Kyokujitsu-ki, ou a controvérsia de umha bandeira

por
elena mar­tín lores

Aproximam-se os Jogos Olímpicos de «Tóquio 2020». Em meio ao or­gu­lho na­ci­o­nal in­cen­ti­vado pola pos­si­bi­li­dade de aco­lher pola se­gunda vez este evento de es­cala mun­dial, o Japom apre­senta umha ban­deira que para mui­tas se pa­rece com aquela que ti­nha pre­si­dido a época mais im­pe­ri­a­lista deste país, tes­te­mu­nhando que tal­vez os fan­tas­mas do mi­li­ta­rismo e da ex­trema-di­reita es­tám muito pre­sen­tes no País.

A his­tó­ria da Bandeira do Sol Nascente
Se bem que a ban­deira que re­la­ci­o­na­mos hoje em dia com o Japom seja um disco ver­me­lho so­bre um fundo branco (co­nhe­cida po­pu­lar­mente como Hinomaru), até ao ano 1945, a ban­deira ofi­cial do País nom era esta. Um sol de de­zas­seis raios a se er­guer so­bre o ho­ri­zonte foi a ban­deira na­ci­o­nal até há me­nos de um sé­culo. Esta ima­gem, bem re­la­ci­o­nada com o nome do país no seu idi­oma ori­gi­nal (Nippon an­tes do fim da guerra, Nihon na atu­a­li­dade, que sig­ni­fica Origem do Sol), para mui­tas tem umha co­no­ta­çom que pouco tem a ver com esse idí­lico nascer-do-sol. 

Muita gente re­la­ci­ona a ban­deira do Sol Nascente com um mo­mento con­tur­bado da his­tó­ria nipona

Surgida pola pri­meira vez no sé­culo XVII, du­rante o pe­ríodo Edo, como in­síg­nia dos se­nho­res da guerra, len­ta­mente aca­bou por se tor­nar a ban­deira ofi­cial do exér­cito ja­po­nês e da ar­mada. Hoje, ainda que já nom se uti­liza de jeito ofi­cial na te­o­ria, as Forças de Autodefesa uti­li­zam um de­sign muito se­me­lhante. Durante a Segunda Guerra Mundial ‑de­pois da qual o Japom nom pe­diu per­dom aos seus vi­zi­nhos, prin­ci­pal­mente a China e a Coreia, po­los as­sas­si­na­tos e vi­o­la­çons per­pe­tra­dos du­rante a con­tenda bé­lica- con­ti­nuou a ser uti­li­zada, polo que muita gente a re­la­ci­ona com este pe­ríodo con­tur­bado da his­tó­ria ni­pona. E, por esta ra­zom, pe­dem a sua proibiçom.

Um de­bate com­pli­cado
Tanto nos meios de co­mu­ni­ca­çom quanto nas re­des so­ci­ais e em vá­rios ám­bi­tos da so­ci­e­dade ja­po­nesa está a se dar um de­bate so­bre a ques­tom que nom pa­rece fá­cil de re­sol­ver. Para al­gumhas a ban­deira re­pre­senta o ódio ao alheio, en­quanto para ou­tras é parte im­por­tante da cul­tura e da his­tó­ria do Japom.

Nom de­vía­mos per­mi­tir o uso da Bandeira do Sol Nascente nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, nem em nen­gum ou­tro sí­tio”, re­clama a twit­teira Haray, mem­bro da Moving Beyond Hate, umha or­ga­ni­za­çom es­tu­dan­til anti-dis­cri­mi­na­çom com sede no país nipom.“Para além da sua uti­li­za­çom na co­lo­ni­za­çom e in­va­som dos vi­zi­nhos asiá­ti­cos por parte do Japom, a ban­deira é fre­quen­te­mente uti­li­zada em ma­ni­fes­ta­çons da ex­trema-di­reita, como um sím­bolo de ódio e de ra­cismo, e como um meio para alas­trar a sua pro­pa­ganda ra­cista con­tra co­re­a­nos ou pes­soas de qual­quer ou­tra des­cen­dên­cia”, de­nun­cia a ativista.

