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Recriaçom da era mesozoica, com dinossauros em primeiro plano ante um fundo de coníferas.

Conservação vs. extinção na Galiza do século XXI

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Recriaçom da era mesozoica, com dinossauros em primeiro plano ante um fundo de coníferas.
Recriaçom da era mesozoica. 

Um ar­tigo de Barnosky e ou­tros in­ves­ti­ga­do­res: Has the Earth’s sixth mass ex­tinc­tion al­re­ady ar­ri­ved?, pu­bli­cado em 2011 em Nature, aler­tava so­bre a “sexta ex­tin­ção mas­siva”. O tema foi logo po­pu­la­ri­zado em 2015, por Elizabeth Kolbert, no li­vro The Sixth Extinction: An Unnatural History, pré­mio Pulitzer. 

Ao longo da his­tó­ria do Planeta, de­vido a cau­sas cli­má­ti­cas, bi­o­ge­oquí­mi­cas, tec­tó­ni­cas ou cós­mi­cas, te­ria ha­vido, polo me­nos, cinco gran­des ex­tin­ções em massa (aque­las nas quais de­sa­pa­re­ce­ram mais da me­tade das espécies): 

  1. Extinção do Cambriano-Ordoviciano (há 488–440 mi­lhões de anos). 
  2. Extinção do Devoniano Superior (370–360 Ma). 
  3. Extinção Permo-Triássica ou Grande Morte (252–251 Ma). 
  4. Extinção do Triássico-Jurássico (200 Ma). Deu pas­sa­gem à época dos gran­des dinossauros. 
  5. Extinção Cretáceo-Paleógeno (65’5 Ma). Extinguiram-se os di­nos­sau­ros; e ma­mí­fe­ros e aves apro­vei­ta­ram para se diversificar. 

Ainda po­de­ría­mos acres­cen­tar a es­tas ex­tin­ções uma ou­tra, muito mais re­cente e li­mi­tada nos seus efei­tos, a que ani­qui­lou a me­ga­fauna eu­ro­peia e nor­te­a­me­ri­cana e a cul­tura de Clóvis. Tudo in­dica que acon­te­ceu du­rante um pe­ríodo re­la­ti­va­mente curto cha­mado Dryas Recente (en­tre 12.900–11.700 anos AP), quando, por cau­sas não es­cla­re­ci­das, o pla­neta re­gres­sou su­bi­ta­mente a tem­pe­ra­tu­ras da idade do gelo, caindo es­tas em pou­cas dé­ca­das en­tre 4 a 10 ºC. Temperaturas a que os ver­te­bra­dos mai­o­res, tal­vez pres­si­o­na­dos já polo Homo sa­pi­ens, não con­se­gui­ram re­sis­tir. O fi­nal do Dryas Recente tam­bém se­ria abrupto, com au­men­tos da tem­pe­ra­tura que po­de­riam os­ci­lar, de­pen­dendo da zona da Terra, en­tre 6 e 14 ºC em me­nos de cin­quenta anos (o aque­ci­mento atual tem sido de 1,1–1,2 ºC no úl­timo sé­culo e meio!). Este fi­nal pro­pi­ci­a­ria o iní­cio do Neolítico, a época em que na Mesopotâmia, apa­re­ce­ram as pri­mei­ras tri­bos de agri­cul­to­res, abrindo o ca­mi­nho para a Civilização… 

As pai­sa­gens sim­pli­fi­ca­ram-se e mui­tos ecos­sis­te­mas de­gra­da­ram-se. Algumas es­pé­cies em­ble­má­ti­cas como o lobo ou o urso te­nhem sido fa­vo­re­ci­dos por isto, mas mui­tas ou­tras extinguiram-se

Mas nas úl­ti­mas dé­ca­das com a ‘che­gada dos mo­to­res de ex­plo­são, ali­men­ta­dos por com­bus­tí­veis fós­seis,’ num curto es­paço de tempo “mor­reu o Neolítico, o Bronze, o Ferro e tam­bém o mundo dos nos­sos avós”, na fe­liz sín­tese de Martínez-Abraín, pro­fes­sor de Ecologia da UDC. Assim, pro­gres­si­va­mente, des­po­vo­a­ram-se os cam­pos da Galiza in­te­rior e bos­ques e ma­ta­gais fo­ram-se cer­rando e ga­nhando su­per­fí­cie, por aban­dono das prá­ti­cas agrá­rias tra­di­ci­o­nais, en­quanto se pro­du­zia uma re­du­ção das pas­ta­gens na­tu­rais e uma in­ten­si­fi­ca­ção tec­no­ló­gica das ati­vi­da­des agro­pe­cuá­rias e flo­res­tais so­bre­vi­ven­tes. Em con­sequên­cia, as pai­sa­gens sim­pli­fi­ca­ram-se e mui­tos ecos­sis­te­mas de­gra­da­ram-se. E mesmo que al­gu­mas es­pé­cies tão em­ble­má­ti­cas como o urso, o lobo ou os un­gu­la­dos, te­nham sido fa­vo­re­ci­das por esta nova si­tu­a­ção, mui­tas ou­tras ex­tin­gui­ram-se ou di­mi­nuí­ram dras­ti­ca­mente as suas po­pu­la­ções. Flora her­bá­cea he­lió­fila, aves de es­pa­ços aber­tos, an­fí­bios e in­se­tos en­con­tram-se en­tre os gru­pos mais afetados. 

Paradoxalmente, no con­junto do pla­neta o su­per­po­vo­a­mento tem-se si­tu­ado como a chave de quase to­das as pre­o­cu­pa­ções am­bi­en­tais. Já che­ga­mos aos 8.000 mi­lhões! E isto numa Neopangeia glo­ba­li­zada que nos ofe­rece como pre­sente ine­vi­tá­vel uma ace­le­ra­ção das bioinvasões. 

