
Ultimamente arrepia-se-me o corpo cada vez que escuito a palavra ‘sustentável’. Já levamos algum tempo obsessas com a sustentabilidade. É a última moda. Tarde piache… Porque o tempo da sustentabilidade já passou, o tempo em que podíamos ter feito algumha cousa para parar o deterioro do ecossistema em que vivemos, para tentar mitigar a mudança climática, para deter a extinçom de espécies, a contaminaçom do mar, ou as guerras polos últimos recursos.
Quando o primeiro mundo fala de sustentabilidade, simplesmente está a pensar em como fazer para que o nosso modo de vida perdure para sempre sem ir a pior, antes bem sem ir a menos, inclusive engordando essa vaca sagrada que é o PIB, e portanto aumentando o consumo de bens e serviços. Velai está a armadilha, porque o que nom é sustentável é o modelo de vida ocidental, inserido num sistema económico capitalista, que tem como base fundamental o crescimento contínuo e exponencial.
"Quando o primeiro mundo fala de sustentabilidade, simplesmente está a pensar em como fazer para que o nosso modo de vida perdure para sempre sem ir a pior, antes bem sem ir a menos"
CAPACIDADE DE CARGA
Um ecossistema só pode ser sustentável se nom excedemos a sua capacidade de carga, é dizer o número de individuas que podem viver nele em funçom dos recursos que este tem e da sua capacidade de regeneraçom. É altamente controvertida a capacidade de carga do planeta a respeito da espécie humana. A wikipédia dá-nos umha estimaçom de dez mil milhons de seres humanos, o que ao meu ver é extremadamente otimista. No outro extremo estám autores que dam valores diversos em funçom de distintos estudos e consideraçons, como a mudança climática ou o esgotamento dos combustíveis fósseis, mas que quase sempre situam a capacidade de carga do planeta Terra por debaixo dos 3000 milhons de habitantes humanos. Umha magnífica reflexom sobre este tema podemos encontra-la no ensaio “Nosotros los detritívoros” de Manuel Casal Lodeiro.
Atualmente a populaçom mundial é de 7,500 milhons mas devemos ter em conta no século vinte a populaçom multiplicou-se por três, graças à grande disponibilidade de energia que supugérom os combustíveis fósseis, que permitírom a revoluçom industrial com todo o que esta trouxo consigo: incremento da produçom de alimentos e melhora nas condiçons higiénico-sanitárias, vacinas por exemplo.
CRIAR RIQUEZA
Melhor devêramos dizer transferir riqueza, neste sentido assemelha-se ao caso da energia. A riqueza nem se cria nem se destrói, simplesmente se transforma… Muda de maos, e acumula-se. Desde que as sociedades humanas deixárom de ser tribos nómadas e se convertérom em sociedades assentadas num território repete-se o mesmo patrom. Crescimento das populaçons e consumo dos recursos até que estes começam a esgotar-se, necessidade de ir na procura desses recursos para além dos limites do seu ecossistema e conflitos por esses mesmos recursos. Conflitos também dentro das comunidades pola propriedade dos recursos. O sistema económico vigente persegue a maximizaçom dos benefícios, e a reproduçom do capital. Está baseado no crescimento continuo, que requer um consumo de recursos (matérias primas e energia) também crescente. Isto choca com o feito de vivermos num mundo finito, que por muito que fagamos e inventemos tem limites. Por exemplo, a energia solar é renovável mas, é sustentável? Quanta energia consume a fabricaçom e posta em marcha de umha placa fotovoltaica em relaçom à energia que logo rende? E a riqueza que gera, a onde vai parar? É possível substituir toda a energia que hoje consumimos por energia de fontes renováveis?
É possível substituir toda a energia que hoje consumimos por energia de fontes renováveis?
COLAPSO E RESILIENCIA
Historicamente tenhem-se dado mudanças metabólicas nas sociedades, outras vezes tenhem-se dado colapsos sociais. A queda do império romano ou a revoluçom industrial som dous exemplos. Sabemos que nos enfrentamos a uma mudança muito profunda na atualidade, e o que a caracteriza do meu ponto de vista, é que é umha mudança global. Vem provocado por um esgotamento dos recursos (energia e matérias primas) e acompanhada da mudança do clima.
Já que o tempo da sustentabilidade passou, só podemos amparar-nos num termo que, a pouco que nos descuidemos, também perverterám. Já ouvimos falar nos âmbitos políticos e económicos de resiliência, mas será de resiliência desse sistema que provocou esta situaçom de overshoot, de extralimitaçom. Essa nom é a resiliência que nos interessa como seres humanos.
Se nom podemos já ser sustentáveis, devemos no mínimo preparar-nos para o choque que vai representar o esgotamento de recursos que já temos encima
Se nom podemos já ser sustentáveis, devemos no mínimo preparar-nos para o choque que vai representar o esgotamento de recursos que já temos encima, e com ele as profundas mudanças no nosso modelo económico e social que já començárom, em forma de reformas laborais, recorte de direitos sociais e de liberdades. Começou-nos o poder, para melhor seguir controlando os recursos e a riqueza. Devemos também começar a preparar-nos desde abaixo, a construir a nossa resiliência, individual com uma mudança de valores e objetivos vitais, mas sobretudo coletiva, criando comunidade nas nossas localidades, no nosso entorno. Reconhecendo a nossa interdependência e a nossa eco dependência. Eis onde começa um longo tempo de profundas mudanças e revisons, revisons dos nossos objetivos como seres humanos, dos logros atingidos nas nossas luitas, de classe, de género, e da maneira em que habitualmente fôrom aproveitadas para seguir transferindo riqueza. Quiçais este momento seja umha oportunidade para simplificar, para descomplicar a vida. O mau é que possivelmente nom disponhamos já de muito tempo.