
A pandemia obrigou o Cineclube de Compostela a botar mao de arquivos e documentos audiovisuais em rede para suster umha programaçom que pudera seguir a explorar as vertentes menos conhecidas, subversivas ou experimentais das imagens e gerar um debate arredor delas. No Instagram organizárom-se as sessons #CineClubeNaCasa, em que se mostrárom experiências visuais contemporâneas e imagens do passado de arquivos. Um deles foi o Open Memory Box, umha web com documentos fílmicos da extinta RDA, organizada arredor de temas da vida quotidiana das décadas de 1940 a 1990. Excursons, celebraçons familiares ou viagens aparecem no ecrám para que a nossa curiosidade se enfrente a esses rostos que olham a câmara, saúdam, rim, e nos interpelem da ingenuidade de imagens que nom se producírom para serem vistas por estranhos. Nas filmaçons aparecem o trabalho doméstico, a criança e os cuidados, todos eles realizados por mulheres que, como diria Michelle Citron, som filmadas pola figura do pai, que é quem maneja a câmara.
O arquivo pode servir assim para perguntar-nos como resgatar a experiência das mulheres, como representar a sua subalternidade e a sua condiçom de objetos da mirada e, ao tempo, empregar essas imagens como ferramentas libertadoras. Dous filmes e um programa de televisom permitem ver como o arquivo audiovisual pode servir ao propósito de desafiar o dominante olhar masculino sobre a memória. O filme Nación, de Margarita Ledo, começa com as imagens de umhas mulheres como artífices de luitas que fôrom soterradas nas capas de sedimento deitadas polos meios de comunicaçom.
Precisamente a televisom, como aparato de memória coletiva, é o cenário de um outro uso que o arquivo que, desta volta, serve como defesa frente ao relato do heteropatriarcado. A recuperaçom de centos de horas de televisom mal chamada do coraçom no programa espanhol Rocío Carrasco. Contar la verdad para seguir viva funcionam como testemunho. Para além das dúvidas que podam suscitar o formato televisivo e essa espiral esmagadora de Telecinco, o valor do documento serve neste caso de defesa frente ao juízo coletivo. Este trabalho com as imagens do passado fica nos antípodas do relato que propóm outro projeto audiovisual cimentado no arquivo, desta volta pessoal. O filme Ingrid Bergman: retrato de família joga com as imagens filmadas pola atriz para reconstruir a experiência de umha mulher que viveu muitas vidas numha perspetiva que fica longe do juízo moral de muitos discursos dos meios. Cumpre ainda um trabalho feminista com o arquivo audiovisual no ronsel de experiências como a das “Insumusas”, Deplhine Seyrig, Carole Roussopoulos e Ioana Wieder, que criárom o Centre Audiovisuel Simone de Beauvoir, para subverter o sentido das imagens e dar-lhes usos para a(s) história(s) das mulheres.