elena mar­tín lores

O re­pre­sen­tante do ARIC (Centro de Integraçom Regional da Ásia no Japom), Ryang Yong-Song acres­centa que nom proi­bir esta ban­deira fa­ria com que o seu uso au­men­tasse du­rante os Jogos Olímpicos por parte de gru­pos de ódio. “Se o Comité Olímpico Japonês (JOC) nom im­pede a en­trada da ban­deira nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, a ex­trema-de­reita atre­vera-se a ar­vorá-la sem pu­dor di­ante das es­pe­ta­do­ras e par­ti­ci­pan­tes para pro­mo­ver o ódio e a dis­cri­mi­na­çom”, afirma. “O anún­cio de que nom se­ria proi­bido o seu uso, pas­sou, na prá­tica, a men­sa­gem de que o Comité Olímpico iria apoiar este sím­bolo de dis­cri­mi­na­çom. De facto, um dos mi­li­tan­tes da ex­trema-di­reita mais fa­mo­sos do Japom sau­dou isto pu­bli­ca­mente», ad­verte Yong-Song.

Para além da sua uti­li­za­çom na co­lo­ni­za­çom e in­va­som dos vi­zi­nhos asiá­ti­cos por parte do Japom, a ban­deira é fre­quen­te­mente uti­li­zada em ma­ni­fes­ta­çons da ex­trema-di­reita como um sím­bolo de ódio e de racismo 

Por seu turno, Eriko Yamamoto, ati­vista e mem­bro da “Fushimi Paredo” — umha as­so­ci­a­çom que busca o des­man­te­la­mento das cen­trais nu­cle­a­res no Japom— con­si­dera que o pro­blema é que, ainda que a ban­deira seja umha, o sig­ni­fi­cado va­ria de acordo com a pes­soa que a ar­vo­rar. «A ban­deira do Sol Nascente re­pre­senta o nas­cer-do-sol e exis­tia an­tes de se tor­nar umha ban­deira mi­li­tar», di a ati­vista. «É por isso que im­porta le­var em conta que o facto de al­guém uti­li­zar esta ban­deira nom sig­ni­fica que essa pes­soa ou grupo seja mi­li­ta­rista. Artistas fa­mo­sos te­nhem uti­li­zado ver­sons dela e um jor­nal, ale­ga­da­mente de es­querda, como é o jor­nal Asahi, uti­liza um de­sign se­me­lhante para o seu logo”, acrescenta.

Porém, mesmo pes­soas como Eriko, que en­ten­dem que a ban­deira tivo tam­bém um pa­pel cul­tu­ral no Japom, vem um uso, cada vez mais claro e mesmo pe­ri­goso, dela por parte de gru­pos ra­cis­tas e de ex­trema-di­reita do país ni­pom. «Os meus pais e ati­vis­tas pola paz cos­tu­ma­vam uti­li­zar a ban­deira no pas­sado como sím­bolo de paz. Ainda as­sim, agora o sig­ni­fi­cado ra­cista da ban­deira está a ga­nhar força. «Acho que nom é boa ideia le­var esta ban­deira a um evento como este le­vando em conta o sig­ni­fi­cado que sub­jaz por trás dela. «É me­lhor que se uti­lize a ban­deira ja­po­nesa ofi­cial para que fi­que claro que a pes­soa que a has­teia nom tem in­ten­çons di­fe­ren­tes das de de­fen­der a sua equipa», afirma Yamamoto.