Será, pois, exa­gero fa­lar que a Sexta Extinção pode es­tar em curso? De as­sim ser, se­guindo o prin­cí­pio de “pen­sar glo­bal­mente e agir lo­cal­mente”, a per­gunta obri­gada é que po­de­mos fa­zer aqui e agora? 

Historicamente, por parte da Administração pouco mais se tem feito do que uma po­lí­tica de pro­te­ção de es­pa­ços na­tu­rais e da­que­las es­pé­cies mais ame­a­ça­das. Reservas na­tu­rais li­ga­das en­tre si por cor­re­do­res eco­ló­gi­cos con­ti­nuam a ser ne­ces­sá­rias, mas não po­dem tor­nar-se em me­ros par­ques tu­rís­ti­cos, como está a acon­te­cer na atualidade. 

Um exemplar de 'Castor fiber' roendo a cortiça de umha árvore.
‘Castor fi­ber’.

Preconceitos ou ide­o­lo­gis­mos pu­e­ris, como esta “dis­ney­fi­ca­ção da na­tu­reza” im­por­tada e ci­ta­dina que nos aflige, não de­ve­riam con­di­ci­o­nar as es­tra­té­gias de con­ser­va­ção. Assim, até a caça pode con­tri­buir para a pre­ser­va­ção dos ecos­sis­te­mas, sem­pre que for ge­rida ade­quada e sus­ten­ta­vel­mente, re­gu­lando es­pé­cies con­fli­tu­o­sas, como o ja­vali, e fun­ci­o­nando como mo­tor eco­nó­mico para o mundo rural. 

Achamos que se­ria ne­ces­sá­rio po­ten­ci­a­li­zar pro­je­tos agro­pe­cuá­rios mais res­pei­ta­do­res do am­bi­ente, como a agri­cul­tura eco­ló­gica e a pe­cuá­ria ex­ten­siva. Nesta pers­pe­tiva, ha­ve­ria que in­cen­ti­var o con­sumo de carne de gado cri­ado ao ar li­vre, com um selo de qua­li­dade es­pe­cí­fico p. ex. Os her­bí­vo­ros do­més­ti­cos (par­ti­cu­lar­mente, de ra­ças au­tóc­to­nes, sem­pre mais rús­ti­cas e adap­ta­das ao meio) são au­tên­ti­cos ar­qui­te­tos da pai­sa­gem que man­têm a exis­tên­cia de pra­da­rias e cons­ti­tuem a me­lhor pre­ven­ção dos gran­des in­cên­dios. As ma­na­das de pó­neis gar­ra­nos de­ve­riam ter uma pro­te­ção le­gis­la­tiva es­pe­cial polo seu ca­rá­ter se­mis­sel­va­gem. Desaparecidas a maior parte das le­va­das e ou­tras zo­nas hú­mi­das vin­cu­la­das com o an­tigo meio agrá­rio, mui­tas es­pé­cies aquá­ti­cas, de­sig­na­da­mente an­fí­bios, pre­ci­sam de po­ças e, em ge­ral, de cor­pos de água de pe­queno ta­ma­nho para po­der vi­ver e reproduzir-se. 

Historicamente, por parte da Administraçom pouco mais se tem feito do que uma po­lí­tica de pro­te­ção de es­pa­çons na­tu­rais e da­que­las es­pé­cies mais ameaçadas

Os in­cên­dios são tam­bém parte das di­nâ­mi­cas na­tu­rais. Queimas pre­ven­ti­vas de pe­quena ex­ten­são ao cabo do in­verno po­dem evi­tar fo­gos de efei­tos ca­tas­tró­fi­cos, man­tendo os ma­ta­gais num pla­gi­o­clí­max al­ta­mente di­verso. Face a um ideal que en­ten­de­ria a con­ser­va­ção da na­tu­reza como um pro­cesso que tende a atin­gir uma co­mu­ni­dade clí­max, ha­bi­tu­al­mente, as­so­ci­ada com um bos­que, o certo é que os pro­ces­sos na­tu­rais não são es­tá­ti­cos, mas al­ta­mente com­ple­xos e até cer­tos ele­men­tos per­tur­ba­do­res, como o lume, po­dem ser ne­ces­sá­rios em ma­té­ria de con­ser­va­ção ao rei­ni­ci­a­rem as fa­ses da su­ces­são ecológica. 

Somos fa­vo­rá­veis a rein­tro­du­ções, con­ve­ni­en­te­mente pon­de­ra­das, de es­pé­cies ex­tin­tas em tem­pos his­tó­ri­cos. Neste sen­tido, re­cen­te­mente, en­con­tra­ram-se in­dí­cios de cas­tor-eu­ro­peu (Castor fi­ber) no rio Tormes, aflu­ente do Douro, a pou­cos km da fron­teira por­tu­guesa. Ativistas ale­mães co­me­ça­ram a rein­tro­duzi-lo, de forma ile­gal, em 2003 na ba­cia do Ebro. Em, re­la­ti­va­mente, pou­cos anos che­ga­ram à Galiza. Ainda que sendo crí­ti­cos com ações in­con­tro­la­das deste tipo, da­mos as boas-vin­das a um “en­ge­nheiro flu­vial” que pode con­tri­buir um pouco a de­sar­bo­ri­zar e des­col­ma­tar as nos­sas zo­nas hú­mi­das, au­men­tando a su­per­fí­cie de águas li­vres. Ai! Porque em ma­té­ria de con­ser­va­ção não po­de­mos ter dogmas. 

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