Periódico galego de informaçom crítica

Falando do prazer falamos de crescer

por
Catarina Bessell

O pra­zer é algo autô­nomo, é a ca­pa­ci­dade que te­mos as pes­soas de go­zar, por­que o nosso corpo é sen­sí­vel. O pra­zer não o dá nin­guém (…) a ca­pa­ci­dade do pra­zer de­pende da dis­po­ni­bi­li­dade pes­soal mais que o vir­tu­o­sismo alheio”

Fina Sanz

A aula de 4º da E.S.O, uma sala de aula grande, com bas­tante luz e muita von­tade de fa­lar e com­par­tir so­bre a se­xu­a­li­dade. Somos 32 pes­soas. No iní­cio, a ver­go­nha es­tava em mui­tas ca­ras, nos sor­ri­sos tí­mi­dos ou nos co­men­tá­rios bai­xi­nhos com cu­ri­o­si­dade, vá­rios olhos me ob­ser­vam an­si­o­sos de sa­ber o que a “Profe de Sexualidade” vem contar.

A sur­presa é grande quando vêem que eu não vou con­tar nada, o que vou é per­gun­tar, e as per­gun­tas que es­tão no ar du­rante to­das as au­las que es­ta­mos jun­tos, são: para você o pra­zer? Como o sente? De que forma re­age o teu corpo?
Durante seis se­ma­nas es­ti­ve­mos es­cu­tando, ob­ser­vando, per­gun­tando, re­fle­xi­o­nando so­bre os te­mas mais im­por­tan­tes para a vi­vên­cia pra­zen­teira do uni­verso da se­xu­a­li­dade. Compartindo, che­ga­mos ao ponto cen­tral de toda a ga­lá­xia eró­tica: O Prazer.

Se falamos e não experimentamos,
a percepção teórica dos temas abordados fazem morada na mente sem caminhar pelas emoções

Se fa­la­mos e não ex­pe­ri­men­ta­mos, a apren­di­za­gem, a per­ce­ção teó­rica dos te­mas abor­da­dos fa­zem mo­rada na mente sem ca­mi­nhar pela li­nha de es­tre­las que são as emo­ções. Para ca­mi­nhar, pri­meiro é ne­ces­sá­rio sa­ber como está o corpo, como é, de que ma­neira sente, vive e se expressa…

Ao pro­por uma ati­vi­dade de per­ce­ção cor­po­ral ao grupo, fe­char os olhos, e sim­ples­mente com os de­dos co­nhe­cer-se desde o bom trato, a ca­beça, os olhos, as pál­pe­bras, bo­che­chas, boca, ore­lha, pouco a pouco, desde o ca­ri­nho, desde o quarto pró­prio que fa­lava Virginia Wolf, na sala, no es­paço de auto-co­nhe­ci­mento cons­truído desde cada pessoa.

Observamos as ca­ras de sur­presa, ale­gria, bem es­tar ao ter­mi­nar a ati­vi­dade. Curiosamente, al­guém que era apá­tico du­rante as au­las pre­sen­teia o grupo com um sor­riso grande de sa­tis­fa­ção e co­menta: gos­tei muito.

Ao fa­zer as ava­li­a­ções qua­li­ta­ti­vas do tempo que es­ti­ve­mos jun­tos, a mai­o­ria como a ati­vi­dade que mais gos­tou e des­fru­tou. Auto-co­nhe­cer-se gera pra­zer. O sim­ples pra­zer de sa­ber como cada pes­soa sente. O pra­zer que não re­side em sim­ples­mente pas­sar a mão, re­side no toque.

Se o prazer individual serve como porta para a construção do desfrute com outras pessoas, abrimos um espaço de relação onde o bom trato é o centro dos encontros eróticos

O pra­zer como cen­tro da Educação Sexual é pri­mor­dial para abor­dar to­dos os ou­tros as­pe­tos. Se fa­la­mos do pra­zer como fio con­du­tor da nossa eró­tica e prá­ti­cas ama­tó­rias, se o in­tro­du­zi­mos atra­vés do auto-co­nhe­ci­mento, fa­la­mos trans­ver­sal­mente de ori­en­ta­ções do de­sejo, fa­la­mos de di­ver­si­dade de cor­pos, de di­ver­si­dade de sen­sa­ções, fa­la­mos de con­sen­ti­mento, fa­la­mos de des­fru­tar, fa­la­mos do res­peito pes­soal, re­la­ci­o­nal e social.

