Som tempos complexos os que estamos a viver. COVID-19, mortes espalhadas polo mundo, exames e precauçons, menos contato social, mais encerro e violência, maior presença nas redes sociais…. E de súpeto, somos testemunhas de um assassinato que se comete durante o dia e fica registado no telemóvel de umha rapariga negra que acha necessário gravar o acontecimento para que as vidas das negras importem.
Passam dias e este sucesso é repetido milhares de vezes nos meios de comunicaçom obrigando-nos a todas a ser cúmplices da impunidade com a que pessoas, que representam as forças da “ordem”, cometem um crime abominável mesmo sabendo que estám a ser gravados num telefone. Parte-se-me a alma ao escuitar George Floyd pedindo clemência e inclusive chamar a sua nai nesses fatídicos minutos antes de deixar de falar, de luitar, de respirar.
Passam este vídeo no telejornal enquanto apuro a comida e discuto com o meu companheiro sobre a dureza das imagens e a necessidade de reproduzi-las na televisom, sem avisar previamente de que nesse momento vamos ver como um homem negro de idade adulta é violentado de um modo tam cruel.
[Paro de jantar, revolve-se-me o estómago e as bágoas começam a caírem sem dar-me conta…velai outro mais]
Desligo a televisom e tento recobrar a estabilidade enquanto penso sobre a “boa sorte” que temos as pessoas negras neste mundo cruel. Surpreende a falta de sensibilidade de todos os meios (ademais das milhares de pessoas) que nom fam mais do que partilhar algo que, do meu ponto de vista, representa a desgraça e a negrofobia presentes, ainda que depois muitas dessas pessoas se cansem em repetir esse mantra de: “Nom vejo cores, todas as pessoas pertencemos à raça humana”.
Surpreende a falta de sensibilidade de todos os meios que nom fam mais do que partilhar algo que, do meu ponto de vista, representa a desgraça e a negrofobia presentes
Esse terrível sucesso e as milhares de revoltas que se sucedem durante dias em diferentes partes do mundo servem para que a maioria da populaçom branca que, até o momento vivia num coma induzido, tenha em boca palavras com as quais anteriormente nom se sentia identificada, nom compreendia ou negava rotundamente que isso sequer existira. Termos como ‘racismo institucional’ e a sua vinculaçom com as atuaçons das forças de segurança do estado passam a converter-se no fio condutor de um movimento antirracista de meia-pataca que precisa fazer-se visível (para existir) através de um quadrado em negro que simboliza o seu apoio a esta corrente política tam necessária em todas. Resulta quase de brincadeira essa facilidade para explicar a conexom entre o racismo institucional e o funcionamento de umha sociedade como a americana enquanto negam que essa mesma situaçom suceda aqui onde elxs vivem, tam pertinho da casa e da sua realidade.
O que acontece no território do estado espanhol nom é reconhecido polos meios e as massas populares como racismo institucional, nom existe a brutalidade policial neste país, e, de existir, é para conter aquelas ondanadas de imigrantes ilegais que venhem viver do estado e roubar empregos que ninguém quer.
É indignante como as mortes desta parte do mundo nom tenhem tanto tirom como as que acontecem lá, basta comparar os minutos dados para analisar o caso de George Floyd com o acontecido com as mortes do Tarajal, a morte de Imad num centro de menores ou as estranhas mortes que tenhem lugar durante as custódias policiais, por nom falar da existência dos CIES e o que ocorre em território de ninguém.
Penso que no Estado espanhol demasiadas vezes comparam-se ou vinculam-se os termos racismo, imigraçon ou ilegalidade, facto que simplifica a realidade e oculta as vulneraçons que tenhem cabida nessa tríada.
O que é o racismo para a sociedade galega e como se reproduz?
Quem som aquelas pessoas consideradas imigrantes? Só elas estám expostas aos comportamentos racistas?
Quem som consideradas ilegais?
Eu pergunto-me, é tam simples para estas pessoas identificar a funcionalidade do racismo numha realidade tam afastada como a que existe nos Estados Unidos da América e nom a que sofrem as suas vizinhas na Galiza? Trata-se de simples ignorância ou de hipocrisia para denunciar aquela situaçom e à vez ser cúmplice de um sistema espanhol que te beneficia no momento em que nasces?
O que é o racismo para a sociedade galega e como se reproduz? Quem som aquelas pessoas consideradas imigrantes? Só elas estám expostas aos comportamentos racistas? Quem som consideradas ilegais?
É preciso reconhecer a pele que habitamos e o contexto histórico e social em que medramos antes de pôr-nos a reflexionar e opinar sobre realidades alheias nunca sofridas. Som diversas as variáveis a ter em conta assim como a natureza do sistema colonial herdado. Ditos imaginários, construídos em épocas de colonizaçom, expropriaçom e exploraçom racial deixam umha pegada histórica que pouco interessa a aquelas antigas potencias mundiais derrubarem. Como se estabelece o privilégio racial e por que é umha tónica que se reproduz na atualidade? Será que isto servia e serve para favorecer a mobilidade social de umhas elites brancas que se negam a reconhecer dito poder para nom ter que reparti-lo? Como me benefício eu desta lógica? O que acontece no meu país com as pessoas racializadas? Som violentadas como acontece em EUA com a brutalidade policial contra a comunidade negra?
Para mim estas som as primeiras perguntas que cada pessoa deve responder, reflexionar, em privado (a poder ser) sobre a sua vida e a dos seus familiares e a relaçom com a sociedade ou país em que reside. Nom devemos ter medo a questionar-nos, pois é o modo de desaprender sobre a nossa trajetória vital e construir ferramentas com as que desacordar antigas atitudes e comportamentos racistas para começar a ser umha cúmplice mais. Pensar que esta luita antirracista só nos pertence às pessoas racializadas é um grande erro.
Agora que já o sabes, que vás fazer?