A res­posta do go­verno ni­pom
Longe de se pre­o­cu­par com esta pro­ble­má­tica, o JOC e o go­verno ja­po­nês nom pa­re­cem con­si­de­rar um pro­blema que a ban­deira de Tóquio 2020 seja quase a mesma que esta que pro­voca tanta con­tro­vér­sia. Para Haray, isto prova que o go­verno ni­pom nom tem qual­quer in­te­resse em mu­dar essa si­tu­a­çom. “É muito pre­o­cu­pante que as au­to­ri­da­des pú­bli­cas, como o JOC ou o go­verno (in­cluindo o Ministro dos Negócios Estrangeiros e po­lí­ti­cos aber­ta­mente de ex­trema-di­reita) le­gi­ti­mem sem pu­dor a acei­ta­çom desta ban­deira”, di. Haray acres­centa que o se­cre­tá­rio de im­prensa do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Masato Otaka, che­gou a afir­mar num ar­tigo do The Guardian ‑mem­bro, por ou­tro lado, do go­verno de Shinzo Abe, o atual pre­si­dente, que nom tem pu­dor em mos­trar o seu de­sejo de que o Japom torne a ter um exér­cito ofen­sivo pró­prio — que as ob­je­çons para nom uti­li­zar a ban­deira te­nhem agora a ver com in­te­res­ses po­lí­ti­cos, e que nom é ver­dade que até agora ti­vesse ha­vido de­nún­cias por parte da co­mu­ni­dade in­ter­na­ci­o­nal em re­la­çom à sua uti­li­za­çom. Porém, nom é as­sim como o vem a par­tir de paí­ses como a Coreia ou a China, que le­vam tempo a pe­dir nom só des­cul­pas, mas a eli­mi­na­çom deste tipo de símbolos.

O anún­cio de que nom se iria proi­bir o seu uso, aca­bou, na prá­tica, por pas­sar a men­sa­gem de que o Comité Olímpico apoi­ava este sím­bolo de discriminaçom 

Devemos re­co­nhe­cer que a Bandeira do Sol Nascente era a ban­deira de guerra que uti­li­zou o Exército Imperial Japonês como sím­bolo da sua in­va­som da Ásia até a sua der­rota na Segunda Guerra Mundial em 1945”, di o re­pre­sen­tante do ARiC. “À sua vez, leva anos sendo uti­li­zada como sím­bolo de ódio con­tra pes­soas dou­tras as­cen­dên­cias ét­ni­cas —par­ti­cu­lar­mente chi­ne­ses e co­re­a­nos—. “Na ARIC se­gui­mos as ma­ni­fes­ta­çons da ex­trema-di­reita que se te­nhem or­ga­ni­zado mesmo com mais frequên­cia nes­tes dias nas ruas de ci­da­des como Tóquio ou Osaka, e em to­das elas, os par­ti­ci­pan­tes le­va­vam esta ban­deira”, acrescenta.

Para Eriko Yamamoto a res­posta do go­verno é tam­bém in­su­fi­ci­ente. «Infelizmente, mesmo quando de­cor­rem ati­vi­da­des na rua or­ga­ni­za­das por gru­pos de ódio, com dis­cur­sos aber­ta­mente ra­cis­tas, o go­verno nom toma me­di­das enér­gi­cas. Assim sendo, na Internet pro­li­fe­ram este tipo de gru­pos, aos que é muito fá­cil ace­der, e sem­pre ar­vo­ram a ban­deira do Sol Nascente», comenta.

«Nom é de­ma­si­ado tarde para que o Comité Olímpico re­solva proi­bir a ban­deira do Sol Nascente e de­nun­ciar as suas co­no­ta­çons», ga­rante afirma Yong-Song. «De facto, de­viam-no fa­zer para pre­ve­nir o ter­ro­rismo de ex­trema-di­reita que po­de­ria des­po­le­tar ao ver esta ban­deira nas maos dos es­pe­ta­do­res de Tóquio 2020. É como se, nuns Jogos Olímpicos nos Estados Unidos, as pes­soas apoiam-se a sua equipa com a ban­deira con­fe­de­rada. Seria pe­ri­goso e ofen­sivo», acrescenta.

Haray tem-no claro. «Eu e ou­tros es­tu­dan­tes de Moving Behond Hate es­ta­mos muito pre­o­cu­pa­das com o ra­cismo e o as­sé­dio con­tra es­pe­ta­do­res da Coreia ou dou­tros paí­ses. Por isso, acha­mos que nom é um as­sunto ba­nal, e que a co­mu­ni­dade in­ter­na­ci­o­nal de­via jun­tar es­for­ços no sen­tido de re­cla­mar a proi­bi­çom da uti­li­za­çom desta ban­deira nuns Jogos que, à par­tida, vi­sam a pro­mo­çom do diá­logo e da paz en­tre países».