Atualmente as­sis­ti­mos um de­bate po­lí­tico não, este de­bate tem o ob­je­tivo de re­gu­lar ju­ri­di­ca­mente os li­mi­tes que cada pes­soa de­ve­ria sa­ber, se o pra­zer fosse o eixo das re­la­ções, se re­al­mente a edu­ca­ção se­xual fosse me­to­do­lo­gi­ca­mente ba­se­ada em fa­ci­li­tar fer­ra­men­tas para iden­ti­fi­car e vi­ver o pra­zer, creio que não es­ta­ría­mos de­ba­tendo so­bre isto, já que nos re­la­ci­o­na­mos por prazer.

Se o pra­zer in­di­vi­dual serve como porta para a cons­tru­ção do des­frute com ou­tras pes­soas, abri­mos ou­tro es­paço de re­la­ção, onde o bom trato é o cen­tro dos en­con­tros eróticos.

Como pode ser que vi­ve­mos em uma so­ci­e­dade onde a vi­o­lên­cia e a falta de sim­pa­tia e em­pa­tia eró­tica es­tão mais va­lo­ri­za­das que o pra­zer? Se pen­sa­mos fri­a­mente, se te­mos que per­gun­tar se a ou­tra pes­soa quer es­tar co­migo é que mui­tas si­nais de que não tem von­tade, já fo­ram da­dos, sim­ples­mente não o qui­se­mos ver.

Elisa Riemer

Imprescindível é ver que o pra­zer é o mo­tor que gera vín­cu­los, que pos­si­bi­lita que os se­xos (que se faz, que se é e que se sente) se co­mu­ni­quem e se co­nec­tem com as ou­tras pes­soas desde a ale­gria e a fe­li­ci­dade. Se per­ce­be­mos o pra­zer no corpo da ou­tra pes­soa, nos seus olhos, na sua forma de to­car, de res­pi­rar, am­pli­a­mos o nosso mapa eró­tico e ama­tó­rio, cri­a­mos pon­tes de in­ti­mi­dade sem exi­gir, sem es­pe­rar, sem es­tar pen­dente do que dirá e sim do que po­de­mos criar go­zando. Recebemos e da­mos a tra­vés da di­ver­são, da cu­ri­o­si­dade, da sen­sa­ção de co­ne­xão. Deste modo, fa­vo­re­ce­mos es­pa­ços bi­di­re­ci­o­nais nas es­tra­das do jogo eró­tico e o desfrute.

Valorizando o prazer, fomentamos o bom trato, incidimos no estar bem para sentir mais e melhor, para desfrutar e favorecer espaços de crescimento

O pra­zer não eti­queta, não dis­cri­mina, não dis­tin­gue de ra­ças, co­res de pele, idi­o­mas, ter­ri­tó­rios. O pra­zer não é amigo das fo­bias. Podemos iden­ti­fi­car um sor­riso de ale­gria per­fei­ta­mente no rosto de uma pes­soa fe­liz; e por­que te­mos ver­go­nha de iden­ti­fi­car o pra­zer no nosso corpo? Porque te­mos re­ceio de pe­dir, de co­mu­ni­car de que ma­neira sen­ti­mos prazer?

Valorizando o pra­zer, fo­men­ta­mos o bom trato, in­ci­di­mos no bom, no po­si­tivo, no es­tar bem para sen­tir mais e me­lhor, para des­fru­tar e fa­vo­re­cer es­pa­ços de em­po­de­ra­mento e cres­ci­mento. E tal­vez atra­vés desde este pa­ra­digma se­re­mos ca­pa­zes de de­ba­ter po­lí­tica, ju­rí­dica e so­ci­al­mente como vi­ver e edu­car para que todxs pos­sa­mos aten­der, cui­dar, co­nhe­cer e des­fru­tar, sem tan­tos “con­tra­tos” e sim com mais contacto.

O pra­zer é o es­paço ideal para ex­pres­sar os desejos.

Ao fi­na­li­zar o tra­ba­lho nas au­las, ter­mi­na­mos nos co­nhe­cendo e co­nhe­cendo uns aos ou­trxs a tra­vés do des­frute. Proponho ao grupo a mesma ati­vi­dade com um com­pa­nheirx. Primeiro cada pes­soa se per­gunta a si mesma se fa­zer a ati­vi­dade, o meu pra­zer é o cen­tro. Falamos que quando aca­ri­ci­a­mos, trans­mi­ti­mos ener­gia e quando so­mos aca­ri­ci­adxs também.

A pro­posta gera olha­das tí­mi­das mais de­ci­di­das, já pro­va­mos a sa­tis­fa­ção de sen­tir cada umx a si mesmx, já sa­be­mos que é gos­toso e, já não há medo.

Abrimos a porta ao pra­zer de ser.

O último de O bom viver

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