou a me­ter o ta­bu­leiro en­tre as duas pias cen­trais. Toda a es­tru­tura es­tivo su­jeita uni­ca­mente por gran­des ga­tos hi­dráu­li­cos até que se fi­xou o pri­meiro ti­rante, polo que era pro­vá­vel que no caso de vir-se abaixo le­vasse con­sigo os ope­rá­rios que nesse mo­mento se en­con­tras­sem acima. Afinal nom se pas­sou nada”.

 

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