Lá polo ano 2003, quando os filmes de Eugenio Granell viam a luz pública pola primeira vez, escrevia eu: “Depois do descobrimento público destes breves filmes de Granell temos a obriga de, se se nos permitir a afirmaçom, reescrever a história do cinema galego. As películas deste diretor venhem a encher um oco no raquítico cinema pátrio, constituindo-se nas primeiras e únicas cintas experimentais da sua história.”
Muito mudárom as cousas nestes sete anos: o cinema pátrio, já nom tam raquítico, começou a agromar e auguramos-lhe um crescimento robusto; e as obras de Granell passárom de ser desconhecidas a formar parte nom só do cânone do cinema galego senom mesmo do espanhol (a inclusom de Lluvia no ciclo Del éxtasis al arrebato. Un recorrido por el cine experimental español assim o confirma), o que nom deixa de provocar umha grande satisfaçom em quem apostamos no seu momento polo seu valor artístico.
Na altura nom podíamos deixar de insistir no carácter póstumo, se calhar provisional e talvez inacabado destas seis peliculinhas. Hoje em dia já podemos falar delas e analisá-las como obras completas e independentes (independentes das suas circunstâncias criativas e também da vontade do seu autor). Se bem que é certo que na década de sessenta nom pudérom deixar nenhumha pegada, nem no New York em que fôrom realizadas nem na Galiza das suas origens, devido ao seu óbvio carácter inédito, também o é que, vistas hoje, som obras que, ainda que derivam de táticas anteriores, antecipam estratégias que serám moeda da câmbio no cinema posterior. O feito de ser pioneiras pode nom ter importância na historiografia internacional, mas sim nos serve para demonstrar a inteligência artística de Granell. Quanto à sua posiçom dentro do cinema galego, o feito de que as primeiras projeçons tiveram lugar na Galiza (na exposiçom inaugural de 2003, no Congresso Interdisciplinar de 2006), por muito que foram criadas no exílio, garante-lhes um lugar iniludível na história do nosso cinema.
O feito de que as primeiras projeçons tiveram lugar na Galiza (na exposiçom inaugural de 2003, no Congresso Interdisciplinar de 2006), por muito que foram criadas no exílio, garante-lhes um lugar iniludível na história do nosso cinema.
O interesse de Granell pola cinematografia vém de velho. O pintor inclui Fred Astaire num quadro de 1946; tem escrito algumha crítica cinematográfica que se centra na relaçom entre pintura e cinema; conservam-se uns quantos guions surrealistas com descriçons dos planos, diálogos e desenhos preparatórios; e com certeza, temos os seus filmes. Destes, três som abstratos: dous deles estám pintados diretamente sobre a tira de celuloide (Invierno e Dibujo) e o outro utiliza a técnica inversa ao criar as imagens rascando a emulsiom fotográfica (Lluvia). Outros três som filmes fotografados: Película hecha en casa con pelota y muñeca é umha narraçom surrealista que tem muito a ver com os seus guions e com a sua literatura; as outras duas talvez sejam as mais cinematográficas, as que utilizam técnicas próprias do cinematógrafo e nom prestadas doutras artes como podem ser a pintura ou a literatura: Middlebury usa consistentemente a superposiçom como recurso estilístico enquanto Trompos consta dumha série de planos zenitais de buxainas (regaladas por Marcel Duchamp) bailando no limite do enquadre, entre o campo e o fora de campo.
Todas estas obras fôrom realizadas entre 1960 e 1962. A partir dessa data abandonou a criaçom cinematográfica.
Todas estas obras fôrom realizadas entre 1960 e 1962. A partir dessa data abandonou a criaçom cinematográfica, intuímos que polas dificuldades técnicas de levar a cabo os seus elaborados guions. Mas foi um abandono parcial: as cinco horas de filmaçons familiares que se conservam estám datadas entre 1960 e 1980. Entre as imagens familiares, as viagens e os momentos poéticos topamos umha breve bobina de meio minuto de duraçom, titulada Casa e datada em 1963, que constitui o derradeiro intento granelliano de criar umha peça cinematográfica. Similar a Trompos na sua singeleza e humildade, consta de três tomas interiores, em branco e negro e mudas. Na primeira vemos umhas pilhas de livros sobre um escritório, o pé dumha lâmpada ao fundo e a luz do sol iluminando-os desde a esquerda (nesse bordo adivinhamos a máquina do seguinte plano). A segunda, com um enquadre mais curto, mostra umha máquina de escrever com um fólio escrito no rolo e fume de tabaco ascendendo em primeiro plano (à direita vê-se um fragmento da mesa do plano anterior). E a terceira mostra-nos umha parede de onde penduram sete fotos e pinturas emolduradas. A câmara, ausente de trípode, treme levemente. O ascetismo da bobina, o espaço interior e a ausência da figura humana antecipam o cinema de Peter Gidal. Com estes três planos Granell reflete o seu espaço doméstico e criativo: a leitura, a escritura e a pintura. Três pinceladas mínimas que sugerem toda umha vida.